Investir mais em comunicação e tomar decisões mirando o longo prazo são alguns dos conselhos recebidos pelo atual presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, de seus antecessores. As recomendações fazem parte da série "Conversas presidenciais", que marca a comemoração dos 60 anos da autoridade monetária.
Ao todo, foram dez episódios divulgados semanalmente, nos quais Galípolo entrevista alguns dos principais nomes que moldaram a história do BC. São narradas, entre outras lembranças, a evolução do Copom (Comitê de Política Monetária) e o enfrentamento de crises bancárias, cambiais e internacionais que alteraram o rumo da economia brasileira.
O papel da comunicação do BC foi mencionado desde o primeiro episódio, na conversa com Wadico Bucchi, que lidou com uma pressão política por tabelamento de juros logo no início de sua gestão (de 1989 a 1990).
Para o ex-presidente do BC, é importante transmitir à sociedade a mensagem de que o BC trabalha pela estabilidade. "O Banco Central não deve ser um agente de volatilidade. [...] Eu sei que isso politicamente é difícil em alguns momentos", disse.
Bucchi exaltou o papel de comunicador de Galípolo, acrescentando que essa habilidade será de grande valia para o BC ao longo de seu mandato.
No episódio seguinte, Gustavo Loyola -que lidou com uma crise bancária em sua segunda passagem na chefia, de 1995 a 1997-- ressaltou que a comunicação tornou-se cada vez mais necessária com o surgimento de novas tecnologias.
Além das novas mídias, ele também citou a redistribuição de forças entre os Poderes em Brasília. "Hoje tem que ter uma comunicação muito forte não apenas com o Executivo mas com o Legislativo e o Judiciário", acrescentou.
Dica semelhante foi dada por Alexandre Tombini, presidente do BC no governo de Dilma Rousseff (PT), entre 2011 e 2016. "Eu aconselharia o presidente lá atrás a investir muito na comunicação com a sociedade. [...] É uma área em que tem que investir [ainda mais] nos dias de hoje, com os novos meios de comunicação", disse.
Roberto Campos Neto, que passou o bastão para Galípolo na virada do ano, falou da importância de se aproximar do Congresso Nacional para a aprovação de projetos de interesse do Banco Central.
"Se não tivesse tido essa aproximação com a ala política, eu não teria conseguido aprovar quase nada", afirmou.
Na conversa, o ex-presidente do BC alertou Galípolo a afastar a autoridade monetária ao máximo da polarização política e disse não sentir saudade das críticas que recebia do Executivo.
Nomeado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), Campos Neto foi o primeiro a chefiar a autoridade monetária sob o regime de autonomia, que entrou em vigor em 2021 e foi alvo de ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
No décimo e último episódio da série, Campos Neto também recomendou que Galípolo tenha paciência, ressaltando que não se trata de uma "corrida de 100 metros".
Essa visão de longo prazo apareceu também no discurso de outros líderes do Banco Central, como Pedro Malan --chefe da instituição de 1993 a 1994, na implementação do Plano Real.
"É muito importante você saber que tem um horizonte de quatro anos pela frente. [...] Pode ser uma grande vantagem, você poder olhar curto, médio e longo prazo e suas interações, saber que tem certas coisas que se desdobram no tempo", afirmou.
Ainda de acordo com Malan, a maior contribuição que alguém pode dar é chamar a atenção dele para um problema, ainda que às vezes seja uma "coisa boba".
Ilan Goldfajn, que lidou com um período de crise com recessão econômica e inflação fora da meta concomitantes em um cenário de juros elevados em sua gestão, de junho de 2016 a fevereiro de 2019, foi outro que aconselhou Galípolo a ter uma perspectiva de horizonte.
"Tem fogueira para apagar todos os dias. Noventa e nove por cento dessas coisas vão passar. Então, calma, não fique tão estressado", disse.
Com Ilan, Galípolo conversou sobre uma antiga decisão do Copom de manter a taxa básica de juros (Selic) em um nível elevado por tempo prolongado --cenário que tende a se repetir nos próximos meses. No passado, a estratégia trouxe mais credibilidade para a atuação da autoridade monetária e ajudou no combate à inflação.
Saber lidar com os problemas de forma mais serena também foi a sugestão de Henrique Meirelles --o mais longevo presidente do BC, de janeiro de 2003 a dezembro de 2010, durante os dois primeiros mandatos do presidente Lula.
"Calma sob pressão", afirmou o ex-chefe da autarquia, que defendeu a tomada de decisões "tecnicamente corretas" sobre a política de juros, com base em modelos de análise, para que seja possível manter a variação de preços sob controle.
Responsável pela implementação do sistema de metas de inflação, em 1999, Arminio Fraga compartilhou com Galípolo o conselho dado por ele no passado a Stanley Fischer, seu amigo e ex-presidente do banco central de Israel, morto no fim de maio.
"Foca o que importa. Não inventa, a não ser que seja absolutamente necessário", afirmou. Recomendou também preparação para lidar com tensão política. "Tenha em mente que o seu capital político é limitado, então, você tem que usá-lo de forma inteligente, parcimoniosa."
Já Persio Arida, que ficou seis meses no comando, em 1995, destacou que o BC deve tomar a dianteira nas questões regulatórias -o que ele classifica como um "baita desafio" diante das transformações tecnológicas.
Disse também que é difícil ter previsibilidade quando o assunto é a estabilidade do sistema financeiro. "Alguma hora algum problema acontece e nunca é onde você imagina. Problemas bancários surgem quando você menos espera", disse.
Com gestão marcada por crises internacionais, de 1997 a 1999, Gustavo Franco é outro ex-presidente do BC que avalia que imprevistos são predominantes. Para ele, não existe receita de sucesso. "Tenha bons princípios, vá com a alma limpa trabalhar e faça o melhor que você puder", declarou.
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