Cuiabá, Quarta-Feira, 2 de Julho de 2025
AMOR E ÓDIO
14.01.2024 | 08h00 Tamanho do texto A- A+

Calorão e descaso afetam percepção do cuiabano sobre cidade

Socióloga da UFMT diz que a Capital não se apresenta de um modo uniforme para todas as pessoas

Mayke Toscano/Secom-MT

Registro aéreo de Cuiabá; cidade tem 303 anos

Registro aéreo de Cuiabá; cidade tem 303 anos

LIZ BRUNETTO
DA REDAÇÃO

"Cuiabrasa", uma das capitais mais quentes do País, a cidade que tem “um sol pra cada” morador. Se por um lado tem quem a ame e defenda para tudo que é “pau rodado”, por outro, tem quem não suporte e conte os dias para ir embora daqui.

Misericórdia se você quer viver pra pagar energia vem, já tô pensando em voltar pro Paraná

 

Uma publicação recente na página no Instagram City Cuiabá, que aborda temas como gastronomia e turismo da Capital, dividiu opiniões nos comentários e mostrou como o calor e os problemas estruturais podem estar afetando o amor incondicional que outrora o povo tinha pela cidade.

 

Para uma das internautas, identificada como Vera Holistica, ficou claro que “Cuiabá é igual pequi: não tem meio termo, ou ama ou odeia. Eu amo”, disse.

 

“Vou morar em Cuiabá. Na sua opinião, o que eu preciso saber antes de me mudar para aí?”, questionou seguidor, cuja dúvida foi compartilhada pelos administradores da página.

 

“Misericórdia, se você quer viver pra pagar energia vem, já tô pensando em voltar pro Paraná, esperando meu filho casar, não tem vida fora do ar kkkkk”, disparou Rosy Spagiari.

 

O custo de vida elevado e o calor intenso foram as principais críticas a Cuiabá, além da precariedade estrutural da cidade.

 

“Cidade abandonada, cheia de mato, um calor insuportável, sem segurança, trânsito caótico, uma briga interminável entre o prefeito e o governador, uma cidade muito suja, sem calçadas que prestam, sem árvores, enfim, difícil ficar aqui”, afirmou Ernesto Faria.  

 

“Prepara para conhecer uma air fryer por dentro. Onde você é o prato a ser servido”, ironizou um internauta identificado como Zahara.

 

A seguidora Michelle Mallmann relembrou ainda as obras inacabadas da Copa do Mundo de 2014, a falta de arborização e planejamento urbano, a qualidade do ar “irrespirável” nos períodos de seca, o sucateamento da educação pública e até a falta de decoração natalina. “Pior coisa da vida é morar em Cuiabá”, afirmou.

Nossa comida regional é incrível! Temos calor? Temos! Mas nada que um ar condicionado e um bom banho de rio ou cachoeira não resolva

 

Por outro lado, os defensores destacaram qualidades da cidade e não faltaram comentários de quem veio de fora há 10, 20, 30  ou até 40 anos, dizendo não se arrepende dessa escolha.

 

“Se prepara pra ser muito bem recebida, somos um povo muito hospitaleiro”, disse Patricia Erika.

 

“O que mais me fez apaixonar por Cuiabá é justamente esse carinho e simpatia do povo cuiabano. Povo querido, hospitaleiro. Sou do Sul e meu povo não chega nem no rastro do cuiabano”, disse Gisele Borges.

 

Outros encorajaram a vinda para a cidade. “Vem sem medo”, e garantiram que esta é sim uma “excelente cidade para se morar”.

 

“Nossa comida regional é incrível! Temos calor? Temos! Mas nada que um ar condicionado e um bom banho de rio ou cachoeira não resolva. O trânsito é ruim? Não acho.... Já morei em BH e nem de longe o trânsito aqui chega perto ao de uma cidade grande. Só vem e seja feliz!”, disse Dani Borges.

 

Essa foi, talvez, a publicação mais expressiva da página com quase 2 mil comentários, enquanto outras não passam de 100.

 

Filtro de classe

 

Para entender a relação dos cuiabanos e “paus rodados” com a cidade e o gigantesco abismo entre suas percepções dela, o MidiaNews conversou com a professora do departamento de Sociologia e Ciência Política da Universidade Federal de Mato Grosso, Patrícia Marília Félix da Silva.

 

Segundo a docente, “a cidade não se apresenta de um modo uniforme para todas as pessoas”; e essa espécie de “filtro”, do gostar ou não gostar dela, “está relacionado ao papel que o indivíduo ocupa naquela cidade”, disse.

 

Félix trouxe dois extremos para exemplificar a afirmação. Segundo ela, moradores dos bairros Jardim das Américas e do Pedra 90 vivenciarão a cidade de formas diferentes, diante do local em que estão ambientadas. Se pensarmos em pessoas em situação de rua, esse abismo de percepções aumenta ainda mais.

Arquivo pessoal

Patrícia Maria Félix da Silva

Patrícia Félix, professora do departamento de Sociologia e Ciência Política da UFMT

 

Essa visão sobre a Cidade passará, portanto, pela subjetividade de cada um deles e afetará, inclusive, a percepção dos problemas que essa Cidade possa ter.

 

“Nem todas as pessoas de uma mesma cidade têm o mesmo acesso aos recursos que são considerados básicos. Está relacionado ao seu pertencimento de classe, ao acesso a recursos, ao quanto ela consegue se mover, por exemplo, na cidade”, disse.

 

“Quem mora em condomínios próximos ao parque Mãe Bonifácia têm uma vivência em termos de clima e temperatura diferente de quem mora nas partes mais quentes, como no Centro”, completou.

 

Para além dos aspectos estruturais de se vivenciar a cidade, está também o fator social e simbólico, explica a docente. 

 

“O apego às raízes da cidade vai se transformando ao longo dos anos, ao mesmo tempo em que ele não deixa de existir. Tanto é que tem pessoas orgulhosas em fazerem parte da cidade, mesmo com todos os problemas estruturais”.

 

“Como o indivíduo foi socializado naquele contexto, ele tem apego emocional e afetivo com aquelas raízes, em termos de comida, de cultura, dança, vestimenta, ele se sente parte daquilo”, explicou.

 

Cidade ainda hospitaleira

 

A fama de cidade hospitaleira que Cuiabá carrega, segundo a docente, se mantém, apesar dessa realidade ter se transformado ao longo dos anos com a chegada de pessoas de outros estados e com a própria correria do dia a dia.

 

“Às vezes não dá tempo de ter um diálogo mais fluido entre as pessoas e isso faz com que essa hospitalidade possa ir se perdendo pouco a pouco, por conta justamente dessa agitação do dia a dia e dessa dificuldade de viver a cidade”, disse.

 

Calor de “matar”

 

O calor e a falta de infraestrutura são pontos que pesam na sensação de bem estar e afetam o seu humor do cuiabano.

 

“Temos alguns parques, mas pelo calor, pelas ruas não serem tão planas, e pela cidade não ter sido planejada para integrar os bairros, sendo cortadas por grandes avenidas, o que dificulta a locomoção a pé, tudo isso dificulta a vivência em termos de estar em espaço aberto”, disse.

 

Segundo a docente, a falta de segurança é outro fator que interfere na dinâmica do indivíduo com a cidade, adicionando a esse cenário também o fator gênero.

 

“Se a gente pensar nesse recorte de gênero para a mulher, para o público LGBTQIA+, é muito mais difícil. Eles se sentem muito mais vulnerável e andam com medo na rua”.

 

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5 Comentário(s).

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Ademir  15.01.24 09h29
Cheguei a pouco em Cuiabá, agora em Janeiro 2024, estou estarrecido com tanto mato nas calçadas , lotes abandonados, calçadas horríveis , e o principal buracos em todos asfaltos , e pistas sem pintura , sem sinalização!!!!!! Cidade abandonada!!!!!
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Pedro Neves   14.01.24 15h50
De longe é a pior capital do centro-oeste em termos de infraestrutura, por culpa não só do poder público, mas da população extremamente porca. Só quem anda a pé vê o abandono das calçadas. É um absurdo aquela Beira-rio, a Dr. Meirelles, a Fernando Correia, a Prainha. Na Av. do CPA tem um terreno no lado do shopping tomado de lixo na calçada em toda sua extensão. Nao tem padronização das calçadas. Prefeitura não multa ninguém. As condomínios de edifício só limpam a parte da frente. Dá uma volta a pé no Bosque da Saúde e no Alvorada pra ver. No CPA não tem árvore nas calçadas. Pra coroar isso tudo, ainda tem que aguentar música sertaneja tocando pra tudo quanto é lado. Só salva mesmo o povo da cidade.
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Cleusa Corrêa Amaral.  14.01.24 12h26
Cuiabrasa, Cidade 40 Graus, Cuiaforno, não importa o quê digam, para mim é a Cidade do Rio Cuiabá, do Peixe, do Pequi, do povo cuiabano querido, das moças da dominguinhas, do São Gonçalo, de São Benedito, das Tradições Culturais...Essa é a minha, a nossa Cuiabá-MT...Amo tudo isso! VEM PRA CÁ VC TBM.
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José   14.01.24 11h54
Infelizmente Cuiabá tem uma administração atrasada e incompetente onde um cara que foi filmado embolsando dinheiro suspeito é o prefeito..aí não dá para reclamar.
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aloisio  14.01.24 08h57
O cuiabano antigo tem uma hospitalidade exemplar. O calor é típico da região. O que não é aceitável é o descaso da sociedade e dos gestores público com a cidade, por exemplo, a quantidade de lixo e sujeira pela cidade.simplesmente inaceitável. Enfim, não é normal, a forma como a cidade está abandonada pelos setores públicos e mesmo privado. A continuar nesse nível o futuro não é nada promissor.
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