Cuiabá, Domingo, 2 de Novembro de 2025
O NEGÓCIO DO PEIXE; VÍDEO
02.11.2025 | 14h10 Tamanho do texto A- A+

Lei amplia em 40% turismo de pesca: “MT será destino do mundo”

legislação abriu caminho para negócios em regiões antes tomada por lixo e degradação ambiental

Victor Ostetti/MidiaNews

O empresário Alisson Fagner, um dos proprietários da Marina Sérgio Motta em Cuiabá

O empresário Alisson Fagner, um dos proprietários da Marina Sérgio Motta em Cuiabá

LIZ BRUNETTO
DA REDAÇÃO

Às margens do Rio Cuiabá e aos pés da Ponte Sérgio Motta, um dos principais cartões-postais da Capital, amantes da pesca encontram o primeiro Shopping Náutico de Mato Grosso: a Marina Sérgio Motta.

 

O empreendimento foi criado em meio a um crescimento de 40% na procura pelo setor nos dois últimos anos, período que entrou em vigor a Lei do Transporte Zero.

 

Depois que a lei foi aprovada, a procura aumentou bastante. O volume de peixes é visível para todos

A lei entrou em vigor em janeiro de 2024 e, mesmo antes de ser implementada, gerou muitos debates.

 

Ela prevê a proibição do transporte, comércio e armazenamento das 12 espécies e assegura o pagamento de um salário mínimo por mês, durante três anos, aos pescadores profissionais e artesanais inscritos no Registro Estadual de Pescadores Profissionais (Repesca) e no Registro Geral de Pesca (RGP). 

 

O empresário Alisson Fagner, presidente da Associação Mato-grossense de Ecoturismo e Pesca Esportiva (Amepe), é um dos sócios da Marina.

 

Dono também de duas pousadas em Chapada dos Guimarães e atuante no ramo há mais de 10 anos, ele disse que o Shopping Náutico só foi possível sair do papel graças a implantação da lei em Mato Grosso. 

 

“Depois que a lei foi aprovada, a procura aumentou bastante. Os rios estão respondendo de forma positiva, o volume de peixes é visível para todos", disse.

 

"O cara começa a pescar e quer comprar seu barco, seu equipamento, quer um ambiente em que se fale mais de pesca e criamos esse conceito de Shopping Náutico”, acrescentou.

 

Segundo Fagner, sete CNPJs já fazem parte da Marina, incluindo um restaurante, uma choperia, uma concessionária, uma loja de produtos de pesca e roupas, uma de estofados náuticos, outra de manutenção de motores e uma escola náutica. A escola, por exemplo, já habilitou cerca de 3,5 mil alunos. A cada 15 dias, uma nova turma é formada, e os treinamentos de condução e salvamento são realizados no Rio Cuiabá.

 

O projeto nasceu de um sonho que começou em 2024, segundo o sócio Rafael Romera, com a procura de um espaço com acesso que ligue a terra à água para as embarcações.

 

“Foi brincando de drone que descobrimos esse lugar e, apesar das muitas árvores caídas, vimos que era algo no sentido que a gente trabalhava. Essa Marina já existia desde 1990 e estava desativada desde 1993”, afirmou Romera.

 

Cerca de um ano depois, em 5 de agosto de 2025, o empreendimento já estava de portas abertas. “O comércio náutico e da pesca vem crescendo muito, está no pico e não tem queda", disse Romera.

 

"Em três meses de funcionamento, quase lotamos todos os espaços e prevemos fazer mais barracões para colocar mais embarcações. Toda sexta-feira temos música ao vivo, com estrutura de banda. É um sucesso”, afirmou.

 

“Hoje até quem não tem embarcação consegue viver um pouco dessa atmosfera. O ramo cresceu gigantescamente, pelo peixamento e por estar revivendo o Rio Cuiabá. Todo mundo acha que o Rio Cuiabá é só lixo e esgoto, mas não. Hoje o Rio Cuiabá tem muito peixe”, completou.

 

 

  

Universo em expansão

 

A Lei do Transporte Zero foi sancionada em julho de 2023 pelo governador Mauro Mendes. O objetivo era aumentar os estoques pesqueiros e combater a pesca predatória nos rios do Estado.

 

A lei foi flexibilizada em fevereiro de 2024 e proibiu o transporte, armazenamento e comércio, pelo período de cinco anos, de 12 espécies de peixes dos rios estaduais. Essas espécies são: cachara, caparari, dourado, jaú, matrinchã, pintado/surubim, piraíba, piraputanga, pirara, pirarucu, trairão e tucunaré.

 

Victor Ostetti/MidiaNews

Marina Sérgio Motta

Marina em Cuiabá com vista para a Ponte Sérgio Motta

Segundo Fagner, que disse trabalhar des o início da carreira com a pesca sustentável, o impacto da lei no setor foi “superior ao esperado”. Enquanto a expectativa era de um crescimento de até 60% em cinco anos, a estimativa atual é de um aumento de até 40% nos últimos dois.

 

“A nossa agenda para o ano que vem já está 70% vendida e o ano nem acabou. Isso nunca tinha acontecido, nem próximo disso. Nessa época, você teria 30%, 40% da agenda vendida. É algo que a gente nunca viu antes”, disse Fagner.

 

“Esperamos que em cinco anos tenhamos dobrado esse mercado. Cuiabá, nesses dois anos, praticamente, dobrou as lojas de pesca e você vê o mercado inteiro respondendo de forma muito positiva, gerando emprego, renda e trazendo dinheiro de fora para a economia regional”, acrescentou.

 

Para o empresário, Mato Grosso é referência nacional no setor e deve se tornar “o maior destino de pesca do mundo” nos próximos anos.

Victor Ostetti/MidiaNews

Rafael Romera

Rafael Romera, um dos proprietários da Marina Sérgio Motta, em Cuiabá

 

“Logo seremos o principal destino do País e, futuramente, o maior destino do mundo, se a gente continuar com essa política pública de pesca sustentável e de proteção à natureza”, disse Fagner.

 

Ele afirmou que, apesar de o aumento do volume de peixes nos rios ser visível aos olhos, a Amepe ainda articula, junto à Secretaria de Meio Ambiente (Sema), a implementação de pesquisas para monitorar não só os estoques pesqueiros, mas também para mensurar o impacto social da lei na comunidade ribeirinha.

 

Embate e multas

 

O pesquisador Rubem Mauro, engenheiro civil especialista em hidráulica e saneamento, disse enxergar a lei como uma medida positiva e classificou os pescadores como “predadores” que vêm desrespeitando a legislação desde a implementação.

 

“Os pescadores profissionais, em sua maioria, desrespeitam a medida. Recebem no período de defeso um salário mínimo para preservar os cardumes, e não o fazem. Por pressão desses mesmos profissionais, fizeram excluir da lista o pacu, o peixe que sofreu durante todos esses anos”, afirmou o pesquisador.

 

Segundo a Dema (Delegacia Especializada do Meio Ambiente), somente nos seis primeiros meses de 2025 foram apreendidos 1.114 kg de pescado, o que representa um aumento de 570% em relação a todo o ano de 2024, quando foram apreendidos 200 kg de peixes.

 

Foram 41 inquéritos policiais, 11 autos de prisão em flagrante e aplicadas multas administrativas próximas a R$ 250 mil.

 

 

 

A bióloga e professora da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Lúcia Mateus, por sua vez, afirmou que os pescadores atuam como “fiscais” dos rios e que não se pode atribuir somente a eles a “aparente diminuição dos estoques”.

 

Para ela, a degradação do ecossistema aquático sofre influência de fatores como o desmatamento, avanço da agricultura e da pecuária nas áreas de cabeceira, agrotóxicos e esgoto nos rios, entre outros.

 

Segundo Lúcia, não é possível mensurar os impactos da lei, uma vez que não existe um trabalho de monitoramento. “Essa é uma das críticas. Quando você implanta uma medida dessas, tem que eleger indicadores que vão dizer quais são esses impactos. As medidas não tiveram base científica nem na escolha das espécies proibidas”.

 

A bióloga criticou também a proibição de algumas espécies em detrimento de outras. “Proibir algumas espécies e deixar que outras sejam pescadas pode causar alguns impactos. Porque algumas espécies predadoras foram proibidas e as espécies que são a base da cadeia trófica estão liberadas. Então, isso pode causar algum tipo de desequilíbrio. Mas isso são palpites, porque não há estudos”, disse.

 

 

Polêmicas

 

As restrições estabelecidas pela lei não se aplicam à pesca de subsistência realizada por povos indígenas, comunidades tradicionais e quilombolas, nem à captura de peixes feita às margens dos rios para consumo próprio no local.

 

Em novembro de 2023, a Advocacia-Geral da União (AGU) se manifestou pela inconstitucionalidade da lei, após o MDB Nacional entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF), na tentativa de derrubar a norma.

 

À época, a Assembleia Legislativa rebateu as alegações de violação dos princípios constitucionais por não considerar as necessidades dos pescadores artesanais e disse querer proteger o futuro de quem vive da pesca. 

 

“A lei impugnada trouxe consigo o intuito de proteção ambiental e manutenção dos recursos naturais, impondo restrição momentânea com olhos na proteção do futuro de todos aqueles que vivem da pesca e também da própria fauna estadual”, diz trecho da manifestação enviada ao ministro André Mendonça, relator do caso.

Victor Ostetti/MidiaNews

Marina Sérgio Motta

Embarcações na Marina Sérgio Motta, em Cuiabá

 

Em julho de 2024, o ministro Mendonça negou os pedidos e mateve em vigor a Lei do Transporte Zero. Ele entendeu que a lei não afeta a previdência social dos pescadores profissionais e ainda permite a pesca, o transporte e a comercialização de mais de 100 espécies nativas dos rios mato-grossenses, não inviabilizando, assim, a atividade pesqueira.

  

O Ministério Público Federal arquivou, em outubro de 2025, um inquérito civil que investigava possíveis danos ambientais causados pela lei. O colegiado decidiu por unanimidade, seguindo o voto do relator, Aurélio Virgílio Veiga Rios.

 

"Não há notícia de qualquer dano ambiental decorrente da aprovação da referida lei e foi entendido que a legislação busca a proteção da fauna localizada nos rios do Estado de Mato Grosso", diz trecho.

 

O empresário Alisson Fagner classificou a lei como a “melhor política pública de sustentabilidade” do país para o setor de turismo de pesca.

 

Pporque, além de proteger o meio ambiente, permite a pesca esportiva de forma ordenada e criou ferramentas para dar apoio ao pescador artesanal e manter a subsistência durante esse período de adaptação”, completou.

 

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Marina Sérgio Motta

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Alisson Fagner Santos Trindade

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