Cuiabá, Quinta-Feira, 3 de Julho de 2025
ALIMENTAÇÃO
21.04.2019 | 11h23 Tamanho do texto A- A+

“Novos hábitos podem ter contribuído para aumento de alergias”

Segundo especialista, novos alérgenos tem surgido devido a mudanças no estilo de vida da população

Alair Ribeiro/MidiaNews

A especialista em Alergias e Imunologia, Ana Carolina Santos, atua na área há 12 anos

A especialista em Alergias e Imunologia, Ana Carolina Santos, atua na área há 12 anos

BIANCA FUJIMORI
DA REDAÇÃO

Embora os dados sejam escassos no Brasil, os profissionais da saúde têm notado um aumento no número de pessoas com alergias alimentares, de acordo com a médica especialista em Alergias e Imunologia, Ana Carolina Santos.

 

Essa grande incidência é visível principalmente no Ocidente. Cerca de 17 milhões de europeus sofrem com algum tipo de alergia relacionada à comida, segundo a Academia Europeia de Alergia e Imunologia Clínica. Nos Estados Unidos, calcula-se que haja 15 milhões de pessoas com alergias alimentares.

 

Conforme Ana Carolina, há um aumento no diagnóstico e as explicações para esse fato são inúmeros. Porém o que tem chamado atenção é a teoria que diz respeito às mudanças no estilo de vida.

 

“Com as mudanças que estão acontecendo, com frequência a gente vê novos alérgenos, alimentos que antes a gente não via causando alergia, como castanhas. Isso porque nós mudamos os nossos hábitos”, apontou.

 

A alergia alimentar pode manifestar com aquelas placas, tipo urticária. É imediato após a ingestão do alimento, em geral em até 30 minutos após a ingestão. [...] A intolerância alimentar é um quadro mais relacionado ao trato gastrointestinal

O fator genético também conta muito, mas a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai) acredita que, em se tratamento da influência ambiental, o fato de hoje se viver em ambientes tão limpos deixou o organismo sensível.

 

“Provavelmente é a nossa relação com o ambiente mesmo, a mudança dos alimentos, a forma de consumo dos alimentos, mudança da nossa vida”, explicou a médica.

 

De acordo com Ana Carolina, a alergia é causada pelo sistema imunológico ao reagir a proteínas presentes nos alimentos.

 

Os sintomas variam desde vermelhidão da pele, urticária e inchaço até - nos casos mais graves - vômitos, diarreia, dificuldade respiratória e choque anafilático.

 

Leia os principais trechos da entrevista:

 

MidiaNews - Quais são os alimentos mais comuns em casos de alergia?

 

Ana Carolina Santos - Varia um pouco entre adultos e crianças. Mas os mais comuns são leite, ovo, soja, trigo, amendoim, peixe e frutos do mar. Esses sete são os mais comuns no geral. Mais ou menos nessa ordem, sendo que criança é nessa ordem mesmo. No adulto, já tem mais frutos do mar e camarão.

 

MidiaNews - Os sintomas da alergia alimentar diferem de pessoa para pessoa e de alimento para alimento?

 

Ana Carolina Santos - Pode sim. A alergia alimentar não é uma doença única, ela tem nome e sobrenome. Então a pessoa pode ter uma síndrome da alergia oral, que ela come o alimento e fica com vermelhidão, formigamento, coceira ao redor da boca, dentro da boca, na língua. Esse é um tipo de alergia. Ela pode ter uma urticária com angiodema, que são aquelas lesões que coçam pelo corpo todo, inchaço. E ela pode ter a urticária com angiodema mais os sintomas de anafilaxia.

 

Existem várias formas de a alergia alimentar se manifestar. E a pessoa tende a ter aquele tipo de alergia que ela tem. E pode também ser uma alergia tardia, que é outro mecanismo de alergia. Geralmente são manifestações do trato gastrointestinal, que é diarreia com sangue, alteração da absorção dos alimentos. São formas diferentes da manifestação da alergia. E tem ainda as alergias mistas, que são tanto por esse mecanismo imediato quanto por tardio. Por exemplo, a pessoa pode ter uma dermatite atópica, que é uma doença da pele e essa dermatite ser agravada por uma alergia alimentar. Tem várias formas de apresentar em uma pessoa.

 

esde que a gente nasce, a gente começa a ter o contato com os alimentos. O nosso organismo desenvolve tolerância, mecanismos de reconhecer que as proteínas dos alimentos não são estranhas, não vão causar mal para o nosso organismo

MidiaNews - Como diferenciar a alergia da intolerância alimentar?

 

Ana Carolina Santos - A alergia tem os sintomas específicos. A alergia alimentar pode manifestar com aquelas placas, tipo urticária. É imediato após a ingestão do alimento, em geral em até 30 minutos após a ingestão. Pode ocorrer também os edemas que a pessoa fica deformada também de início rápido. Pode estar associado, junto com esse quadro, a pessoa ficar hipotensa, mole, perder a consciência, desmaiar mesmo. Ter um quadro respiratório junto por falta de ar ou edema da garganta ou da laringe, que a gente chama de anafilaxia, que é o quadro mais grave de alergia alimentar. E é de início rápido após a ingestão do alimento.

 

A intolerância alimentar é um quadro mais relacionado ao trato gastrointestinal. O paciente não apresenta aquelas urticárias, as placas no corpo de coçam, vermelhidão. Ele come e tem um quadro de vômito, diarreia, distensão abdominal, aumento de gases. Em geral não é tão rápido, depende do grau de intolerância.

 

Mas existem as alergias alimentares não imediatas, que pegam só o trato gastrointestinal.

 

MidiaNews - Quais são os componentes dos alimentos que podem causar alergia?

 

Ana Carolina Santos - A alergia, geralmente, é causada pela proteína do leite ou do alimento que a pessoa é alérgica. Pode ser qualquer alimento, mas em geral são as proteínas que causam a alergia.

 

MidiaNews - Por que alguns alimentos provocam mais alergias que outros?

 

Ana Carolina Santos - No geral, a gente come esse alimento e tem uma tolerância. Por que a gente não considera esse alimento sempre estranho ao nosso organismo? Desde que a gente nasce, a gente começa a ter o contato com os alimentos. O nosso organismo desenvolve tolerância, mecanismos de reconhecer que as proteínas dos alimentos não são estranhas, não vão causar mal para o nosso organismo. O sistema imune lida com isso tolerando as proteínas. Uma das coisas que faz com que a pessoa desenvolva alergia é que essas pessoas não tem essa tolerância ao alimento naquela proteína e o sistema imune acha que é algo ruim e monta uma defesa, uma reação para combater aquela proteína e é onde dá a alergia.

 

MidiaNews - Por que tantas pessoas têm alergia ao leite e ovo?

 

Alair Ribeiro/MidiaNews

Ana Carolina Santos

"A pessoa que já teve alguma vez na vida um quadro de anafilaxia, que é essa reação alérgica grave, deve portar com ela adrenalina auto injetável"

Ana Carolina Santos - Tem muito haver com as proteínas do leite e do ovo serem mais capazes de causar essa resposta imune ao nosso organismo. Elas são mais alergênicas. São proteínas mais causadoras de alergia.

 

As alergias alimentares estão aumentando, mas também existe o super diagnóstico então nem sempre o que é diagnosticado como alergia é de fato alergia. Mas realmente as alergias verdadeiras estão aumentando. Existem várias hipóteses para tentar justificar isso. Provavelmente é a nossa relação com o ambiente mesmo, a mudança dos alimentos, a forma de consumo dos alimentos, mudança da nossa vida. E existe também a epigenética, que a gente incorpora no nosso DNA alterações do ambiente ao longo dos anos. A gente vai se tornando mais alérgico mesmo.

 

MidiaNews - Por que as crianças são mais afetadas por alergia que os adultos?

 

Ana Carolina Santos - Uma das coisas que a gente pode justificar é justamente o início do contato com o alimento. Provavelmente, não ocorreria essa tolerância necessária para que a pessoa não tivesse alergia, que pudesse comer normalmente e não ter nenhum sintoma. Então, é mais no início do contato com esses alimentos, essas proteínas, onde o nosso organismo estranha essa proteína e monta uma resposta contra ela.

 

Depois, o nosso organismo começa a desenvolver mecanismos de tolerar. Por isso que no adulto é mais difícil de acontecer, mas isso varia conforme o tipo de alimento. Por exemplo, com frutos do mar, o mais comum é iniciar depois de adulto.

 

MidiaNews - Em casos extremos, a alergia alimentar pode matar?

 

Ana Carolina Santos - Pode. As pessoas que tem essa alergia que é imediata, que inicia muito rápido após a ingestão do alimento, tem essa reação do tipo mais grave, que é a anafilaxia, pode causar a morte e é muito rápido. A tendência das reações é se tornarem cada vez mais graves. Pode ser que em uma primeira reação alérgica não seja tão grave, mas em um segundo contato a tendência é que a reação seja de início mais rápido. Às vezes, só de encostar-se à pele já dá reação, e tende a ser mais grave.

 

Pessoas que tem [casos de] alergia na família, mesmo que não seja alimentar, tem maior chance de ter alergia de qualquer tipo, inclusive alimentar

MidiaNews - Algumas alergias podem se manifestar apenas com o contato do alimento com a boca. Como proceder nestes casos?

 

Ana Carolina Santos - A pessoa que já teve alguma vez na vida um quadro de anafilaxia, que é essa reação alérgica grave, deve portar com ela adrenalina auto injetável. É um medicamento que vem em um dispositivo para leigo usar. A adrenalina vem dentro de um dispositivo que tem que ser aplicado no vaso lateral da coxa. Isso se a pessoa estiver tendo uma reação que envolve falta de ar de qualquer tipo ou a pessoa estiver perdendo a consciência, que são as reações mais graves. Ela precisa do uso dessa adrenalina e essas pessoas precisam andar com essa adrenalina com elas. Se a pessoa tiver a adrenalina auto injetável, alguém precisa administrar se ela não tiver mais condição. É na coxa, não precisa tirar a roupa, não precisa nada. Tem que simplesmente aplicar o mais rápido possível. Todas as pessoas alérgicas precisam passar por uma avaliação, ter uma receita do que fazer caso tenha alguma reação e caminhar rapidamente para o pronto atendimento.

 

MidiaNews - O componente genético tem peso no desenvolvimento de alergias?

 

Ana Carolina Santos - A gente sabe que tem a influência da genética. Pessoas que tem [casos de] alergia na família, mesmo que não seja alimentar, tem maior chance de ter alergia de qualquer tipo, inclusive alimentar. Pessoas que tem parentes [alérgicos] de primeiro grau também tem maior chance de ter. Não é incomum vários irmãos terem alergia alimentar. Com as mudanças que estão acontecendo, na frequência, a gente vê novos alérgenos, alimentos que antes a gente não via causando alergia como castanhas. Isso porque nós mudamos os nossos hábitos. Hoje é muito comum as pessoas consumirem castanha, é considerado um alimento saudável e tudo, porém também são bastante alergênicas. E hoje a gente vê com muito mais frequência.

 

Alair Ribeiro/MidiaNews

Ana Carolina Santos

"A exclusão daquilo que você é alérgico não é o único tratamento"

MidiaNews - Existe tratamento para a pessoa deixar de ser alérgica a alimentos?

 

Ana Carolina Santos - Existe a dessensibilização que ela pode ser feita com o alimento. É um tratamento que não é indicado para todas as pessoas que tem alergia alimentar. É indicado, principalmente, para essas alergias que tem mais estudos do tipo anafilaxia, que são essas alergias mais graves, e com o leite. Mas pode ser feito, teoricamente, com qualquer alimento. A gente indica mais para crianças que tem essas reações graves e que não se curaram sozinhas. A maior parte das crianças que são alérgicas ao alimento, elas passam a tolerar o alimento ao longo do tempo. É como se elas se curassem sozinhas. Se não ocorre essa cura, a gente faz esse tratamento de dessensibilização do alimento.

 

Não tem muita procura porque é um tratamento relativamente novo. Nem todo mundo sabe que existe essa possibilidade e também não é indicado para todos os alérgicos. Mas nós, alergistas, indicamos quando é um caso que a gente acha que precisa fazer.

 

É interessante que os colegas médicos não sabem muito dessa possibilidade. Inclusive esse tratamento é muito feito para medicamentos e, nesse caso, já é muito antigo. E os próprios colegas que não são especialistas desconhecem essa possibilidade e não alertam o paciente. Então, a exclusão daquilo que você é alérgico não é o único tratamento.

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