Casa da Mãe Joana 2017

Após um incêndio em julho deste ano, a Casa da Mãe Joana, referência no Estado em assistência aos portadores do vírus HIV, passa por dificuldades para abrigar todas as pessoas e está sobrevivendo com o mínimo possível.
A Casa foi criada a partir da iniciativa de Dona Joana, que morreu de câncer em 2015. Por isso a casa recebeu o nome dela. Dona Joana era funcionária do Tribunal de Justiça e começou a ceder espaço em sua própria casa para abrigar pessoas portadoras de HIV. Há 30 anos, ela conseguiu um novo espaço, onde fica a atual casa de apoio.
O diretor administrativo, Paulo Rogério Rodrigues, disse que todos admiram muito a fundadora. “Ela começou todo esse trabalho. Ela se dedicou muito, foi uma guerreira de levar esse trabalho até pouco antes de morrer, há dois anos. A gente sente muito, porque não é fácil uma pessoa que começa um trabalho desses”, afirmou.
O diretor revelou que o local, que funciona na região do Centro Político e Administrativo de Cuiabá, está sobrevivendo com R$ 20 mil por mês de doações e que isso é o mínimo para custear as despesas.
“A gente está sobrevivendo com o mínimo que é gasto entre gás, aluguel, salários de enfermeira, cozinheira, alimentos, medicamentos. Nada disso é cedido pelo Estado e pela Prefeitura”.
A Casa precisou reduzir seu número de assistidos devido às lentas reformas que começaram depois do incêndio na ala feminina. Muitos foram morar com parentes ou transferidos para casa de conhecidos da igreja.
Hoje a casa abriga somente 28 pessoas, sendo 12 mulheres e 16 homens, mas já chegou a ter mais de 60.
Além dessas 28 pessoas, mais 65 pessoas em todo Mato Grosso recebem ajuda fora da Casa. “A gente faz desde consulta, exames, pegar medicamentos, levar e buscar as pessoas”, relatou Paulo.
Assistência
Alair Ribeiro/MidiaNews
O diretor administrativo, Paulo Rogério Rodrigues, lamenta os poucos recursos que a Casa tem recebido
Segundo o diretor, a Casa da Mãe Joana oferece ajuda para aqueles que não possuem condições de lidar com a doença sozinhos.
“São pessoas de muita baixa renda que não têm uma situação boa, são pessoas que se saírem daqui irão para a rua ou voltam para o vício da droga”, afirmou.
Paulo Rogério relatou que as pessoas não conseguem se aposentar apenas sendo soropositivas. “Tem que estar em uma situação muito difícil para conseguir algum benefício. A casa serve para que essas pessoas não fiquem em uma situação difícil lá fora”.
Geralmente, os assistidos são encaminhados pelos hospitais como Júlio Müller, Santa Casa e Pronto Socorro. “A gente acaba pegando essas pessoas, muitas vezes acaba até sobrecarregando porque somos os únicos que dão assistência”, lamentou Rodrigues.
De acordo com Paulo, a casa só recebe maiores de idade, porém oferece auxílio até para recém-nascidos que já nascem portadoras do vírus. Essas crianças moram com familiares e recebem o suporte fora da Casa da Mãe Joana.
“A gente dá todo o suporte, desde medicação, alimento, lugar para dormir. Temos enfermeira que vai administrar a medicação para eles. Então é tudo por aqui”, relatou o diretor da Casa.
O preconceito persiste
Mesmo com os avanços da medicina e com a grande quantidade de informações, o diretor revelou que ainda existe muito preconceito na sociedade contra os portadores de HIV e isso se reflete em diversos níveis.
Rodrigues contou que o preconceito interfere na ajuda que o local recebe. “A casa tem um trabalho de 30 anos. Não é pouco tempo fazendo esse trabalho. É a única casa de Mato Grosso. Eu acho que a gente tem pouca ajuda por causa de certos preconceitos que ainda existem”.
24 anos de luta
J.G.B., de 52 anos, convive com a doença já faz 24 anos. Ele contou que se tornou portador do HIV quando era caminhoneiro e teve relações sexuais com uma mulher que tinha a doença.
“Dei uma carona para uma mulher nova que estava com um menino todo sujo. Eu estava indo para Uberlândia [MG]. Nisso, a gente teve relações. Só depois que ela desceu do caminhão, ela falou: Estou doente’. Eu não me importei, deixei pra lá. Eu tinha 28 anos”.
O caminhoneiro descobriu que havia sido infectado de uma maneira dolorosa, aos 29 anos. “Um dia eu ia viajar e comecei a passar mal. Me deu febre, comecei a vomitar, caí no banheiro. Meu pai me encontrou e me levou para o Hospital Júlio Müller. Passei oito meses internado. Um mês em coma. Até que um dia chamaram a minha família e contaram que eu tinha HIV. Eu não sabia que tinha HIV”, relembrou J.G.B.
Ele ainda revelou que seus dois irmãos morreram com Aids e isso abriu seus olhos. “Meu irmão morreu com 23 anos, antes de eu pegar a doença. O outro morreu agora em 2012. Meu irmão não sabia que estava doente. Hoje eu aviso minhas sobrinhas para terem cuidado”.
Nessa época, J.G.B. disse que recebeu muito suporte familiar. “Meus pais deram muito apoio. Todo dia estavam me visitando. Eles não têm preconceito, não. Eu expliquei para eles que essa é a realidade”.
Apesar do acolhimento da família, J.G.B. sofreu muito preconceito quando contraiu o vírus. “No começo as pessoas não conversavam com a gente, não pegavam na mão, tinham medo”.
Mas atualmente ele enxerga de maneira diferente a situação e superou as dificuldades e preconceitos. “Sofria muito, hoje nem me importo. Não é da conta de ninguém”, afirmou J.G.B.
Por conviver a muito tempo com o vírus do HIV, J.G.B aprendeu sobre a doença e hoje alerta os jovens. “Eu falo para esses jovens que gostam de irem em boate que não são imunes a doença. Vocês têm que andar com preservativo na bolsa, na carteira. Aids é uma doença muito séria”.
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