A magistrada aposentada Sonja Faria Borges de Sá, que atuava no Fórum de Jaciara, foi condenada por ato de improbidade administrativa por ter nomeado duas pessoas para os cargos comissionados de secretária e segurança, quando na verdade trabalhavam em sua residência, como babá e motorista, em Curitiba (Paraná).
A decisão é da juíza Célia Vidotti, da Vara Especializada Ação Civil Pública e Ação Popular de Cuiabá, em ação ingressada pelo Ministério Público Estadual (MPE). De acordo com o MPE, a informação foi repassada ao órgão pela 7ª Vara do Trabalho de Curitiba, que havia iniciado uma investigação dos dois supostos servidores por desvio de função.
Segundo o documento, os dois estavam lotados na Comarca de Jaciara, onde a magistrada atuava, mas nunca vieram a Mato Grosso, tampouco trabalharam no gabinete da juíza.
“Afirma que os mencionados servidores foram ouvidos perante a Promotoria do Patrimônio Público de Curitiba (PR) e confirmaram que embora tivessem sido nomeados para os cargos junto ao Tribunal de Justiça, prestavam serviços domésticos como babá, motorista, secretária, dentre outras atividades, na residência da requerida, localizada na cidade de Curitiba (PR) e, que jamais prestaram serviços no Fórum de Jaciara (MT), sendo que sequer vieram ao Estado de Mato Grosso”, diz trecho da ação.
O “segurança” relatou que foi contratado para o cargo de motorista, mas que às vezes fazia outros serviços, como ir ao mercado.
Já a suposta “secretária” disse que foi contratada para o cargo, mas que, apesar disso, tinha pouco contato com a juíza Sonja, e passava a maior parte de seu tempo cuidando do filho da magistrada, desempenhando função de babá, o que a motivou pedir demissão, embora recebesse um bom salário.
Segundo o MPE, a conduta da magistrada causou dois resultados: enriquecimento ilícito, "pois não despendia qualquer quantia do próprio bolso, para remunerar pessoas que executavam trabalhos domésticos em sua residência" e "considerável prejuízo aos cofres do Estado de Mato Grosso, na medida em que as pessoas nomeadas nas funções públicas nunca prestaram serviços ao Poder Judiciário do Estado”.
O órgão ressaltou que os supostos servidores não foram incluídos na ação por não terem tido conhecimento da contratação ilícita.
A juíza por sua vez, alegou que a contratação da “secretária” e do “motorista” foi feita pela diretoria do Fórum de Jaciara, quando a mesma já estava afastada de suas funções e morando em Curitiba, onde estaria fazendo tratamento psiquiátrico, o que também seria de conhecimento da direção do fórum.
“Salienta que não havia qualquer impedimento que a prestação de serviços de segurança e secretária ocorresse em local diverso do gabinete, nos termos da Lei n.º 6.614/94. Assevera que não praticou nenhum ato de improbidade administrativa, não agiu de forma dolosa ou visando se apropriar de valores do erário ou desrespeitar princípios administrativos, pois as nomeações se deram de forma regular; não houve desvio de função, tampouco havia impedimento para o exercício das funções em local diverso do gabinete do juiz”, disse.
A magistrada alegou ainda que, na época da contratação, estava em tratamento psiquiátrico, e por isso, mentalmente incapaz de compreender que a solicitação de nomeação de servidor público para prestação de serviço fora do gabinete configurasse improbidade.
A juíza aposentada disse que nunca agiu de má-fé, tampouco omitiu que os servidores residiam em Curitiba. Ela ainda afirmou que nunca houve desvio de função, uma vez que os servidores executaram suas funções dos cargos para os quais foram nomeados, e que caso tenha ocorrido, eles fizeram de forma esporádica e sem nenhuma obrigação, pois já teria empregados em sua casa.
O MPE, porém, contestou a alegação e afirmou que a juíza tentou justificar sua conduta ímproba atribuindo a culpa na diretoria da Comarca de Jaciara, e que a aposentadoria por invalidez da mesma não prova inaptidão para os demais exercícios de ato civil.
“[...] A nomeação dos servidores, a pedido da requerida, não se traduz em improbidade, mas sim o desvio de função evidenciado quando a requerida utilizou os servidores para atender a interesse pessoal em sua residência”, alegou o MPE.
“Assevera que a confusão entre o público e o privado constatada caracteriza locupletamento ilícito em detrimento do erário estadual, bem como ofensa a moralidade, impessoalidade e legalidade”, concluiu o órgão.
Prejuízo ao erário
A juíza Célia Vidotti afirmou que não resta dúvidas de que a magistrada Sonja Faria se beneficiou das nomeações, em detrimento do erário estadual.
“No caso vertente, ficou esclarecido que A.B. e A.S.S. jamais desempenharam as suas funções para o Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, mas sim, para a requerida, de forma particular em sua residência em outra unidade da federação. Aliás, este fato é admitido pela própria requerida, sob o entendimento que tais cargos eram do juiz, para atendê-lo e não do Poder Judiciário que os remunerava”, afirmou.
Vidotti criticou ainda a alegação da juíza Sonja, de que os cargos comissionado pertencem ao juiz e não ao Juízo.
“A tese defendida pela requerida de que tais cargos pertenciam ao juiz e não ao juízo está totalmente dissociada da realidade. No caso do foro judicial, há um quadro específico para o provimento da comarca e outro que define os cargos que compõem cada uma das varas. E é nesse quadro que estão previstos os cargos de agente de segurança e de secretario, portanto, ambos integram a estrutura judicial de cada vara, ou seja, são destinados a atender a Vara ou Juízo, assim como o escrivão, o oficial escrevente, o oficial de justiça e o agente de serviço e, não atender o juiz, de forma particular”, ressaltou Vidotti.
A juiza Célia também ressaltou que não ficou comprovado que a magistrada Sonja Faria esteve totalmente incapaz, bem como não é aceitável que a mesma não tivesse conhecimento e não fosse capaz de compreender e identificar o limite entre o que é público e o que é privado.
“E não há dúvida que tanto os recursos humanos quanto equipamentos e materiais pertencentes ao Poder Público estão estritamente vinculados ao desempenho das finalidades administrativas. No entanto, a requerida desviou a prestação dos serviços contratados pela Administração Pública, no caso, o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, para atender a interesse e finalidade particular, causando, assim, prejuízo ao erário”, afirmou a magistrada, na decisão.
Reprodução
A juíza Célia Regina Vidotti, autora da decisão que puniu colega aposentada
Condenação
A magistrada Célia Vidotti entendeu que houve a prática de conduta ilícita, constituindo ao ato de improbidade administrativa, visando o enriquecimento ilícito ou vantagem indevida, enquanto Sonja Faria estava em exercício de seu cargo.
A conduta irregular, de acordo com a decisão, causou prejuízo aos cofres públicos, bem como afrontou aos princípios de administração pública e violou os deveres de honestidade, legalidade e lealdade às instituições.
“Considerando a gravidade do ato de improbidade administrativa praticado – e atenta aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, levando-se em conta a extensão do dano causado, entendo que a adequação de algumas das sanções previstas no art. 12, da Lei nº 8.429/92 será suficiente para a reprovação e responsabilização da requerida”, disse Vidotti.
A juíza aposentada terá que ressarcir o dano causado, referente a devolução dos valores correspondentes aos subsídios e vantagens pagos pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso pela contratação dos supostos servidores, no período de maio de 2005 a abril de 2006.
Ela também terá suspenso os direitos políticos por três anos, está proibida de contratar com o Poder Público ou receber benefícios e incentivos fiscais, diretamente ou indiretamente - também por três anos.
Além disso, Sonja Faria terá que pagar multa civil correspondente a duas vezes o valor do dano causado, bem como, as custas processuais da ação.
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