Recentemente, fiz uma breve escala obrigatória em Joanesburgo no meu percurso até Maputo onde proferi a Conferência de Abertura do 1º Seminário Internacional de Auditoria de Obras Públicas, convidado pelo Tribunal Administrativo de Moçambique.
Como o meu tempo disponível na África do Sul era muito limitado em virtude do horário dos voos de conexão, optei por visitar apenas o museu do Apartheid.
Inaugurado em 2001, dentro de um parque e complexo de lazer, sua arquitetura é modesta na aparência exterior, mas extremamente impactante na sua concepção artística, pois integrada à mensagem a que a própria existência do museu se destina: documentar e informar as novas gerações sobre o horror de um dos piores regimes de discriminação racial já testemunhados.
Antes do ingresso no prédio, há pilares de concreto representando os fundamentos da Constituição democrática que sucedeu à derrota do apartheid: democracia, igualdade, reconciliação, diversidade, responsabilidade, respeito e liberdade.
Desde o momento em que adquire o bilhete de ingresso, o visitante é sorteado com a identificação de “blankes” ou “nie-blankes”, semelhante às existentes nos documentos oficiais do governo racista.
Detalhe: não importa a cor de sua pele, nem se você faz parte de um grupo. Assim, geralmente um casal ou família é dividido nas duas categorias. Foi o que aconteceu comigo e meus acompanhantes.
Há entradas distintas para os portadores de ingressos brancos e não-brancos, que fazem separados o percurso inicial do museu, aflitos por se verem e ouvirem, mas impedidos de se reunir.
Assim, por alguns minutos, os visitantes experimentam a brutal segregação que vigorou por décadas. A sensação física de separação de um ente querido equivale a algumas horas de leitura teórica sobre o assunto.
O museu é ricamente documentado com registros e histórias reais, algumas narradas pelos próprios personagens ou seus descendentes em vídeos e textos. Um dos ambientes mais impressionantes reproduz as celas em que os prisioneiros políticos ficavam em confinamento solitário.
Do teto, pendem 131 laços de forcas representando os negros, brancos e indianos que foram executados combatendo o apartheid. Presenciei jovens e idosos se emocionando com o impacto das imagens.
Ao comentar a visita com um amigo brasileiro que vive em Moçambique, ele me recomendou tentar conhecer o Museu do Genocídio em Kingali, capital de Ruanda, que documenta o massacre de mais de um milhão de pessoas da etnia tutsi no ano de 1994. Ficou para outra oportunidade.
Um outro amigo que foi a Rússia assistir à Copa do Mundo de Futebol relatou-me a visita que fez ao museu do Gulag, que retrata os horrores das perseguições políticas ocorridas sob o comunismo.
Na Alemanha e na Europa Central os antigos campos de extermínio nazistas são espaços abertos à visitação gratuita. Lá se cultua a memória das vítimas do autoritarismo e se ensina às novas gerações a importância dos direitos humanos e da tolerância.
Ao deixar o museu do Apartheid, não pude deixar de pensar que se no Brasil tivéssemos tido a coragem de edificar um museu documentando a tragédia civilizatória produzida pela ditadura militar de 1964 a 1985, talvez não tivéssemos hoje que suportar a cantilena hipócrita de “intervencionistas” semifascistas, cuja audiência subsiste apenas em virtude de ignorantes que desconhecem o passado e de idiotas que não pensam no porvir.
Não passaríamos a vergonha de assistir torturadores sendo reverenciados no plenário do Congresso Nacional. Até agora faltou destemor aos nossos governantes civis democraticamente eleitos para seguir os exemplos da África do Sul e de Ruanda, que tiveram dignidade para enfrentar o seu passado
recente, assim como o fizeram a Alemanha e a Rússia.
Falta-nos, ainda, além do Museu da Ditadura Militar, também um Museu da Escravidão e um Museu da Corrupção. A sociedade que, por medo ou por vergonha, dissimula, esconde ou deturpa a sua própria história macula o seu presente e compromete o seu destino.
LUIZ HENRIQUE LIMA é conselheiro substituto do TCE-MT
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1 Comentário(s).
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dauzanades 08.07.18 14h40 | ||||
Para que museu em MT que vive do passado e acelera ainda mais em sua direção. MT precisa de evolução, acompanhar o presente e o futuro. Largar mão de papai e mamãe disse e a água parou. Afinal o nivel de evolução de MT em termos de mentalidade está chegando próximo da era dos dinossauros. só faltam uns 10 milhões de anos e se equipara. A comida então deve ser primitiva para não dizer azeda, sem gosto, sem cheiro, sem sal, sem açúcar e uma lata de graxa branca. | ||||
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