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NAGASAKI
09.07.2017 | 07h40 Tamanho do texto A- A+

Sobrevivente de bomba atômica vive como artista plástico em Cuiabá

Masanobu Kazurayama virou um hibakusha, como são conhecidos no Japão os sobreviventes

Alair Ribeiro/MidiaNews

Masanobu Kazurayama, 78 anos: sobrevivente relata a tragédia de Nagasaki, na Segunda Guerra Mundial

Masanobu Kazurayama, 78 anos: sobrevivente relata a tragédia de Nagasaki, na Segunda Guerra Mundial

THAIZA ASSUNÇÃO
DA REDAÇÃO

Eram oito horas da manhã do dia 9 de agosto de 1945.  Masanobu Kazurayama brincava com o irmão, em uma estrada perto de casa, nas imediações de Nagasaki, no Japão, quando olhou para o horizonte e viu uma nuvem em forma de cogumelo subindo sobre a cidade e ganhando tamanho ainda maior.

 

Com apenas seis anos, ele não sabia que a nuvem em questão era consequência de uma bomba atômica lançada pelos Estados Unidos sobre Nagasaki, durante a Segunda Guerra Mundial.

 

A bomba matou mais de 40 mil pessoas e deixou milhares de crianças, idosos e mulheres feridos.

 

“Suspendi a brincadeira e fiquei por muito tempo boquiaberto e com os olhos fixos nela [nuvem]. Alguém me agarrou pelo braço e me levou para uma vala no fundo do quintal, onde minha família se escondia dos bombardeios norte-americanos”, contou Kazurayama, em entrevista ao MidiaNews.

 

Ele e ninguém de sua família tiveram sequelas do ataque. Eles viraram "hibakusha", como são conhecidos, no Japão, os sobreviventes da bomba atômica.

 

Atualmente com 78 anos, o japonês - que vive como artista plástico em Cuiabá, desde 1982 - diz que lembra todas as noites da destruição que testemunhou.

 

Kazurayama está com a exposição “Paisagens de Mato Grosso e Japão” aberta para visitação, no Museu da Caixa d’ Água, na Rua Comadante Costa, na Capital.

 

“Seis anos após o lançamento da bomba atômica, eu comecei a estudar e o colégio fez uma visita com todos os alunos no local da destruição.  Lá já estava montado um museu sobre o ocorrido. Quando vi as fotos das pessoas mortas, comecei a chorar. Todos choraram”, disse.

 

O que mais me chamou atenção foi a foto de uma igreja católica com os fiéis que estavam lá dentro, inclusive o padre, que era bem conhecido na cidade, todos mortos

“O que mais me chamou atenção foi a foto de uma igreja católica com os fieis que estavam lá dentro, inclusive o padre, que era bem conhecido na cidade, todos mortos”, contou. 

 

O conflito entre Japão e Estados Unidos, durante a Segunda Guerra Mundial, iniciou-se após o ataque japonês à base naval estadunidense de Pearl Harbor, em 7 de dezembro de 1941.

 

O interesse do Japão era afastar definitivamente a presença americana do continente asiático.

 

Os Estados Unidos, por sua vez, não deixou o ataque barato e decidiu utilizar uma bomba atômica contra o Japão, primeiro, na cidade japonesa de Hiroshima.

 

A explosão aconteceu no dia 6 de agosto de 1945 e deixou mais de 150 mil mortos.

 

Com a negativa das autoridades japonesa em se renderem, os Estados Unidos utilizaramu uma segunda bomba contra o Japão.

 

Essa deveria ter sido lançada na cidade japonesa de Kokura, mas a condição climática da cidade fez com que os pilotos fossem para Nagasaki.

 

A bomba de Nagasaki era 50% mais poderosa que a de Hiroshima, mas parte da cidade foi protegida pelos morros que possuía. 

 

“Testemunhei o horror da destruição do Japão. O país estava arrasado. Lembro da minha mãe dizendo: ‘Não joga nenhum grão de arroz, muitas crianças não tem comida, estão passando fome’”, relatou Kazurayama.

 

O uso das bombas fez com que o Japão se rendesse em 14 de agosto de 1945, colocando fim à guerra.

 

Chegada ao Brasil

 

Kazuarayama cresceu com as lembranças da destruição. Se tornou homem e foi morar sozinho em Kioto, antiga capital do Japão, onde trabalhava como operário e fazia cursos de pintura.

 

 Em 1961, porém, cansado da vida regrada na cidade histórica,  Kazurayama decidiu fazer as malas e embarcar numa aventura ao Brasil.

 

“Saiu uma publicação no jornal do Ministério de Agricultura do Japão, buscando jovens para o melhoramento da agricultura do Brasil, e eu decidi embarcar nessa aventura. Partimos do Porto de Kobe, navegamos pelos oceanos Pacífico e Atlântico por 41 dias e chegamos no Porto de Santos, no dia 8 de maio”, disse.

 

Kazurayama trabalhou, durante três anos, com plantação de batata na cidade de Castro (PR).

 

“Em 1964, eu decidi vir para o Mato Grosso, porque, três anos naquele trabalho no Paraná nem parecia que eu estava no Brasil, porque só tinha japonês, ou seja  conversava com japonês, comia comida japonesa e escutava musica japonesa”, disse, aos risos.

 

Ao chegar em Cuiabá, foi convidado a trabalhar no projeto do Governo Federal chamado "Rio Ferro", no Nortão do Estado.

 

Rio Ferro foi uma gleba colonizada por japoneses e seus descendentes, na área onde se situam os municípios de Feliz Natal e Nova Ubiratã, para o desenvolvimento da Bacia Amazônica.  No local, os japoneses plantava seringueira e pimenta do reino.

 

"Fomos pra lá de caminhão, entramos dentro do mato e morávamos em acampamentos de lonas. À noite, as onças começava a gemer. Tinha anta também. Aí eu falei: aqui é o Brasil mesmo”, lembrou, sorrindo.

 

Durante o período que se manteve na região, Kazurayama pegou três malárias. Na última, teve que se tratar em um hospital em São Paulo.

 

Alair Ribeiro/MidiaNews

Masanobu Kazurayama

Masanobu Kazurayama, ao lado de um dos seus quadros, no Museu da Caixa D' Água, em Cuiabá

Em 1967, o projeto foi encerrado por falta de recursos federais.

 

“Entã,o montei uma serralheria no Rio Ferro e fazia forro de cedrinho para vender  para escolas, igrejas, aqui em Cuiabá. Essa serralheira durou até o ano de 1982”, contou.

 

De volta a pintura

 

Durante todo esse período no Brasil, Masanobu Kazurayama sequer pegou em um pincel.

 

Depois que decidiu encerrar os trabalhos da serralheira, ele resolveu voltar à antiga paixão.

 

“Em 1982, voltei a pintar quadros depois de 21 anos. O material, tinta, óleo, pincel que eu trouxe do Japão para cá já estava tudo estragado, só algumas tintas que ainda estavam meio moles, essas aproveitei tudo”, disse.

 

A arte de Kazurayama está em cena com a exposição “Paisagens de Mato Grosso e Japão”.

 

Os quadros enchem os olhos dos visitantes, como a neve branca do Monte Fuji e das belezas do Pantanal Mato-grossense.

 

A exposição está aberta para visitação  no Museu da Caixa d’ Água e pode ser conferida até o dia 31 de agosto.

 

Algumas das suas obras já foram premiadas nacional e intercionalmente.

 

Kazurayama também ministra aulas de pintura na Universidade Federal de Mato Grosso e na Associação Cultural Nipo Brasileira de Cuiabá e Várzea Grande.

 

"Depois que comecei a pintor denovo, percebi que aqui em Cuiabá tem bastante pintor, mas não esse tipo de pintura, esse estilo meu. Em 2014, comecei esses cursos e cada vez estão aumentando os alunos. Hoje já tem 22 já", disse.

 

Apesar de sentir vontade de voltar no Japão, ele afirma se sentir à vontade em Cuiabá.

 

“Gosto de Cuiabá, é bem tranquilo. Onde moro é bem seguro, não tem nada de assalto, nada disso", afirmou.

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