JAD LARANJEIRA
DA REDAÇÃO
Um dos patrimônios históricos mais antigos da Capital, e que deveria ser um dos mais lindos pontos turísticos de Cuiabá, se encontra hoje em estado de completo abandono pelas autoridades municipal e estadual.
Quem atualmente passa pelo Parque Antônio Pires de Campos – mais conhecido como Morro da Luz – não percebe que o local, com um pouco de cuidado e segurança, poderia ser um ótimo lugar para fazer caminhadas, passeios, ou reunir a família em uma das praças e recintos que ali existem.
Considerado o único parque ecológico do Centro da Capital, o Morro da Luz foi tombado como patrimônio histórico municipal pelo Decreto de Lei nº 870, de 13 de dezembro de 1993, e ganhou o nome do filho do bandeirante Manoel de Campos Bicudo, que foi um dos primeiros colonizadores a atingir o local.
Em entrevista ao
MidiaNews, o historiador João Carlos Vicente Ferreira afirmou que existem várias versões pelas quais o Morro da Luz ficou conhecido por este nome. Uma das mais conhecidas relata que o local era tomado pelo ouro.

"Existe a versão de que ali havia muitas pepitas de ouro e aquela luminosidade refletia bastante"
“Existe a versão de que ali havia muitas pepitas de ouro e aquela luminosidade refletia bastante”, disse.
No entanto, a versão oficial para que o nome, conforme comprovam documentos históricos, é devido à existência, naquela área, de uma pequena casinha, a subestação da Usina Hidrelétrica de Casca I, que fazia a distribuição de energia.
“Os documentos oficiais provam que o nome se originou em função de ter um motor que gerava energia elétrica, em 1920. Ali foi construída uma casinha que se chamava 'casinha de luz', e por causa disso, o elevado ficou conhecido como Morro da Luz”, afirmou o historiador.
No local, segundo Ferreira, também existiu um famoso prostíbulo, conhecido como “Palácio das Águias”, que foi construído em 1801 e demolido em 1960, dando lugar ao espaço onde hoje as pessoas pegam ônibus.
“É um lugar que tem inúmeras espécies da flora, do cerrado, quanto das matas de transição. É um ponto de preservação que merece cuidado e, infelizmente, não está sendo motivo de atenção dos órgãos públicos”, afirmou o historiador.
Abandono e insegurança
Bruno Cidade/MidiaNews
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Morro da Luz possui trilhas e praças que são pouco visitadas pela população
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Os rastros de destruições são vistos por qualquer um que passar pelo parque.
O espaço, que outrora já foi rico em beleza, fica localizado no encontro das avenidas Coronel Escolástico e Tenente-Coronel Duarte (Prainha).
O morro, que enchia os olhos das pessoas que ali passavam e já foi digno de um cartão postal, hoje gera medo em quem passa por perto e é frequentado quase que exclusivamente por usuários de drogas, moradores de rua e assaltantes.
Jaquelaine de Oliveira, de 30 anos, veio do Maranhão e não tem parentes em Cuiabá. Moradora de uma casa localizada na escadaria que margeia o “Morro da Luz” há dois anos, ela diz que não sai mais à noite, para não deixar a casa sozinha, com medo de assalto.
“No pouco tempo que moro aqui, já entraram na minha casa e levaram tudo. Tive um prejuízo enorme”, disse.
Na residência, moram Jaquelaine, o marido e duas filhas pequenas, e o maior medo deles, segundo a moradora, é a frequência dos usuários de drogas na região.
“Um dia, um homem bateu forte na janela chamando por “primo”, dizendo que tinha acabado de sair da delegacia. Ficamos com medo, não abrimos a porta e tivemos de chamar a Polícia”, relatou.
Para Vagner de Souza, que mora há 17 anos no final da escadaria, a situação do Morro da Luz é de total abandono.
“A não ser na época de campanha política, eu só vi essa escadaria ser varrida uma vez. Se hoje está mais ou menos limpo, é por nossa causa. As autoridades esqueceram daqui. Já cansei de ligar e solicitar ações da Prefeitura”, desabafou.
A falta de segurança, segundo Vagner, é o maior problema. Segundo ele, há uma casa abandonada na região que está sendo usada por bandidos como esconderijo, quando “aprontam” no Centro da cidade.
Além disso, segundo ele, durante o dia, o que mais é possível ver são alunos de escolas das redes Municipal e Estadual e de colégios particulares, fumando.
“Às vezes, esses alunos ficam aqui na frente da minha casa fumando e, quando vamos reclamar, acham ruim. Eu pago um absurdo de imposto e não tenho limpeza e segurança nenhuma”, reclamou.
Bruno Cidade/MidiaNews
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Pessoas que moram próximo à escadaria do Morro da Luz reclamam de falta de atenção do poder público
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A esposa de Vagner, Elisângela de Souza, relatou à reportagem que a limpeza de rua não passa por ali e que já precisou ir várias vezes à Prefeitura, durante quatro meses, para conseguir uma iluminação adequada no local.
“Uma vez, perguntei para o gari por que a ladeira não era limpa, e ele disse que não sabe. Já fui várias vezes até à secretarial municipal responsável, mas nada muda”, disse.
Revitalização
O Morro da Luz deveria ter sido revitalizado para a Copa do Mundo de 2014.
Em 2012, a Secretaria de Estado de Turismo (Sedtur) anunciou um projeto que beneficiaria três pontos turísticos da Capital - incluindo o Morro da Luz – e que custaria em torno de R$ 10 milhões.
Entre as obras a serem realizadas no morro, estava prevista a construção de um mirante com 23 metros de altura.
O projeto de revitalização acabou passando para as mãos da Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo (Secopa), responsável por executar todos os projetos do Mundial, mas nunca saiu do papel.
Pontos históricosUm dos pontos que fazem parte da história do Morro da Luz é a “Bica da Prainha”. Trata-se de uma antiga mina d’água que, segundo o historiador João Carlos Ferreira, jorrava de um pedestal na Avenida Tenente-Coronel Duarte.
Em 1920, a bica se localizava ao pé do morro e era um lugar muito rico em água canalizada, tendo fornecido, por muitos anos, água de qualidade para a população que ali se abastecia.
Atualmente, uma réplica pode ser vista em frente ao atual Edifício Garagem Abdala Mansur.
Para o historiador, o Morro da Luz faz parte da formação da cultura popular de Cuiabá, o que pode ser observado nos nomes dados às trilhas e às praças do local, batizados com os nomes de personagens da década de 1920 que eram mais populares.
No Morro, existe uma placa onde é possível observar o nome de cada praça e trilha e a história de cada um dos personagens.
“No Morro da Luz, existem nove trilhas e cinco praças, cada uma com um nome de personagens da história de Cuiabá que foram marcantes”, disse o historiador.
Bruno Cidade/MidiaNews
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Réplica da "Bica da Prainha" que, em 1920, fornecia água canalizada para a população
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Os nomes das trilhas são: Maria Taquara, Tufica, Michidinha, Juvenal Capador, Maria Perna Grossa, Guaporé, General Saco, Chico Alicate e Hélio Goiaba.
Já as praças foram nomeadas de Praça Zé Bolo flor, João Cuíca, Cobra fumando, Antonio Peteté e Praça Preta –
confira a história de cada um na foto que consta na galeria.
Outro ladoO
MidiaNews entrou em contato com a assessoria do Gabinete de Assuntos Estratégicos, que assumiu alguns dos projetos da extinta Secopa, na atual gestão.
A pasta, por meio da assessoria, alegou que todos os projetos da extinta Secopa que não foram começados na gestão passada passaram para a Secretaria de Estado de Cidades (Secid).
Procurada pela reportagem, a Secid informou, via assessoria, que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) solicitou uma Compensação Mitigatória para a liberação da obra do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) na região, que seria a revitalização de paisagismo do Morro da Luz.
No entanto, até o momento, o Consócio VLT não teria apresentado nenhum projeto para os órgãos competentes, segundo a Secid.