Aristóteles afirmava que o ser humano é, por natureza, um animal político. Essa máxima, tantas vezes repetida, ultrapassa o campo das eleições, dos partidos ou dos debates ideológicos. Ela revela algo mais profundo: a própria essência da vida em comunidade. Para o filósofo, a política não era uma atividade ocasional ou um instrumento de poder, mas uma dimensão intrínseca da condição humana. É na pólis — a cidade-Estado — que o indivíduo realiza plenamente sua humanidade, exercendo virtudes, participando das decisões coletivas e orientando suas ações pelo bem comum.

Aqueles que aspiram a eliminar a política, na verdade, negam a própria natureza social do homem. A política é a estrutura pela qual organizamos a convivência. Sem ela, restaria apenas o caos ou a lei dos mais fortes. Por isso, se desejamos um mundo mais justo, é imperativo participar ativamente da esfera pública.
Os gregos compreendiam essa verdade com clareza exemplar. A participação cívica era não apenas um direito, mas um dever moral. Esperava-se que todo cidadão livre se envolvesse nos assuntos da cidade, pois a omissão era vista como ignorância e abdicação do dever coletivo.
É nesse contexto que surge a etimologia da palavra “idiota”. Derivada do grego idiṓtēs, designava o cidadão que se mantinha alheio à vida pública, vivendo apenas para si mesmo. O idiṓtēs não era, portanto, um tolo, mas um homem que se limitava à esfera privada, incapaz de perceber que sua liberdade individual dependia do destino comum. Ao afastar-se da política, imaginava preservar sua autonomia; na prática, renunciava a qualquer influência sobre os rumos da sociedade — e entregava, de bandeja, espaço para a manipulação, a demagogia e o abuso de poder.
A vida humana, em sua plenitude, é tecida por três dimensões interdependentes: a privada, a social e a pública. O idiṓtēs restringe-se ao lar e às conveniências pessoais; o verdadeiro cidadão, ao contrário, compreende que sua individualidade só se realiza plenamente no convívio coletivo. A política, nesse sentido, não é um mal necessário, mas a expressão mais elevada da racionalidade humana — a capacidade de dialogar, deliberar, cooperar e construir uma ordem que reflita valores comuns.
A liberdade autêntica não está em fugir da política, mas em participar dela com consciência e responsabilidade. A omissão não é neutralidade: é consentimento silencioso com o poder alheio. Sempre que deixamos de agir, outros decidem por nós. A cidadania verdadeira nasce do compromisso ativo com o destino comum, do esforço de transformar a liberdade em ação concreta.
O voto, nesse horizonte, representa muito mais do que um ritual democrático. É um ato de discernimento moral e político, um exercício de julgamento sobre ideias, propostas e valores. Votar sem reflexão é uma forma disfarçada de omissão, um silêncio que frequentemente favorece justamente aquilo que criticamos.
Prosperar como indivíduos e como sociedade exige harmonizar as esferas privada, social e pública da existência. Em vez de rejeitar a política, precisamos resgatá-la como espaço de diálogo, construção e amadurecimento coletivo. A verdadeira liberdade manifesta-se quando o cidadão
intervém na vida pública com lucidez e compromisso, participando ativamente da construção de um mundo que honre a dignidade comum.
Cícero Ramos é engenheiro florestal e vice-presidente da Associação Mato-grossense dos Engenheiros Florestais (AMEF).
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