Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mostrou que dobrou o número de internações de crianças de zero a 10 anos com problemas respiratórios nos estados que compõem a Amazônia Legal. Este é o caso de Mato Grosso, campeão nacional em focos de calor com 27.635 ocorrências registradas desde o início do ano até a última sexta (04).
De acordo com a Fiocruz, viver em uma cidade próxima às queimadas aumenta a probabilidade de se internar por doenças respiratórias em 36%.
O balanço foi publicado na quarta-feira (2) e analisa o aumento dos casos hospitalares em aproximadamente 100 municípios da região amazônica. Nestas cidades foi verificado um total de 5.091 internações por mês, quando o valor esperado seria de 2.589 internações, isto é, quase o dobro do normal, se a incidência de problemas respiratórios fosse uniforme em toda a Amazônia.
“Estes resultados sugerem um excesso de cerca de 2.500 internações de crianças nos municípios mais impactados pelas queimadas”, apontou a Fiocruz.
No norte de Mato Grosso, nove cidades apresentaram um número de internações (147) significativamente acima do esperado (99), isto é, um excesso de 48 internações e representando valor médio taxa e risco relativo (RR) igual a 1,48.
O RR foi calculado para três categorias de densidade de focos. Assim, as cidades mais distantes possuem RR de 0,91, isto é, possuem uma ligeira proteção contra este tipo de evento. No outro extremo, o RR é de 1,36, ou seja, os municípios mais próximos a focos de calor possuem um incremento médio de 36% nas taxas de internação por doenças respiratórias em crianças.
No estado, outros municípios que demonstraram excesso significativo de internações foram Paranaíta, Comodoro, Alta Floresta, Novo Mundo e Guarantã do Norte. Em Comodoro (656 quilômetros de Cuiabá), por exemplo, o número de internações foi mais de cinco vezes maior do que o esperado. “Mas o chamado material particulado, resíduo tóxico gerado por queima, pode também alcançar grandes cidades situadas a centenas de quilômetros dos focos de queimadas, devido ao transporte de poluentes pelos ventos”, destaca o estudo.
Segundo a Fiocruz, considerando o perfil médio das internações de crianças por problemas respiratórios no Sistema Único de Saúde (SUS), estas internações teriam gerado um custo excedente de R$ 1,5 milhões e 9.750 leitos-dia de ocupação nos hospitais públicos e conveniados com o SUS. “Com relação à mortalidade por doenças respiratórias, no momento somente é possível avaliar os óbitos ocorridos nos hospitais, isto é, entre criança internadas. De janeiro a julho de 2019, houve mais casos de óbitos nos estados de Rondônia, Pará e Mato Grosso em relação ao mesmo período de 2018”, destacou.
De acordo com a Fiocruz, as queimadas e a consequente emissão de gases, material particulado, compostos orgânicos voláteis (VOCs) na atmosfera comprometem as condições de saúde das populações nas suas áreas de influência, ocorrendo com mais intensidade na área definida como Arco do Desmatamento, que abrange os estados do Acre, Amapá, Amazonas, parte do Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins”, reforça.
A queima de madeira pode gerar uma grande diversidade de gases e aerossóis, vários destes prejudiciais à saúde, principalmente pelo seu pequeno diâmetro e capacidade de penetrar no aparelho respiratório inferior. “Crianças são mais sensíveis a fatores externos, como a poluição”, explicou o pesquisador Christovam Barcellos, do Icict/Fiocruz, por meio da assessoria de imprensa. “Seu sistema imunológico ainda está em desenvolvimento e o aparelho respiratório, em formação. São mais suscetíveis a alergias”.
Barcellos alerta que o estudo usou as internações em crianças como indicadores de risco. Porém, adultos - e principalmente aqueles com doenças crônicas e idosos - podem ser afetados pela poluição das queimadas.
“As queimadas na Amazônia representam um grande risco à saúde da população”, assegura o texto do informe técnico. “Os poluentes emitidos por estas queimadas podem ser transportados a grande distância, alcançando cidades distantes dos focos de queimadas. Dentre os poluentes, encontram-se o material particulado fino (PM2.5), CO (monóxido de carbono), NO2 (dióxido de nitrogênio) e compostos orgânicos voláteis que podem causar o agravamento de quadros de cardiopatia, inflamação das vias aéreas, inflamação sistêmica e neuroinflamação, disfunção endotelial, coagulação, aterosclerose, alteração do sistema nervoso autônomo, e danos ao DNA, com potencial carcinogênico”.
Ainda, conforme a Fiocruz, a exposição a partículas de aerossóis afeta diretamente a saúde humana, como o aumento da incidência de doenças respiratórias como a asma e as cardiovasculares, que afetam principalmente crianças e idosos, além daqueles com doenças pregressas e gestantes.
O levantamento foi coordenado pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict), ligado à Fiocruz. O número de internações por problemas respiratórios foi obtido por meio do Sistema de Informações Hospitalares, do Datasus, para os meses de maio e junho deste ano, último período disponível. Os dados obtidos são preliminares, uma vez que nem todas as internações do período estudado já estão cadastradas no sistema. Por isso, é possível que os índices sejam ainda mais graves.
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