O Brasil insalubre do século 19 mudou pouco. Em pleno século XXI, mais de 100 milhões de pessoas não são atendidas pelos serviços de saneamento básico, o que representa 57,33% da população.
A Lei do Saneamento Básico completou 10 anos este ano. Mas o acesso à coleta de esgoto passou de 42% para pouco mais de 50%, o que corresponde a menos de um ponto percentual por ano. Em algumas regiões do país, como a Norte, a situação é ainda mais grave: apenas 7,6% da população é atendida por esgoto.
A coleta e o tratamento de esgoto – serviço absolutamente essencial – têm sido deixados de lado por sucessivos governos por falta de educação política. Isso é um desastre na saúde pública porque repercute diretamente na mortalidade infantil. É justamente nas regiões periféricas e de maior acesso ao saneamento básico que aparecem o surto de doenças ligadas ao Aedes Aegypti e a maior incidência de recém-nascidos com microcefalia por causa do Zika Vírus.
A coleta e tratamento de esgotos são partes do que chamamos saneamento básico, que engloba também a coleta e tratamento do lixo, as águas pluviais, o cuidado com as ruas e praças da cidade e o controle de pragas. Enfim, o saneamento básico é condição da saúde pública.
Você sabe quais doenças são programadas pela falta de saneamento básico? Muitas, aqui vão algumas. Febre Tifoide, ocorre quando em contato direto com o portador da doença ou por meio do consumo de água e alimentos contaminados pelos bacilos eliminados nas fezes e urina do doente. Cólera, é causada pela bactéria vibrio colérico (Vibrio Cholerae) é uma doença infectocontagiosa aguda do intestino delgado, sua contaminação dá-se principalmente pela ingestão de alimentos contaminados, mal cozidos ou o contato direto com as fezes de pessoas infectadas.
Leptospirose, sua contaminação acontece quando a pessoa entra em contato com a água contaminada e a bactéria entra na corrente sanguínea por meio de pequenos ferimentos. Disenteria bacteriana, também conhecida como Shigeloses, dá-se por meio do contato com fezes ou alimentos contaminados pela bactéria Shigella. Além dessas, temos várias parasitoses e outras doenças que atingem desde crianças a pessoas idosas.
Antigamente, os políticos não se interessavam em investir em saneamento porque canos e manilhas ficavam enterrados e a obra não aparecia. Essa cultura atrasada precisa mudar. O tratamento de esgoto é um direito do ser humano, exigido pela Organização das Nações Unidas, pois é indispensável para gozar plenamente do direito à vida.
Uma pessoa com educação política logo percebe quando chega a uma cidade e vê um de seus cartões postais sendo destruído pelo homem, geralmente um rio, córrego, lago ou baía. Isso acontece pela ausência de coleta e tratamento de esgoto. As comunidades são obrigadas a conviverem com seus próprios dejetos, que são lançados ao ar livre, em fossas, geralmente mal construídas, valas negras ou jogadas diretamente nos córregos e rios.
São Paulo, a principal metrópole, apresenta toda a área morta do Rio Tietê concentrada na região metropolitana da capital. Além, do desmatamento da mata ciliar, a principal causa é falta de tratamento do esgoto em todas as cidades por onde passa o Tietê (Guarulhos, São Bernardo e Mauá) que é despejado no manancial. Segundo especialistas, se fosse universalizado esse tratamento, a própria natureza se encarregaria de despoluir o rio em apenas cinco anos.
A cidade maravilhosa é outro exemplo triste de nossa realidade. O esgoto doméstico sem tratamento, dos 15 municípios que ficam na região, é a principal fonte de poluição da Baía da Guanabara.
O saneamento básico é visto pela sociedade como uma questão pública, e na nossa cultura isso quer dizer que é uma questão de ninguém. Na verdade, deveria dizer que é uma questão de todos nós. Atinge a todas as pessoas e deveria ser prioridade de toda a sociedade.
Está na hora da gente colocar as coisas em seu devido lugar e mudar as prioridades de todos nós. Isso eu chamo de educação política para o século XXI. O que é público, é de todos nós. E todos devemos agir e cobrar.
Vicente Vuolo é economista, cientista político e analista legislativo do Senado Federal.
E-MAIL: [email protected]
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