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25.05.2025 | 14h00 Tamanho do texto A- A+

Cuiabano vira mestre pela Oxford com estudo que cita VLT e BRT

Rafael Nolasco tem 41 anos e mora na Europa desde 2007; ele é especialista em consultoria de megaprojetos

Arquivo pessoal

O cuiabano Rafael Nolasco durante cerimônia de diplomação na Universidade de Oxford

O cuiabano Rafael Nolasco durante cerimônia de diplomação na Universidade de Oxford

ANGÉLICA CALLEJAS
DA REDAÇÃO

Primeiro mato-grossense a integrar o mestrado da Universidade de Oxford, no Reino Unido, o cuiabano Rafael Nolasco, de 41 anos, obteve o título de mestre na instituiçao inglesa, uma das mais antigas do Mundo, com uma dissertação sobre o Brasil em que cita o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) e o BRT (Bus Rapid Transit) de Mato Grosso.

 

No caso do VLT, ocorreu uma coisa que a gente chama de otimismo irrealista, quando subestimam a possibilidade de algo não ter o resultado esperado

Formado em Direito, Rafael se mudou para a Europa em 2007, passando pela Espanha, Irlanda e depois se estabelecendo em Bristol, na Inglaterra, onde começou a trabalhar com consultoria em projetos complexos para o governo local, que foi o tema de seu trabalho.

 

O estudo, intitulado “Como o Governo Federal Brasileiro Pode Estabelecer uma Autoridade de Projeto Efetiva no País”, dissertou sobre a gestão dos megaprojetos públicos, principalmente no Brasil, e a criação de uma entidade governamental independente que avaliasse esses projetos.

 

Na dissertação, Rafael investigou as causas estruturais que comprometem a eficácia dessas grandes obras e identificou um padrão recorrente: falta de avaliações técnicas independentes, interesses políticos sobrepostos ao bem público e um modelo de governança vulnerável à corrupção.

 

Segundo Rafael, muitos desses projetos são aprovados sem o devido respaldo técnico, baseando-se unicamente em avaliações internas dos próprios órgãos públicos. A ausência de análises externas e imparciais, então, compromete a credibilidade das decisões por tal projeto e, além disso, enfraquece os mecanismos de controle.

 

Para embasar seu estudo, o cuiabano entrevistou gestores estratégicos, incluindo servidores do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional e da Casa Civil, e observou um consenso preocupante: há um uso político dessas obras, que frequentemente servem mais à autopromoção de agentes públicos do que à população.

 

O estudo ainda revelou que, quanto mais tempo um projeto leva para ser concluído, maior é sua complexidade e mais suscetível ele se torna a desvios. Ou seja, projetos multimilionários se transformam em oportunidades para ganhos pessoais. Rafael acrescentou que isso não acontece só no Brasil.

 

O VLT e BRT

 

Entre os megaprojetos brasileiros abordados na tese, ele analisou o VLT (Veículo Leve Sob Trilhos) e o BRT (do inglês, Bus Rapid Transit) de Mato Grosso, a Transposição do Rio São Francisco, o Cinturão das Águas do Ceará e o Plano Rio Grande.

 

“Os projetos são considerados complexos a partir de carga orçamentária de um bilhão, e quando têm o envolvimento de duas ou três ou mais entidades, sejam nacionais ou locais. Por exemplo, o VLT envolveu Cuiabá, Várzea Grande, e o Estado. Isso gerou um conflito. E a causa era, na verdade, um problema de estudo aprofundado em viabilidade, que iria comprovar se o projeto era viável”.

 

Caso houvesse o estudo, ficaria comprovado que seria mais fácil a implementação do BRT, e muito mais barato

"Aqui no Reino Unido existe o IPA (Infrastructure Project Authority), um órgão do governo responsável por avaliar os pedidos de projeto e fazer o acompanhamento da parte legal, orçamentária, de recursos humanos. Porque esses projetos complexos precisam de liberação de verba multimilionária ou bilionária, e o que os políticos buscam é a aprovação".

 

“O interesse desta entidade, dependendo de como ela é configurada, é apenas para assessorar o Legislativo, Executivo e o Tribunal de Contas para certificar se vale a pena investir ou se não vale a pena investir naquele projeto, se terá retorno do investimento”.

 

Como exemplo, Rafael citou o caso do VLT, e apontou que o modal inicialmente mais viável, tecnica e economicamente, seria o BRT. No entanto, a escolha pelo VLT, mais caro e complexo, teria sido motivada por uma maior facilidade de ocultar irregularidades orçamentárias, devido à dificuldade de auditoria e à multiplicidade de contratos e agências envolvidas. 

 

“No caso do VLT,  ocorreu uma coisa que a gente chama de otimismo irrealista, quando subestimam a possibilidade de algo não ter o resultado esperado. “Ah, os vagões do VLT são fáceis de comprar. Tem três mil empresas para a fazer a construção. O orçamento está perfeito, a gente consegue entregar”.

 

“Mas e o risco? É uma ilusão fazer uma implementação de um projeto desse, que envolve a transformação do cidadão, do transporte público, do tráfego. Então, foi muito no viés otimista que esse projeto seria entregue em dois anos. Foi sem conhecimento nenhum, sem estudo de análise para conferir se era viável ou não”. 

 

“Caso houvesse o estudo, ficaria comprovado que seria mais fácil a implementação do BRT, e muito mais barato. O Brasil já tem especialidade nesse tipo de projeto, pelo BRT de Curitiba, que é famoso. É um exemplo mundial esse projeto".

 

Outro ponto abordado por ele é a estrutura desses megaprojetos. Rafael citou que programas públicos costumam ser compostos por diversos projetos paralelos, como obras civis, licenciamentos, reassentamentos, estudos ambientais, o que os torna ainda mais difíceis de gerenciar e frequentemente geram estouros orçamentários e atrasos.

 

Assim, Rafael concluiu que, somente com a criação da autarquia independente, que controlaria a execução dos megaprojetos com rigor técnico, seria possível romper com o ciclo de obras inacabadas, superfaturamentos e escândalos que há décadas comprometem a infraestrutura brasileira.

 

A trajetória até Oxford

 

Sem saber falar inglês, mas decidido a concretizar seu sonho de se mudar para o exterior, Rafael se agarrou aos livros e ao estudo e arriscou a vida como imigrante na Europa, logo após se formar em Direito. De início, o cuiabano lavou pratos, limpou banheiros, foi garçom e até trabalhou como ajudante de pedreiro na Europa.

 

A primeira viagem teve como destino a Espanha, e só foi possível devido a um empréstimo feito pelos pais dele, que apoiavam seu desejo. O dinheiro foi usado para que ele pudesse se manter nos meses iniciais, enquanto aprendia a nova língua, vivenciava a cultura e buscava aproveitar ao máximo as oportunidades de estudo no país.

Arquivo pessoal

Maria Leite, Ricardo, Rafael e Pedro Nolasco

Maria Leite, Ricardo, Rafael e Pedro Nolasco

 

A vitória ocorreu quando ele conseguiu ser aprovado no curso de Administração de Empresas na Universidade de Barcelona. Após concluir o estudo em 2011, continuou se empenhando em aprender sobre o mundo dos negócios, e se desdobrava fazendo em bicos.

 

Na mesma época Rafael fez seu primeiro mestrado, e decidiu se mudar para Dublin, na Irlanda, com o objetivo de melhorar o inglês. Já com experiência nos negócios, foi no país que Rafael viu sua sorte mudar quando começou a trabalhar com consultoria de megaprojetos na gigante IBM.

 

Lá, ele evoluiu no inglês e pôde, enfim, realizar sua vontade de morar na Inglaterra. Em Bristol, fez cursos e especializações na área, e em 2021 foi selecionado para o mestrado em Gerenciamento de Projetos Complexos (Msc in Major Programme Management) em Oxford, que foi concluído em 2024.

 

Agora, morando em Londres, o cuiabano foi diplomado em cerimônia na universidade, que ocorreu no último dia 17 de maio.

 

Ao ser questionado sobre seus planos para o futuro, Rafael afirmou que pretende dar continuidade às pesquisas na área de projetos complexos e que tem o desejo de seguir os estudos em instituições como Oxford ou Cambridge.

 

No âmbito profissional, destacou seu interesse em aprofundar-se ainda mais na implementação de megaprojetos. 

 

 

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Brenner Bedin  25.05.25 14h47
Parabéns! Merecedor de todo sucesso.
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