A Justiça do Trabalho em Mato Grosso negou o pedido de reconhecimento de vínculo de emprego de um degolador islâmico com a empresa JBS. O profissional, especializado no abate de animais cujas carnes seriam exportadas para o mundo árabe, ajuizou recurso no TRT/MT contra decisão dada na Vara do Trabalho de Mirassol D´Oeste. O caso foi analisado pela 1ª Turma do Tribunal.
Além do reconhecimento do vínculo, o trabalhador também pedia o pagamento de indenização por danos morais e materiais devido à doença contraída em serviço. Ele alegou que a forma e posição como degolava os animais, os quais, pela tradição islâmica, precisavam estar ainda vivos, ocasionou lesões e dores nos braços e costas, notadamente pelo grande esforço físico exigido e repetição de movimentos em posição antiergonômica.
Conforme ficou provado no processo, todavia, o trabalhador era, na verdade, empregado de uma empresa especializada no abate halal, técnica exigida para autorizar o consumo da carne pelos muçulmanos, a qual prestava serviços à JBS. Tanto a juíza da Vara do Trabalho, Karine Bessegato, quanto os integrantes da Turma reconheceram a não existência do vínculo trabalhista entre o degolador e o frigorífico.
ExigênciaPara poder exportar a carne aos países árabes, a JBS firmou um contrato com a empresa Apoio de Degoladores. Isso porque as carnes somente poderiam ser comercializadas com essas nações caso o abate fosse realizado por um muçulmano, mediante técnica e procedimentos específicos, os quais eram fiscalizados e coordenados por um xeque e um veterinário muçulmano, ambos vinculados à uma empresa certificadora.
“A reclamada [JBS] não poderia intervir na forma em que o abate era realizado e sequer dar ordens ao reclamante quanto ao procedimento a ser adotado”, destacou a juíza Karine Bessegato na decisão de 1º grau. Ela fazia menção a um dos requisitos exigidos pela legislação brasileira para o reconhecimento do vínculo de emprego, que é a subordinação do empregado com o empregador.
“As provas orais colhidas e as documentais apresentadas demonstram, à toda evidência, que o Obreiro não era trabalhador subordinado à JBS S/A, senão que pertencia a dinâmica empresarial decorrente de um contrato desta firmado com outra empresa especializada”, destacou, por sua vez, o relator do processo no TRT de Mato Grosso, desembargador Osmair Couto, cujo entendimento foi acompanhado pelos demais colegas da Turma.
Doença ocupacionalO não reconhecimento do vínculo acabou por impossibilitar, também, qualquer perspectiva de indenização por danos morais e materiais decorrentes da suposta doença ocupacional. Isso porque o argumento defendido pelo degolador foi o de que era empregado da JBS e conforme o princípio da adstrição, as alegações do trabalhador em sua petição acabam vinculando a análise de quem julga o caso.
Segundo o relator, se o trabalhador tivesse utilizado o argumento da responsabilidade subsidiária ou solidária da JBS defendendo, por exemplo, que a empresa terceiriza sua atividade-fim, o que é vedado pela legislação brasileira que admite excepcionalmente a terceirização de atividades-meio, a responsabilização pela doença poderia até ter sido ser concedida. “A pretensão não foi dirigida tendo em mira a responsabilização solidária ou subsidiaria da Ré, mas sim visando sua imputação direta a fim de que esta arcasse com as indenizações pretendidas”, destacou.
“Por mais que o laudo técnico tenha constatado o agravamento da doença em virtude do labor na empresa, a causa de pedir formulada inviabiliza qualquer condenação”, acrescentou, ainda, o desembargador. Ele também destacou que o médico perito não encontrou correlação entre as dores atualmente sentidas pelo trabalhador com o trabalho desenvolvido pelo degolador à época da atuação nas dependências da JBS.