21.10.2023 | 05h:30

NEILA BARRETO


Ignêz Maria Luiza Corrêa da Costa

Precursora nas artes plásticas em MT clama pela criação do Museu de Artes

Senhor governador Mauro Mendes venho aqui lhe dizer que, na Cuiabá do século XX, “viveu uma mulher cuja sensibilidade a tornou personagem de uma época e de um lugar distante, onde bois de carga caminhavam pelo meio da rua carregando no lombo feixes de angicos, carvão vermelho e carvão branco, combustíveis imprescindíveis para manter acesa a chama da remota cidade.

 

Seu nome foi esquecido e suas obras se encontram em poder de seus familiares e de suas derradeiras amigas, assim como, de outros artistas plásticos. Talvez seja este um dos principais motivos que distanciaram sua arte do conhecimento público, mas ao mesmo tempo, evitou a sua extinção mantida anos escondidos”, seu nome, Ignêz Maria Luiza Corrêa da Costa, informou Gervane de Paula.

 

No entanto, senhor governador, hoje o senhor poderá reparar esse vazio existente na cultura mato-grossense, criando o Museu de Artes Contemporâneas em Mato Grosso. Talento o senhor tem, capacidade e boa vontade também. És um homem sensível no campo das realizações.

 

Filha de Corina Novis e Pedro Celestino Corrêa da Costa, nasceu em Cuiabá, em 1907 e neta de Antônio Corrêa da Costa. A sua família ascende luzes no túnel da história cuiabana de gerações em gerações dos Novis e dos Corrêa da Costa, conforme informa o historiador José Barnabé de Mesquita. Mudou-se em 1924, com o pai para o Rio de Janeiro, acompanhando-o em seu último mandato de senador. Começou a pintar ainda criança e aos 13 anos de idade contrariando a mãe, que impunha as aulas de piano, optando definitivamente pela pintura.

 

Cresceu cercada de objetos de arte, de fino mobiliário, de bom número de livros, de poesia, de música, alimentos do espirito e da alma. Autêntica, cortês, sua conduta sempre foi a mesma, tanto no seio da família ou fora dele. Herdou dos Novis a facilidade de fazer gracejos com sutileza e elegância, denotando ótimo senso de humor, conforme descreveu Maria de Lourdes F. B. da Silva Ramos, por ocasião do seu centenário.

 

Aos dezessete anos de idade, em Cuiabá, com enorme talento, estudou com a religiosa e professora de arte Alzira Bastos, com destaque em sua turma, no Asilo Santa Rita, mas foi na capital federal que tomou contato com a arte acadêmica. Fez a Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro-RJ, onde foi agraciada com medalhas de ouro, prata e bronze, o que lhe permitiu ingressar no estúdio de Cândido Portinari, o qual não abria as portas para o aluno comum. Foi cativada pelo universo do cubismo e do expressionismo.

 

Em 1933 expôs pela primeira vez no Salão Nacional de Belas Artes, recebendo prêmios e menções honrosas. Estudou com Cândido Portinari, na Universidade do Brasil, em meados dos anos trinta, com quem colaborou em obras como murais azulejados e os painéis do auditório do Palácio Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro, além da igreja da Pampulha, em Belo Horizonte MG. Nessa ocasião, sua obra adquire traços cubistas e expressionistas.

Conforme Silva Ramos, “ingressando nesse universo do mestre, em pouco tempo sua obra assimilaria discretos traços de novas tendências.

 

Em “ O palhaço” esses traços se revelam nitidamente. O mesmo se dá em “As lavadeiras”, em “Natalidade” ou ainda, no lírico “Banho de rio”.

 

Para Ricardo Guilherme Dicke, Ignêz Maria Luiza Corrêa da Costa “ foi uma verdadeira pioneira, nas artes plásticas mato-grossenses. Tinha um talento imenso. E só quem tinha grande talento poderia ser aceito como aluno no atelier do mestre Cândido Portinari, como ela o foi. E ela não merecia aquilo ir-se nos patamares do silêncio e do esquecimento, como foi. Seus quadros são simples e belos. Pioneira na arte, não há notícias de outro pintor que rivalizasse com ela, nesta terra”. Ela inscreveu o seu nome na tela do infinito, concluiu Dicke.

 

Para Lélia Rita de Figueiredo Ribeiro, de Campo Grande-MS, Ignêz Maria “cujo caminho artístico é uma festa de eterna primavera de flores campestres, é precursora das artes plásticas em Mato Grosso, e co-precurssora, juntamente à Lydia Bais, em Mato Grosso do Sul. Ignêz dos retratos, das paisagens, das festas do Divino, Ignêz política, das floradas adjacentes à vida e das vidas adjacentes às flores. Ignêz das imagens de santos, dos altares, das lavadeiras, dos pescadores”.

 

Recebeu as seguintes premiações: 1928 – XXXIV Salão Nacional de Belas Artes, Escola Nacional de Belas Artes-RJ, na categoria pintura em pastel – “Retrato” – Menção honrosa. 1929 – XXXV – (idem), na categoria desenho com a medalha de bronze; 1930 – XXXVI, na categoria pintura em pastel – “retrato de Marilu”, com medalha de prata.

 

Na categoria Individuais em Exposições: nos anos de 1935 e 1945 no Círculo Militar, em Campo Grande-MS e Instituto dos Arquitetos do Brasil/Instituto Brasil Estados Unidos, no Rio de Janeiro. Nos anos de 1951, 1952, 1962, 1965, 1969 e 1979 nas exposições na Biblioteca Pública-Cuiabá-MT, no Grande Hotel – Corumbá-MT, Edifício Público-Cuiabá-MT, Edifício Andrade Pinho – Campo Grande-MS, Clube Feminino, Cuiabá-MT e Exposição retrospectiva, Estado de Mato Grosso, Campo Grande-MS, respectivamente.

 

Participou de vários salões de arte, no Rio de Janeiro, Londres-Inglaterra, Sala Especial Flora pantaneira e retrato de Menino, Homenagem especial, Panorama das Artes Plásticas em Mato Grosso no século XX, em Cuiabá-MT e, em 2007, o Centenário de Ignêz Corrêa da Costa, em Cuiabá-MT, fonte dos dados acima especificados.

Quando o seu irmão Fernando Corrêa da Costa foi Governador do Estado de Mato Grosso (1951/1956 e 1961/1966), Ignêz Luiza aproximou-se de Cuiabá, captando a nossa icnografia e o nosso passado.

 

Passou a maior parte de sua vida no Rio de Janeiro e os dez últimos anos em Campo Grande, onde veio a falecer em 1987. Suas pinturas são testemunhos dos lugares em que ela morou, mas foi Cuiabá sua terra natal a maior inspiração, aqui suas pinturas adquiriram a luminosidade da cidade a cidade nostálgica que marcaram a sua arte para sempre.

 

São testemunhos do seu trabalho os artistas Dalva de Barros e João Sebastião que tiveram a satisfação de conviver com ela, enquanto Gervane de Paula, Adir Sodré, Jonas Barros, Benedito Nunes e o fotógrafo José Mauricio, a exemplo dos cuiabanos naturais ou acolhidos estão começando a conhecer a dimensão de sua vida e obra, informou Gervane de Paula, à época.

 

O senhor tem a oportunidade de alçar Mato Grosso a um novo patamar na área das artes e da cultura. As artes plásticas em Mato Grosso são extraordinariamente fortes e importantes. Entre os não-índios, nasceram no início do século XX, tendo Ignez Corrêa da Costa, uma mulher, como primeira artista plástica do território que hoje constitui o Estado de Mato Grosso. Era do grupo de modernistas como Mário de Andrade e fez parte do movimento da Arte Moderna Brasileira nas décadas de 1930 e 1940.

 

Se o governo do Estado garantir para esse museu a Coleção de Aline e Humberto Espíndola (reunida ao longo de uma vida inteira com as obras mais importantes dos artistas plásticos de Mato Grosso) e a grande coleção de Murillo Espínola (extraordinária em obras de Adir Sodré, Humberto Espíndola, Benedito Nunes, por exemplo), estará garantido a reunião da maior coleção de artes visuais do interior do continente, capaz de atrair e deslumbrar visitantes do Brasil inteiro e de outros países. Esta ação, que se consolida no universo simbólico, tem a força de se perpetuar como uma das maiores obras já erguidas neste território, pela sua administração.

 

Para a jornalista Maria Teresa Carrion Carracedo, “Aliás, penso mesmo que o governador Mauro Mendes poderia construir um "Complexo Cultural" para se equilibrar com o grande "Complexo Esportivo" que já temos. Nesse complexo caberiam um Museu Histórico (de verdade, moderno, tecnológico...), um Museu de Arte (o maior do Centro Oeste brasileiro); um grande Teatro, com pelo menos 1.500 lugares e uma moderna biblioteca.

 

Já sonhei com esse complexo cultural dentro do parque Mãe Bonifácia, ou no local onde hoje fica o 44º Batalhão de Infantaria Motorizada.... Esses investimentos poderiam nos aproximar do que Mato Grosso do Sul vem fazendo...

 

Em Campo Grande já temos um teatro de 1.500 lugares há mais de 30 anos. Parece que estamos em São Paulo. Temos o Museu de Arte. Um Museu do Homem Pantaneiro em Corumbá (altamente tecnológico) e o MAIOR AQUARIO DE AGUA DOCE DO MUNDO... projetado por ninguém menos que Rui Otake” E nós, aqui, poderíamos aproveitar o conhecimento indígena nas construções.... Vide a obra do Centro de Sustentabilidade do Sebrae, projeto do arquiteto José Afonso Portocarrero premiado na Suíça... Imagine um Museu de Arte construído a partir dessas técnicas que Portocarrero desenvolveu a partir de estudo da tecnologia indígena..., testemunhou Carracedo.

 

Ignez Maria Luiza, senhor governador Mauro Mendes, espera o seu presente “in memória”.

 

Neila Barreto é jornalista, historiadora e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso.


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