A advogada e ex-primeira-dama do Estado, Samira Martins, emprestou seu celular e deu carona para a personal trainner Helen Christy, esposa do ex-chefe da Casa Militar, coronel Evandro Lesco, com o objetivo de ajudar a amiga a recuperar dois telefones furtados da casa dela pelo tenente-coronel José Henrique Costa Soares.
A informação consta no depoimento do tenente-coronel José Soares à delegada Ana Cristina Feldner, citado na decisão do desembargador Orlando Perri, que autorizou a deflagração da Operação Esdras, na última quarta-feira (27).
O suposto esquema investigado na operação era viabilizado pela prática de interceptações telefônicas clandestinas na modalidade “barriga de aluguel”, quando números de telefones de cidadãos comuns, sem conexão com uma investigação, são inseridos em um pedido de quebra de sigilo telefônico à Justiça.
O coronel Lesco e Helen foram detidos preventivamente. A delegada chegou a solicitar a condução coercitiva de Samira Martins, mas Perri afirmou que ainda não existiam elementos suficientes contra a advogada.
José Soares, que é escrivão do Inquérito Policial Militar (IPM) que apura a reponsabilidade dos militares investigados nos grampos em âmbito administrativo, contou que foi cooptado e coagido por Evandro Lesco e Helen Christy a colaborar com o grupo criminoso.
A coação teria ocorrido mediante a ameaça de que, caso não ajudasse a fornecer informações privilegiadas e atrapalhasse a apuração do caso, o grupo revelaria à Polícia Militar que ele possuía vício em drogas e teria supostamente cometido ilícitos em uma sociedade empresarial.
Após decidir confessar os fatos à Justiça, José Soares afirmou que buscou elementos para subsidiar seus depoimentos e, por isso, furtou dois celulares da casa de Evandro Lesco e Helen Christy, no dia 17 de setembro.
“Saindo de lá passei, fui pegar alguma coisa para comer, porque eu não comi muito bem, até fiquei com receio. Então eu não comi muito bem, então eu passei no Japidinho e peguei, fiz um prato e fui comer em casa. Por volta das, senão me engano, se não me falha a memória, tá tudo no celular, porque tem todas as ligações que eu recebo, tem todas as mensagens que eu recebo, inclusive que eu recebi também, mostrei, tudo mais, ela [Helen] fala que o celular dela ficou no meu carro. Não é ela que me liga. Quem me liga é a doutora Samira. Ela manda mensagem, e liga via WhatsApp, se não me engano, tá tudo no celular. Ela fala que o celular da Helen provavelmente estava no meu carro. Eu falei, meu carro tá aqui, vou dar uma olhada e retorno”, disse.
De acordo com o tenente, primeiramente, foi Samira quem falou ao telefone para verificar se o celular de Helen estava em seu carro.
Em seguida, ainda do celular de Samira, Helen pediu a localização de sua casa para buscar os aparelhos. Pouco depois, José Soares disse que Evandro Lesco também ligou para ele, ocasião em que ameaçou a vida de seu filho.
“Olha, não sei se você pegou meu celular, porque só pode ter sido você, os dois celulares daqui sumiram, eu não sei se foi você, mas só pode ter sido você, porque só você esteve aqui. Eu não sei se você pegou por má-fé ou se você pegou por distração. Eu só quero saber o seguinte, devolva, porque seu filho está correndo risco de vida”, teria dito Lesco, segundo o relato.
Além da ligação, conforme o tenente, Helen Christy usou o celular de Samira Martins para mandar áudios para ele, via aplicativo WhatsApp.
“Porque a Helen também manda um áudio pelo WhatsApp da Doutora Samira, falando de que não conseguiu encontrar minha casa, que me ajudasse, que ajudasse Helen a encontrar minha casa, porque ela queria ver se o celular dela havia ficado no meu carro”.
Carona
A personal Helen Christy, que foi detida pela Polícia Civil
Após a alegada ameaça de Lesco, o tenente José Soares afirmou ter ficado apavorado e pensando se entregava ou não os celulares furtados.
“Eu tava sob, realmente, ali perigo de acontecer alguma coisa com meu filho, a ameaça que ele fez me deixou numa situação muito complicada, então quando ela [Helen] vem de frente para mim, eu abro o portão, ela se encontra comigo, eu já mostro que está na parte do carro, na parte do banco do passageiro né, tem aquele, onde você coloca as coisas. Ela pega e coloca no short, e pergunta se por acaso eu não peguei mais nada por engano, de tom irônico. Eu falo não, não peguei mais nada, é só isso mesmo que eu peguei, mas me desculpei na hora”.
Conforme o depoimento, foi Samira Martins quem deu carona para Helen Christy ir até a sua casa reaver os celulares. Todavia, o tenente disse que a ex-primeira-dama aguardou a amiga no carro.
Em outro trecho do depoimento, José Soares afirmou que foi abordado por Samira Martins e entendeu que tal abordagem teve o intuito de a advogada mostrar a ele que sabia sobre as atividades que o mesmo prestava ao grupo criminoso.
Na ocasião, a ex-primeira-dama teria dito: “Você é amigo do Lesco, né? A gente sabe o que você fez”.
“Ela estava falando que sabia de tudo, de sua dependência química, da situação o envolvendo na empresa e até da gravação [...] parecendo estar querendo dizer ao depoente que era do mesmo ‘grupo’, que ele poderia confiar nela”, interpretou o tenente.
“Estreitíssima ligação”
Apesar disso, o desembargador Orlando Perri afirmou que estas situações ainda não trouxeram elementos suficientes, até o momento, que demonstrasse o envolvimento de Samira Martins na organização, “não a ponto de se tomar contra ela medidas cautelares drásticas, como prisão, por exemplo”.
“Com o avançar das investigações, constatou-se que Samira Martins, ao que parece, possui estreita – para não se dizer estreitíssima – ligação com Helen Christy Carvalho Dias Lesco [esposa do Cel. PM Lesco e também investigada no presente inquérito policial], tanto que a acompanhou até à residência do Ten.-Cel. Soares no domingo à noite [17/9/2017], chegando a emprestar seu aparelho celular para que Helen pudesse conversar com o Escrivão do IPM”, disse Perri.
De acordo com Perri, o apoio de Samira à Helen e o fato de a advogada ter conhecimento da situação do tenente-coronel José Soares, por si só, “não demonstram, efetivamente, sua concreta ligação com a organização criminosa que se formou”.
“Obviamente que, com o decorrer das investigações, surgindo novos fatos, esta conclusão poderá ser modificada. Porém, pelo menos por ora, não vejo elementos hábeis a confirmar o envolvimento de Samira Martins com a organização criminosa, salvo, repito, sua amizade íntima com a investigada Helen”, afirmou.
Outro lado
A advogada Samira Martins afirmou à reportagem, na última qinta-feira (28), que não tinha conhecimento dos fatos e que só irá se pronunciar após ter acesso ao inteiro teor da decisão.
Veja fac-símile de trecho da decisão:
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