Cuiabá, Sábado, 2 de Agosto de 2025
ÓRFÃOS DO CONGO
24.03.2024 | 08h00 Tamanho do texto A- A+

Engenheira deixa MT para coordenar orfanato em país africano

Amanda Koehler auxilia no resgate e cuidados de crianças que foram vítimas de guerrilha rebelde

Reprodução/Redes sociais

A engenheira Amanda Koehler, no projeto Órfãos do Congo

A engenheira Amanda Koehler, no projeto Órfãos do Congo

ANGÉLICA CALLEJAS
DA REDAÇÃO

Na linha tênue entre a desolação e a esperança, vive hoje a engenheira de Cuiabá, Amanda Morais Koehler. Depois de 13 anos construindo a carreira, a moradora de Nova Mutum deixou tudo para trás e seguiu um novo propósito: ajudar crianças vítimas da guerra na África.

 

São 125 grupos de rebeldes, de milícias que fazem arrastões nas vilas, estupram mulheres e deixam crianças órfãs

"Eu tinha uma insatisfação muito grande, um vazio. Não estava satisfeita com meu trabalho e sempre gostei de trabalhos humanitários, causas sociais", disse ela ao MidiaNews.

 

"Eu lembro de estar muito insatisfeita... Achava que estava na profissão errada, mas era onde eu atuava. Hoje, entendo que gosto de ser engenheira, mas o trabalho anterior não fazia sentido com o que eu queria", acrescentou.

 

Em julho do ano passado, Amanda recebeu a proposta para participar de uma caravana no Malauí, país da África Oriental, onde ficou por um mês. Ao retornar ao Brasil, a engenheira já tinha em mente o desejo de integrar o projeto Órfãos do Congo, na República Democrática do Congo.

 

Localizado na África Central, há anos o país vem sofrendo ataques de rebeldes aos vilarejos. Em busca de recursos minerais, eles massacram homens, mulheres e crianças. Os que sobrevivem, tornam-se refugiados e somam-se aos milhões que já peregrinam pelas terras do Congo.

 

"Não é uma guerra de civil contra civil. Em 30 anos, matou 7 milhões de pessoas, e ninguém fala sobre isso. São 125 grupos de rebeldes, de milícias, que fazem arrastões nas vilas, estupram mulheres e deixam crianças órfãs", contou.

 

Determinada a fazer parte do grupo de voluntários, assim que foi chamada pela ONG Fraternidade Sem Fronteiras, responsável pelo projeto, Amanda deixou seu cargo na empresa de construção que tinha com a família e embarcou na jornada.

 

Em cerca de oito meses atuando como engenheira e coordenadora financeira do orfanato, ela já projetou uma escola, diversas casas e outras construções na propriedade que acolhe crianças refugiadas.

 

"A gente tem várias casonas aqui. Uma casa de meninos e meninas de 1 a 5 anos, uma para meninos de 6 a 11 anos, outra de meninos de 11 a 16 anos e uma casinha só para os bebês, que são uns 15. Então, é separado por faixa etária e gênero", explicou.

 

Reprodução/Redes sociais

amanda koehler

A engenheira Amanda Koehler, com algumas das crianças acolhidas no orfanato

Atualmente, o orfanato abriga mais de 320 crianças, com planos de expansão para receber até 450. Isso porque na semana passada, teve início um plano de resgate de cerca de 100 crianças desabrigadas.

 

Financiado pelo projeto, que sobrevive de doações, vários homens em motos serão enviados às zonas de conflito para socorrer as vítimas e, posteriormente, trazê-las ao orfanato.

 

Como coordenadora financeira, Amanda falou da importância das doações à instituição, e a necessidade de divulgar o projeto de apadrinhamento das crianças que vivem no centro de acolhimento. 

 

É dessa forma que o Órfãos do Congo conseguirá não só oferecer abrigo e alimento aos acolhidos, mas também atuar na escolarização e futuramente na capacitação deles, para que tenham oportunidades de trabalho ao deixarem o local.

 

"É um projeto muito abençoado. Ainda estamos longe da fase de 18 anos, mas a gente tem planos de fazer oficinas de capacitação profissional".

 

Episódio das bananas

 

Entre tantas histórias que a marcaram nesses meses de trabalho, Amanda relembrou de um dia que, junto de uma outra voluntária, decidiu distribuir pedaços de banana entre as crianças, e a reação delas a deixou desolada.

 

"A gente não dá banana, porque aqui são 320 crianças, mais de 90 trabalhadores, é muita gente. Então, não tem como comprar uma banana para cada. Quando a gente compra, é banana verde pra colocar na comida, fazer ensopados", disse.

 

"Um dia tinha sobrado, iria perder e uma voluntária visitante deu a ideia de darmos para as crianças. Eu falei que não tinha suficiente, então ela disse para cortar em rodelas, e dar para as pequenininhas, de 1 a 5 anos".

 

"As crianças aqui são muito educadas. Elas esperam todo mundo servir para comer, não tem birra, má criação. Só que na hora que elas viram a rodela de banana, ficaram loucas. E não era nem uma banana inteira, sabe? Era uma rodela de banana... Num país que tem um milhão de bananas, mas não chegam nessas crianças com fome severa", disse.

 

Reprodução/Redes sociais

amanda koehler

Algumas das adolescentes atendidas pelo projeto ao lado de Amanda

"Eu sentei numa mesa que tinha ali e chorei muito de revolta. Comecei a sentir uma tristeza, pensar em quanto alimento já desperdicei, pensar em como é que o mundo esqueceu dessas crianças... Entrei num loop de lamentação, de reflexão... Como a humanidade está deixando isso acontecer?", questionou.

 

Felicidade em meio ao caos

 

Apesar de lidar frequentemente com situações de tristeza, a engenheira também tem guardado na memória a alegria das meninas adolescentes quando receberam sacolas para guardar as roupas. 

 

"A gente terminou uma casa aqui para as meninas de 11 a 16 anos. Elas não tinham onde colocar as roupinhas. Daí compramos algumas sacolas, de plástico, que vinha com zíper. Quando receberam, elas pulavam e dançavam, diziam muito obrigada", contou.

 

"Quantos de nós iríamos ficar felizes com uma sacola de plástico para guardar nossas coisas, a ponto de dançar? Quantos de nós ganhamos tantas coisas, recebemos, compramos coisas caríssimas e não comemora, não agradece?", questionou.

 

"Foram duas situações diferentes: a das bananas e essa da sacola, que me amadureceram um pouquinho", completou. 

 

Para apadrinhar uma criança, acesse o site da ONG Fraternidade sem Fronteiras.

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Jeves Bejame   24.03.24 11h35
É nessas regiões que podemos dar valor e ao mesmo tempo agradecer por sermos brasileiros. Parabéns pelo excelente trabalho.
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