Cuiabá, Segunda-Feira, 11 de Agosto de 2025
GABRIEL NOVIS NEVES
09.11.2011 | 07h18 Tamanho do texto A- A+

Falsificar a história

Para salvar ex-ministro de Esportes, PCdoB ocupa horário político gratuito

Tenho idade suficiente para saber que a história que nos é ensinada nos bancos escolares é falsificada, ou distorcida.

O meu professor de história não-falsificada foi Rubens de Mendonça. Na nossa longa convivência, da Rua do Campo até a universidade, onde era colaborador de ensino, muitos anos se passaram.

Rubinho me contou parte da história de Mato Grosso e do Brasil, que nunca publicou em livros por motivos óbvios.

Recentemente, o jornalista José Nêumanne Pinto publicou um livro sobre Lula. Perguntado se todos os fatos pesquisados da vida do ex-presidente constavam no livro, ele simplesmente respondeu com um sorriso: "O que foi possível...".

Sempre que podia, pedia ao Rubinho que me contasse mais sobre a Guerra do Paraguai. A verdadeira história relatada a mim sobre esse conflito internacional - em que o Brasil entrou de gaiato e quase extinguiu uma civilização vizinha - levou-me, junto com colegas da UFMT, a elaborar um projeto sobre o assunto e apresentá-lo ao então ministro da Educação, Ney Braga.

Ao entregar o documento falei:

- Sr. Ministro, estou lhe entregando um projeto sobre a verdadeira Guerra do Paraguai. Não é mais possível vivermos assim com os nossos vizinhos. A proposta da UFMT é de uma ampla revisão nos textos escolares dos dois países. O Ministério da Educação pediria auxílio ao Itamaraty e formaríamos uma comissão bilateral de historiadores para a necessária revisão. As nossas crianças, cedo, aprendem na escola que os paraguaios são bandidos, assassinos, torturadores, covardes, ladrões, indivíduos sem-caráter, entre outros predicados. Do outro lado da fronteira, muitas vezes separadas por uma rua ou estreito rio, a mesma coisa acontece com as crianças paraguaias, onde os heróis são paraguaios e os bandidos são brasileiros.

Ressaltei ainda que, caso este equívoco histórico não fosse esclarecido, as escolas estariam plantando, entre os alunos, a semente de preconceito, discriminação, ódio e violência.

O ministro a tudo ouviu. A seguir, me fez as seguintes perguntas:

- O que faremos com os textos do Taunay, o historiador oficial do Império? E com os nossos heróis cujas frases saíam da pena do Taunay? Como "deseroizá-los"? - "Sei que morro, e o meu sangue e dos meus companheiros servirá de exemplo..." O Brasil é carente de heróis. Não vamos mexer nesses que já estão consagrados.

O projeto morreu na sua entrega oficial, e nunca mais se falou nisso.

A minha neta ainda aprende que 100 covardes soldados paraguaios lutaram contra um herói brasileiro e foram dizimados. Se morrer um gado brasileiro nas fazendas da fronteira, a culpa é sempre dos paraguaios, quando é do lado paraguaio são os maus brasileiros os autores do crime.

O PCdoB nasceu quando eu já era médico. Houve um grupo do Partidão que se rebelou contra Luis Carlos Prestes, dando origem ao partido do B. Intelectuais, jornalistas, artistas, profissionais liberais, estudantes, operários, perseguidos políticos e o lendário Oscar Niemayer foram figuras históricas do Partidão.

O PCdoB, na verdade, foi criado para combater o PCB, rico em quadros humanos. O PCdoB apelou, e chamou ex-jogadores de futebol, o famoso cantor-apresentador-desrespeitador da lei Maria da Penha e estudantes donos de ONGs, entre outros, para os seus quadros.

Para salvar o ex-ministro de Esportes, o PCdoB ocupa o horário político gratuito e se apropria indevidamente dos nomes de respeitáveis cidadãos dos quadros do Partidão, como aval para o moribundo ministro.

A esperança é realmente um sentimento que só desaparece com a morte. O ministro, com nome de cantor famoso, estava morto, mas os seus amigos imaginaram que, citando personalidades brasileiras, eles pudessem reverter o quadro.

Esse vídeo ficará para a história e contribuirá, e muito, para a perpetuação da história falsificada.

GABRIEL NOVIS NEVES é médico e ex-reitor da UFMT.

 

*Os artigos são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do MidiaNews. 

 

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Helena Prado M D Monteiro  10.11.11 23h42
A história é assim. Desde o meu nascimento vi e ouvi coisas acontecendo de um jeito e depois de algum tempo sendo contadas de outro. Foi assim com Rondon, depois com Dr. Melo, padrinho de minha avó Nair. Foi assim com os irmãos DUARTE MONTEIRO - ÁLVARO E BENJAMIN - que foram ativistas, defensores da causa indígena, do trabalhismo, da imprensa estadual, da OAB e da Faculdade de Direito de Cuiabá, da UFMT... e ninguém fala neles. Depois deles vieram os irmãos Vilas Boas, que divulgaram cada pequeno passo que davam no sertão matogrossente e na integração com os indígenas... e se tornaram lendas. A história é contada por quem tem algum interesse de fazê-la a seu modo. E os que vem depois acreditam, principalmente por total ausência de sobreviventes com outra versão para contar.
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Miranda Muniz  10.11.11 19h08
Prezado Gabriel Novis, afirmar que “Houve um grupo do Partidão que se rebelou contra Luis Carlos Prestes” ou que “ o PCdoB, na verdade, foi criado para combater o PCB”, é um reducionismo tacanho. O real motivo está no documento “Resposta a Kruschev”, onde desmascara o caminho de traição ao socialismo adotado pelos novos governantes soviéticos e seus seguidores e faz defesa da reorganização do Partido Comunista, que adotou a sigla PCdoB. O grupo prestista foi quem rompeu com os ideais de 1922: no afã de ver o partido legalizado, retiram do estatuto referências sobre “marxismo”, “revolução” e renega o internacionalismo proletário, mudando o nome para “Partido Comunista Brasileiro”, retirando a expressão “do Brasil”, que simbolizava ligação com a Internacional Comunista.
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Miranda Muniz  10.11.11 18h24
Prezado Gabriel Novis, sempre nutri respeito político com V. Sra., pelo seu passado e, em especial, de sua contribuição para a UFMT. Por ocasião da vinda do camarada Aldo Rebelo em Cuiabá, mesmo não lhe conhecendo pessoalmente, fiz questão de convidá-lo para um jantar com nosso camarada, aceito de pronto. Por desencontro, V. Sra. não compareceu. Entretanto, no mesmo dia, eu e o camarada Aldo, tivemos a oportunidade de lhe encontrar e levar um papo agradável. Confesso que a parir dali meu conceito sobre V. Sra. aumento ainda mais. Entretanto, para minha surpresa e decepção, constato que sua “crônica”, desfere ataque gratuito e raivoso ao PCdoB, inclusive destoando da tônica informativa e sensata que a norteava a mesma até então. Por limitação de espaço, voltarei a esse tema.
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Ubirajara Itagi  09.11.11 19h53
O Partido Comunista Brasileiro - PCB, o Partidão, fundado em 25 de março de 1922, continua ativo, apesar das defecções do PCdoB e do PPS, em momentos históricos diferentes e razões distintas. O Partidão vai ao ar, em rede nacional de televisão, neste dia 10 de novembro de 2011, entre 20h30 e 20h35 (de Brasília). Aliás, o PCB publicou uma nota no dia 25.10.2011, sobre essa questão, denunciando a propaganda enganosa do programa institucional do PcdoB, exibido na televisão no mês de outubro último, na qual este último "revela sem disfarce seu reformismo e oportunismo, além de sua falta de escrúpulos."
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Kamila  09.11.11 15h42
De fato muitas estórias (porque nao sao verdadeiras e por isso nao merecem o HI) sao contadas aos pequenos de modo controverso. Indico a leitura da obra "Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil" de Leandro Narloch.
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