O corredor algo estreito entre paredes foscas leva a uma antessala também estreita. Na pequena saleta, há apenas uma mesa, uma cadeira e uma porta cinzenta fechada. Acima da porta, uma lâmpada vermelha. Com a lâmpada acesa, ninguém pode entrar na sala que a porta protege. À direita da lâmpada, um porta-retratos pendurado na parede traz uma fotografia em que duas pessoas sorriem e seguram uma camisa rubro-negra: uma é o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. A outra trabalha atrás da porta cinzenta - a presidente do Clube de Regatas do Flamengo, Patrícia Amorim.
A luz vermelha é a última linha de defesa de Patrícia Filler Amorim. Com ela acesa, ninguém pode abrir a porta e entrar no gabinete presidencial - uma sala grande com uma mesa de madeira, uma escrivaninha e uma estante. Patrícia se senta na escrivaninha, de costas para os janelões, instalados sobre roldanas, que separam o gabinete de uma varanda debruçada sobre o espelho d'água da Lagoa Rodrigo de Freitas. Protegida por corredores labirínticos e cercada por uma paisagem de cartão postal, Patrícia comanda o destino de 9 mil sócios... e os sonhos de 35 milhões de torcedores.
Num canto da ampla varanda, quase no parapeito, com vista para o Cristo Redentor e para o Estádio de Remo da Lagoa, se esconde uma cadeira velha com forro marrom carcomido. Ali, no assento humilde e algo improvisado, com uma vista de derrubar queixo, é que Patrícia se refugia.
- Essa é minha cadeira. É nela que me sento quando tenho que pensar e até chorar. Esse é meu refúgio nos momentos difíceis.
E na cadeira de presidente do Flamengo momentos difíceis nunca faltam. Patrícia se tornou a primeira mulher a presidir o clube pouco depois da conquista do título brasileiro de 2009. No clube de futebol mais popular do país, onde toda calmaria parece véspera de tempestade, a mandatária parece enfrentar uma crise por semana. Em 2010, passou pelo caso Bruno, pelas confusões de Adriano Imperador, pelo acerto e pelo desacerto com Zico , tudo temperado pela briga contra o rebaixamento. Em 2011, a sina parecia ter virado: Ronaldinho Gaúcho foi contratado, o clube foi campeão carioca invicto e fazia excelente campanha no Brasileirão. De repente, o time parou de ganhar... e as nuvens voltaram. Voltou a ganhar - e uma crise surgiu dentro do departamento de futebol... do nada.
- O Flamengo é assim. Ebulição constante.
Bota ebulição nisso. Com nove mil sócios, o clube teve seis candidatos nas últimas eleições. E pouca gente vota. Patrícia ganhou com 792 votos de 2,4 mil possíveis - superando o segundo colocado (Delair Dumbrosck) por meros 93 sufrágios. Pouco depois, ela definiu as correntes do clube como "quase um Afeganistão". Quando o futebol vai mal - a cadeira presidencial esquenta. Agosto varou setembro e o time ficou dez rodadas sem vencer. Os ânimos se exaltaram, um conselheiro agrediu outro na sede... e o ex-presidente Márcio Braga desceu a mamona com força na gestão Patrícia - chamando-a de inepta pra baixo. A presidente acusou o golpe - e respondeu com um carrinho no peito.
- Quando eu rodo a baiana é duro, pois eu causo mágoa, vou no coração, falo o que tenho que falar - diz.
Mãe, executiva, vereadora
Patrícia ficou fora de si diante das críticas de Márcio, de quem foi aliada e vice-presidente no passado. As relações rubro-negras são complexas e complicadas - há grupos que se apoiam e trocam de lado constantemente.
- O Flamengo tem seis ex-presidentes vivos... e atuantes. Não é para principiantes - diz um ex-dirigente do clube.
Apesar da resposta irritada para Márcio, Patrícia costuma pensar antes de falar. Até porque toda crise rubro-negra começa dentro de casa. Casada com o economista Fernando Sihman, Patrícia tem quatro filhos: Vítor, de 14 anos, os gêmeos Ricardo e Daniel (de nove) e o caçula Leonardo - de cinco. Foi Leonardo que, no auge da crise, procurou a mãe e disse:
- Mãe, você tem que fazer alguma coisa. As pessoas vão fazer "uuuuuuh" pra você.
0 Comentário(s).
|