Autor homenageado na 2ª Festa Literária de Chapada dos Guimarães, Pepetela é o primeiro angolano a receber o Prêmio Camões (1997) pelo conjunto de sua obra, sedimentando o seu lugar de destaque na literatura de língua portuguesa. Escritor que transita por diferentes gêneros literários, Pepetela encontra na cultura e na identidade de seu país, antes e depois da colonização portuguesa, inspiração para suas obras.
Nascido em Benguela, em 1941, Artur Pestana foi um importante combatente da luta pela libertação de Angola como membro do Movimento pela Libertação de Angola. Por seu envolvimento político, teve de viver no exílio e apenas retornou ao país após a independência, integrando o governo do presidente Agostinho Neto, como vice-ministro da Educação.
Durante esse período, lançou boa parte de sua obra, com títulos como "Muana Puó" (1978), "As aventuras de Ngunga" (1979) e "Mayombe" (1980), agora incluído na lista da Fuvest como leitura obrigatória. Nele, Pepetela retrata sua experiência na guerra revolucionária, mostrando o convívio de guerrilheiros de diversas origens étnicas e sociais presentes na nação angolana.
Em 1982, Pepetela passou a se dedicar somente à literatura e desenvolveu uma obra de caráter mais crítico em relação aos desdobramentos da história angolana. Também enveredou pelo realismo-fantástico, nos romances "O desejo de Kianda" e "A gloriosa família”. Após o Prêmio Camões, o autor segue a se renovar como escritor, enveredando pelo gênero da sátira, com o livro policial "Jaime Bunda", e inclusive pela ficção científica, com o romance "O quase fim do mundo" de 2008.
Presença confirmada na 2ª FLIC nesta sexta-feira (12.05), Pepetela fará uma palestra seguida de um bate papo com os visitantes, sujeito à disponibilidade de vagas, às 19h30, na Praça Dom Wunibaldo em Chapada dos Guimarães. A palestra terá apresentação da historiadora Maria Amélia Alves e será seguida da noite de autógrafos no Lounge de Lançamento de Livros na Praça. Conversamos com ele sobre como a escrita acontece em sua vida, qual a importância da literatura e como ela se desdobra em diferentes criações e inspirações ao longo do tempo.
VOCÊ CONSEGUE TRANSITAR POR DIFERENTES GÊNEROS LITERÁRIOS, ALGO QUE MUITOS AUTORES TENTAM SEM SUCESSO. DE ONDE ACREDITA QUE VENHA ESSE DOM E ESSA VONTADE?
Tenho de facto tentado alguns géneros, desde o drama e a série televisiva, ao conto, crónica e romance. Mas é neste último género que me sinto mais à vontade, sem dúvida. Talvez por ter a imensidão do mar, onde nos podemos espraiar em observações e nos sentimentos. Talvez...
COMO A ESCRITA SE TORNOU PARTE FUNDAMENTAL DA SUA VIDA?
Desde criança que gostava de imaginar estórias, mas não contando e sim escrevendo. Criando isolado e não com um público. Sempre foi uma liberação de uma energia qualquer mal contida. Por isso me parece normal que a escrita tenha ocupado boa parte da minha vida.
QUANDO DECIDE ESCREVER, QUAL É O SEU OBJETIVO FINAL?
Com efeito, na maior parte das vezes não decido escrever. Ela vem naturalmente ou não vem. Passo longos períodos sem escrever. Hoje com os emails sou obrigado a "escrever" todos os dias, mas isso não é criar. Por isso, muitas vezes vou compondo umas frases sem propósito nenhum, apenas pelo prazer de alinhar umas palavras a seguir a outras. Acontece uma estória aparecer pelo meio. Outras vezes dá em nada e apago. Mas, queira ou não, a realidade acaba sempre por se impor nas minhas estórias, as minhas preocupações de momento também, e tudo isso compõe uma obra. Quando dá certo!
VOCÊ LÊ BASTANTE?
Lia muitos livros, sempre fui um grande leitor, desde muito novo. Hoje leio menos livros e mais jornais ou artigos pela Net. Sinto que estou ficando muito ignorante sobre o que se vai fazendo no mundo. É impossível acompanhar, cada vez há mais livros e autores. O que me faz também ficar pessimista e procurar menos a literatura. Deve acontecer com todos...
QUAIS SÃO OS TÍTULOS E AUTORES QUE MAIS LHE INFLUENCIARAM EM SUA TRAJETÓRIA?
Foram muitos. Citarei alguns que li na escola, por obrigação, como Eça de Queirós. Talvez me tenham influenciado. Li muito cedo os brasileiros do Nordeste, José Lins, Jorge Amado. Depois Graciliano. As realidades eram muito semelhantes entre essas regiões, seus problemas sociais, com a realidade angolana. Mas sinto ter aprendido também muito com a geração norte-americana de Hemingway, Faulkner, Steinbeck, ou os russos do século XIX e os franceses do XX. Nessa altura nós não tínhamos acesso à literatura africana e por isso não posso listar grandes nomes de então.
VOCÊ VÊ DIFERENÇAS ENTRE ARTUR PESTANA E PEPETELA?
Acho que o Pepetela engoliu o Artur Pestana. Não consigo mais distinguir.
COMO VOCÊ VÊ A INCLUSÃO DE UMA OBRA AFRICANA ENTRE AS LEITURAS OBRIGATÓRIAS DA FUVEST?
Acho que será importante para aumentar o interesse dos brasileiros em geral, mas dos professores e dos jovens em particular, pela literatura que se faz no continente africano. Foi um bom sinal. Espero que iniciativas como essa se multipliquem para que os brasileiros ganhem empatia pelas culturas que, afinal, sempre influenciaram a maneira de ser e conviver dos brasileiros.
COMO VOCÊ ENTENDE A LITERATURA LUSÓFANA E O MERCADO EDITORIAL HOJE?
Há várias literaturas que usam a língua portuguesa. Elas deveriam ter meios particulares para se conhecerem melhor. Um veículo privilegiado deveria ser a CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). Mas sinto que esta Comunidade não tem procurado cumprir o seu papel na criação de pontes entre as diferentes culturas. É uma pena que os moçambicanos não saibam o que escrevem os santomenses ou que os portugueses não saibam o que escrevem os guineenses, etc., etc. Por isso prefiro não falar de Lusofonia (mesmo o nome é péssimo!).
O QUE ESPERA DA FESTA LITERÁRIA DE CHAPADA DOS GUIMARÃES?
Que seja um meio de chamar a atenção para outras literaturas, e para a literatura em geral, com a importâcia devida de interessar os jovens na leitura. Se a FLIC ajudar a alcançar isso, me darei por feliz.
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