A entrada de novos pacientes na Unidade I do Centro Integrado de Apoio Psicossocial (Ciaps) Adauto Botelho, localizado no bairro Coophema, em Cuiabá, está há mais de quarenta dias fechada.
A unidade de psiquiatria é a única de Mato Grosso com atendimento 100% integrado ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Ao longo dos últimos três anos, os motivos, segundo relatos dos próprios funcionários, avalizados pelo Sindicato dos Servidores Públicos da Saúde e do Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso (Sistma-MT), são os mesmos de sempre: falta de medicamentos, de insumos e, até mesmo, de médicos.

"Não somos uma instituição filantrópica, mas ultimamente temos sobrevivido através de cotas entre os servidores para obter as mínimas condições de assistência e de trabalho"
Outro ponto forte levantado pelos servidores é quanto à infraestrutura: as Unidades I e III estão precárias. A primeira unidade, por exemplo, foi construída em 1957 e, desde então, passa apenas por reformas paliativas.
Em documento, ao qual o
MidiaNews teve acesso com exclusividade, os servidores relatam o caos do Adauto Botelho.
Em seis páginas, os principais problemas da Unidade I são especificados. Da falta de energia elétrica, passando por um princípio de incêndio até o esgoto a céu aberto no entorno do hospital, os funcionários concluem que a situação que vivem é de “desesperança e abandono”.
Conforme os servidores, até mesmo “cotinhas” para a compra de materiais tem sido realizadas para que o local não pare de vez.
“Não somos uma instituição filantrópica, mas ultimamente temos sobrevivido através de cotas entre os servidores para obter as mínimas condições de assistência e de trabalho”, diz trecho do documento.
“Sabemos que há um PTA (Programa de Trabalho Anual), com valores a serem gastos em prol da instituição, incluindo manutenção predial, materiais, medicamentos, insumos, equipamentos, entre outros, porém, não sabemos o valor real, nem qual tem sido o destino desse dinheiro”.
Precariedade Os servidores do Adauto Botelho enumeraram 16 problemas na Unidade I. O
MidiaNews cita os principais abaixo, principalmente pelo grau de periculosidade, tanto de pacientes como de quem trabalha no local.
O primeiro deles é a falta de energia elétrica: “A Unidade I trabalhou por vários dias sem energia, expondo seus pacientes e servidores a riscos. Foi trocado o gerador, no entanto, não foi suficiente pois a rede continuou oscilando. Soubemos que deveria ser realizada licitação para trocar toda fiação elétrica da parte interna, que compreende cozinha, posto 2 (enfermaria masculina para pacientes debilitados e idosos), setor administrativo e ala do extinto pronto atendimento e que várias reuniões na Secretaria de Estado de Saúde a pedido da diretoria foram realizadas, mas sem solução”.
O segundo problema pelo qual os servidores passaram foi um princípio de incêndio, no dia três de junho deste ano: “Boa parte dos aparelhos de ar-condicionado, impressoras, computadores e central de TI estragaram. Não estamos acessando a rede e em vários locais não podemos ligar as máquinas que permitem que realizemos nosso trabalho. Não há previsão para solução desse problema. Dois setores da Unidade ficaram sem energia: antigo Pronto Atendimento e Posto 2. Devido ao problema tivemos que remanejar pacientes internados para outro setor, o posto I (enfermaria masculina para pacientes em boas condições físicas) que foi recentemente reformado mas não finalizado com todas as adequações realizadas, como citado anteriormente”.

"a Unidade I trabalhou por vários dias sem energia, expondo seus pacientes e servidores a riscos. Foi trocado o gerador, no entanto, não foi suficiente pois a rede continuou oscilando"
Outro problema que os funcionários citam é a do esgoto a céu aberto, no entorno da Unidade, principalmente próximo da cozinha: “Isso demonstra o paradoxo de uma unidade de Saúde que não possui condições sanitárias adequadas”.
No ponto quatro, os servidores voltam a lembrar o princípio de incêndio, lembrando que a Unidade I do Adauto Botelho não possui extintor de incêndio: “Desnecessário falar sobre os riscos tanto para servidores como para ao pacientes. Na Ala Feminina já ocorreram dois incêndios, por sorte ninguém saiu ferido”.
O documento ainda esclarece que diversos tipos de medicamentos estão em falta, tanto clínicos quanto psicotrópicos, e que não há carros suficientes para a demanda necessária.
Outro problema é o das instalações dos pacientes. Enquanto na ala feminina falta ventilação em todos os locais e chuveiros elétricos, no posto I da ala masculina não há camas suficientes para os pacientes.
Os servidores ainda descrevem que em época de chuvas há alagamentos na unidade I e que faltam até mesmo materiais de arteterapia como tintas, lápis de cor, linhas, papéis e cartolinas.
“O que prejudica as atividades e oficinas coletivas tão benéficas aos pacientes”, diz trecho do documento.
Ao final, os servidores questionam o motivo de tanto descaso e lembram que há repasses do Governo Federal, o que, por si só, faria com que o retrato do Adauto Botelho fosse outro.
“Diante desses vários problemas que não são segredos e nem causam surpresa para a SES, para o Governo e para a própria comunidade, questionamos o motivo de tamanho descaso, uma vez que a Unidade fatura mensalmente e recebe verba do Ministério da Saúde. Assim como outras Unidades descentralizadas da SES, estamos completamente abandonados e oferecendo um serviço à população aquém de seus direitos”.
Além dos direitos que estão sendo supostamente não ofertados à população, os servidores informaram no documento que devido as denúncias que fazem dos problemas constantes do local, são alvos de ameaças e retaliações por parte da Secretaria de Estado de Saúde.

"Desnecessário falar sobre os riscos tanto para servidores como para ao pacientes. Na Ala Feminina já ocorreram dois incêndios, por sorte ninguém saiu ferido"
Outro ladoA Secretaria de Estado de Saúde informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que está "ciente" de todos os problemas do Centro Integrado de Apoio Psicossocial (CIAPS) Adauto Botelho.
A respeito da Unidade I, a Secretaria explicou que estava sem insumos, reflexo dos pregões que demoraram para serem realizados. A pasta, no entanto, garantiu que, neste caso, a solução se dará na próxima semana.
Também para a próxima semana, a Secretaria promete realizar, por meio de equipe técnica do Adauto, uma avaliação sobre a reabertura da unidade.
A Secretaria negou superlotação ou problemas na hospedagem dos pacientes, informando que, atualmente, há 30 homens e 30 mulheres internados.
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