A Defensoria Pública de Mato Grosso e a Associação da Parado do Orgulho LGBTQIA+ ingressaram com uma ação civil pública por declarações transfóbicas e pedindo indenização por dano moral no valor de R$ 400 mil contra o vereador de Cuiabá, Rafael Ranalli (PL).
Ele é autor da lei 7.344/2025, que determina que o sexo biológico será o único critério para definição de gênero em competições esportivas oficiais realizadas na Capital. A ação é assinada pelo defensor público Willian Felipe Camargo Zuqueti, e pelas advogadas Thais Chaves Brazil Barbosa e Daniella Veyga Garcia Nonato, esta última, a primeira mulher trans jurista do Estado.
O documento aponta que a lei já é objeto de questionamento no Tribunal de Justiça devido a inconstitucionalidade por invadir competência privativa da União para legislar sobre normas gerais de desporto e por afrontar princípios constitucionais como a “dignidade da pessoa humana, a igualdade e a não discriminação”.
A ação cita uma entrevista do bolsonarista, quando ele teria dado declarações “transfóbicas e desumanizantes”. “Afirmou: “não é justo que o João vire Sheila para competir com a Maria”, reduzindo a identidade de pessoas trans a mero capricho ou artifício, com o claro intuito de ridicularizá-las e invalidar sua condição existencial”, exemplifica.
Ranalli declarou, a respeito da ação civil pública ajuizada contra a lei de sua autoria que: “Quando você toma vermífugo, geralmente os vermes se debatem”, comparando diretamente pessoas trans e a comunidade LGBTQIA+ a parasitas que reagem a vermífugo”. Segundo a ação, a expressão carrega evidente “carga semântica de desumanização, negando a essas pessoas a condição de sujeitos de direitos”.
O caráter de incitação ao ódio, segundo a peça, torna-se ainda mais evidente quando, na mesma entrevista, o vereador afirmou: “Clamo aqui todo mundo que tem esse discurso de defesa das mulheres, do feminismo, que venha defender as mulheres contra a participação de homens, que aí se tornaram mulheres, contra mulheres no esporte feminino”. De acordo com a Defensoria e as advogadas, a fala, além de negar a identidade de gênero das pessoas trans, busca convocar setores sociais a se voltarem contra essa população, fomentando hostilidade e rejeição em massa e naturalizando a exclusão.
Destacaram ainda que não se trata de episódio isolado. “O vereador tem se notabilizado pela reiteração de falas de teor manifestamente transfóbico, como será amplamente demonstrado no curso desta ação. Esse padrão de conduta evidencia não apenas desprezo pelas garantias constitucionais da igualdade e da dignidade da pessoa humana, mas também a intenção clara de criar e perpetuar um ambiente de hostilidade e exclusão contra uma comunidade historicamente vulnerabilizada, utilizando o espaço institucional que ocupa para legitimar e difundir preconceitos”, sustentam os autores.
Alegam ainda que o pedido não visa restringir o debate público, mas sim responsabilizar o vereador que, em vez de agir com “respeito institucional”, optou por difundir falas discriminatórias, desumanizantes e de incitação ao ódio.
“Por todo o exposto, requer-se a condenação do requerido ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 400 mil [...]; A imposição de tutela inibitória de mérito, consistente na obrigação de o requerido abster-se de proferir quaisquer discursos, falas ou manifestações públicas de caráter discriminatório ou de ódio contra pessoas trans ou contra a comunidade LGBTQIA+ em geral, sob pena de multa diária a ser fixada por este Juízo, nos termos dos arts. 497 e 537 do CPC e art. 12 da Lei nº 7.347/85”, requerem.
Por meio de nota, o vereador se manifestou. Ele negou que tenha sido transfóbico e que apenas fazia defesa de sua lei. No entanto, informou ainda que não foi notificado formalmente sobre a ação.
Leia a nota na íntegra:
O vereador e policial federal Rafael Ranalli (PL) informa que, até o presente momento, não recebeu qualquer citação ou intimação relativa à ação mencionada, tampouco tem conhecimento formal do teor da demanda noticiada pela imprensa. Diante disso, está impossibilitado de apresentar defesa ou manifestação sobre o conteúdo da ação até que haja regular notificação judicial.
De toda forma, o parlamentar destaca que a Lei Municipal nº 7.344/2025 é uma referência do seu primeiro mandato, tornando Cuiabá a primeira capital do país a legislar sobre o tema. O debate proposto pela norma tem fundamento biológico e científico, e qualquer declaração feita durante o mandato teve o intuito de pedagogizar a discussão, jamais de ofender qualquer grupo.
A ciência já demonstrou que, mesmo após tratamentos hormonais, atletas trans mantêm vantagens biológicas relacionadas a cromossomos, testosterona da puberdade, massa muscular, estrutura óssea e circulação sanguínea. Em 2023, pesquisadores de diversos países reafirmaram que, em esportes de desempenho físico, homens geralmente superam mulheres.
Portanto, o que se defende na lei não é ideologia, mas realidade científica. O objetivo é garantir que a categoria feminina permaneça justa e equilibrada, sem vantagens biológicas. O esporte precisa de regras claras, para que todas as mulheres que treinam, se dedicam e sonham em competir possam fazê-lo em condições iguais.
O vereador reafirma que respeita todas as opções sexuais e escolhas individuais, entendendo que a vida privada é de foro íntimo. Entretanto, o mandato segue firme na defesa do direito das mulheres de competirem em igualdade de condições nas modalidades esportivas. Esse é o sentido da nossa luta: proteger o esporte feminino e assegurar justiça dentro das competições.
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