Uma reportagem publicada pelo site UOL, nesta segunda-feira (6), revelou dados de um relatório elaborado pela fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU), que apontam para indícios de sobrepreço e possíveis desvios de recursos em obras de recuperação de estradas vicinais em Mato Grosso.
As obras foram financiadas com verbas do Ministério da Agricultura em quatro cidades, consideradas bases eleitorais do ministro da Pasta, Carlos Fávaro (PSD).
Leia a materia na íntegra:
Fiscalização do TCU (Tribunal de Contas da União) apontou indícios de sobrepreço e possíveis desvios no valor de R$ 10,6 milhões em obras de recuperação de estradas vicinais feitas com verbas do Ministério da Agricultura.
O relatório cita quatro cidades de Mato Grosso, base eleitoral do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD). Ele foi vice-governador, é senador licenciado e uma das principais lideranças politicas do estado.
O TCU levantou deficiências em três procedimentos de engenharia. Vários pontos do relatório mencionam falhas de fiscalização que culminaram em R$ 10,6 milhões sob suspeita, assim distribuídos:
R$ 1,6 milhão - pagamentos de cascalho;
R$ 3,8 milhões - desembolsos por serviço sem comprovação de execução;
R$ 5,2 milhões - valor pago em material e pessoal que supera o necessário para a obra.
Ministério diz que trabalha "com transparência, lisura e eficiência". Em nota, disse ainda que "está apurando as informações junto às partes envolvidas sobre as ações de recuperação de estradas vicinais" e vai enviar ao TCU ainda hoje. "Havendo eventual desvio de finalidade ou dano ao erário, serão adotadas as medidas cabíveis e legais pelo ministério", segue o texto. "Grande parte das determinações do acórdão já foi plenamente atendida pelo Mapa, que vem trabalhando e adotando todas as medidas necessárias para garantir a boa execução dos projetos."
O relatório do TCU foi apresentado em 10 de setembro. O documento, redigido pelo ministro Walton Alencar Rodrigues, se baseou em fiscalização feita entre março e novembro do ano passado e examinou obras contratadas entre 2019 e 2023.
Os quatro municípios citados pelo TCU não se manifestaram. A lista contém as seguintes cidades de Mato Grosso:
Convênios explodem sem fiscalização
O TCU ressalta o crescimento de convênios a partir de 2023. Este foi o primeiro ano de Fávaro à frente do Ministério da Agricultura. Até então, a forma preferida para transferência de verbas era por contrato de repasse —administrado e fiscalizado pela Caixa Econômica.
O relatório ressaltou a preferência que a gestão Fávaro deu aos convênios. Também é a apontado que Mato Grosso se tornou o principal destino destas verbas.
10 convênios assinados entre 2019 e 2022;
0,3% dos recursos para estradas vicinais saiam de convênios;
183 convênios firmados em 2023;
59% dos recursos para estradas vicinais saíram de convênios;
R$ 147,3 milhões (47,4%) de toda a verba para estradas vicinais foi para o Mato Grosso.
Enquanto os desembolsos cresceram, a fiscalização diminuiu. O TCU ressalta que, ao priorizar os convênios, o Ministério da Agricultura abriu mão de toda a expertise que a Caixa Econômica tinha na fiscalização de recuperação de estradas vicinais.
"Verificou-se que nem o Mapa [Ministério da Agricultura] nem os convenentes [prefeituras] dispõem de procedimentos compatíveis para a avaliação e fiscalização", diz trecho do relatório do TCU
Transporte falso de cascalho
O TCU apontou pagamento de quase R$ 1,6 milhão por transportes que não aconteceram. A suspeita surgiu ao analisar a jazida indicada como fonte de cascalho para a recuperação de estradas vicinais na cidade de Canarana.
A jazida fica 34,68 km distante da obra. Foi pago R$ 1,6 milhão para caçambas fazerem este trajeto. Cálculos do TCU indicaram que o custo do serviço não passava de R$ 100 mil.
Fiscais descobriram que as viagens não aconteceram. Técnicos do TCU percorreram a estrada em recuperação e perceberam a retirada de cascalho da beira da rodovia.
O material foi coletado em pontos próximos ao canteiro de obras. "A DMT [distância média de transporte] do serviço de recomposição de revestimento primário seria de 0,95 km", descreve um trecho do relatório.
O TCU indica uma discrepância milionária entre o que foi desembolsado e o custo real. Os valores foram calculados pelos técnicos responsáveis pelo relatório e classificados como "indício de superfaturamento".
Valor pago: R$ 1.684.557,39
Custo real: R$ 96.370,56
Diferença: R$ 1.588.186,83
Pagar por um serviço e receber outro
O relatório indica R$ 3,8 milhões em sobrepreço nas obras. O motivo seria pagar pela recomposição mecanizada de aterro (um serviço mais caro), mas na verdade ser executada a elevação de greide (mais barata).
Recomposição mecanizada de aterro - recuperação do aterro retomando suas dimensões e inclinações originais e eliminação de erosão.
Elevação de greide - aumentar a altura de uma via adicionando e compactando camadas de materiais como brita ou cascalho.
Outra vez é citado pagamento por transportes não executados. As prefeituras incluíram uso de caçambas para transportar material de jazida por 2 km.
O relatório considera o serviço desnecessário e afirma que ele não ocorreu. "Inexiste comprovação de que o caminhão basculante de 6 m3 tenha sido usado, não havendo nenhum registro desse equipamento, seja nos relatos das vistorias físicas, nos diários de obra ou nas fotografias incorporadas aos relatórios de acompanhamento."
Os cálculos apontaram o sobrepreço por cidade. A lista abaixo contém os valores:
Alta Floresta - R$ 285.759,38;
Canarana - R$ 1.890.255,24;
Gaúcha da Norte - R$ 694.069,61;
Querência - R$ 962.982,20;
Total - R$ 3.833.066,43
Contratações superdimensionadas
O TCU descobriu ainda R$ 5,2 milhões em gastos com custeio acima do justificável. O motivo seria a contratação de máquinas, pessoas e serviços em quantidade acima do necessário para as obras.
O relatório ressalta que a recuperação de estradas vicinais não é algo complexo. "Os serviços relacionados à pista de rolamento se limitam a procedimentos de terraplenagem, visto que não há capas ou revestimentos asfálticos, de concreto ou qualquer acabamento que não o material terroso [cascalho]."
Veja cálculo por município:
Alta Floresta - R$ 987.988,14;
Canarana - R$ 1.695.970,92;
Gaúcha do Norte - R$ 1.144.079,28;
Querência - R$ 1.401.894,50;
Total - R$ 5.229.932,84.
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