Cuiabá, Segunda-Feira, 7 de Julho de 2025
DESVIO DE R$ 2 MILHÕES
29.03.2017 | 07h27 Tamanho do texto A- A+

Ex-deputado Riva é condenado a 21 anos e 8 meses de prisão

Condenação é relativa a Operação Arca de Noé; político poderá recorrer em liberdade

Marcus Mesquita/MidiaNews

O ex-deputado José Riva, que foi condenado a prisão por juíza

O ex-deputado José Riva, que foi condenado a prisão por juíza

LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO

A juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, condenou o ex-deputado José Riva a 21 anos e 8 meses de prisão, em regime fechado, por peculato e lavagem de dinheiro

 

A decisão foi dada na última terça-feira (28). Porém, o político - que é réu confesso - poderá recorrer em liberdade da condenação, que é a primeira até agora das dezenas de processos que Riva responde na vara.

 

A sentença é relativa a desdobramentos da Operação Arca de Noé, que apura esquema que teriam desviado dezenas de milhões na Assembleia Legislativa entre o final dos anos 90 e início dos anos 2000, quando Riva presidia a Mesa Diretora.

 

Nesta ação, proposta pelo Ministério Público Estadual (MPE), foi investigado o desvio superior a R$ 2 milhões, que ocorreu mediante 41 pagamentos a "João Roberto Broges Papelaria", empresa de fachada que simulava a entrega de produtos para a Assembleia.

 

Parte do desvio teria sido usada para pagar dívidas com o bicheiro João Arcanjo, ex-chefe do crime organizado em Mato Grosso, e outra parte para pagamentos pessoais e financiamento de campanhas eleitorais.

 

Acusação comprovada

 

De acordo com a juíza Selma Arruda, o MPE comprovou que a papelaria que recebeu os pagamentos "não possuía sede e muito menos estoque ou capacidade para fornecer material de papelaria".

 

"Foi criada, a pedido da mesa diretora da Assembléia, exatamente para se prestar como escudo para o desvio do significativo numerário".

 

Marcus Mesquita/MidiaNews

Selma Arruda 080916

A juíza Selma Arruda, responsável pela condenação

"O Ministério Público encetou várias diligências, visando descobrir se a empresa João Roberto Broges Papelaria efetivamente existia e funcionava. Nos autos há prova de que, naquela ocasião, a empresa estava com inscrição suspensa junto à Secretaria de Fazenda do Estado desde 30 de março de 2001, sendo que a mesma jamais teria emitido notas fiscais ou promovido recolhimento de tributos".

 

Segundo a juíza, as provas mostraram que a empresa também não possui "o registro de empregados e muito menos pagamentos de contribuições sociais junto ao INSS".

"O Ministério Público ainda fez diligências no sentido de localizar João Roberto, o titular da empresa, porém constatou que o seu CPF, em nome de João Roberto Broges não equivale a nenhuma inscrição junto à Justiça Eleitoral e que o endereço apontado é inexistente. Quando fizeram diligências no sentido de elucidar a existência e o funcionamento da empresa, verificaram que o imóvel indicado no endereço encontrava-se desocupado. Em contato com o proprietário de tal imóvel, o mesmo informou que jamais alugou aquele local para a empresa denominada João Roberto Broges Papelaria", disse ela.

 

Outra prova que pesou na condenação foi o fato de a Mesa Diretora da Assembleia não ter atendido aos pedidos do Ministério Público no sentido de enviar documentos que provassem a regularidade dos pagamentos, "tais como processo licitatório, empenho, pagamento, comprovação da entrega da mercadoria ou do serviço executado".

 

Também foram levados em conta os "rastros" deixados por comparsas de Riva durante a execução do esquema.


"As investigações demonstraram que as microfilmagens do cheque sacado na boca do caixa continham em seu verso assinaturas de um suposto representante da empresa de papelaria, até hoje não identificado. Todavia, além desta assinatura, verifica-se também assinaturas de Luiz Eugênio Godoy, na época Secretário de Finanças da Assembléia Legislativa e de Guilherme Garcia ou Geraldo Lauro, ambos igualmente servidores lotados naquela casa de leis. O Ministério Público argumenta que tais assinaturas funcionavam como uma espécie de senha dada pelos emitentes dos cheques para que o Banco do Brasil efetuasse o pagamento diretamente no caixa".

 

Desvios pagaram dívidas

 

A juíza ressaltou que, conforme as provas e a própria confissão de Riva, o ex-deputado recorria à Factoring Confiança, pertencente a João Arcanjo, sempre que precisava de dinheiro para cobrir despesas pessoais, "e, portanto, alguns desses cheques emitidos contra a conta corrente da Assembléia foram destinados à Factoring para pagamento de operações financeiras".

"Ocorre que os cheques emitidos pelas empresas fantasmas a mando do acusado José Geraldo Riva eram remetidos à Factoring e lá eram trocados por dinheiro ou por cheques da própria Factoring e eram encaminhados ou às pessoas credoras do acusado José Geraldo. Posteriormente, a Confiança Factoring depositava os cheques emitidos pela Assembléia Legislativa e se ressarcia do adiantamento que havia feito".

"Com efeito, restou apurado que o acusado José Geraldo Riva agiu em conluio com terceiras pessoas, a fim de possibilitar o desvio de verba da Assembléia Legislativa por meio dos crimes de peculato já noticiados, fatos que foram praticados durante anos a fio e, mais especificamente, no caso desta ação penal, por mais de dois anos (novembro de 2000 a Dezembro de 2002)".

 

Na decisão, a juíza citou que Riva confessou o esquema e afirmou que a maior parte dos desvios ocorreu para pagar dívidas de responsabilidade de seus antecessores na Mesa Diretora, mas que, ao invés de se negar a assumir tais dívidas, "preferiu fazê-lo e também se locupletar da abundância de verba que jorrava dos cofres do Legislativo".

 

Não há dados concretos que me façam aquilatar sua personalidade, embora já tenha deixado antever que é pessoa extremamente gananciosa e relativiza seus escrúpulos quando se trata de enriquecer

"A confissão de José Geraldo Riva não conflita com as demais provas já coligidas. Ao contrário, corrobora aquilo que o Ministério Público já vinha afirmando desde o oferecimento da denúncia, baseado nas provas indiciárias e nas quebras de sigilo bancário. Além do peculato, denota-se da prova dos autos a ocorrência de crimes de Lavagem de Dinheiro. Com efeito, durante todo o período apontado na denúncia, em que houve irregularidades na administração do Poder Legislativo Estadual, o réu José Geraldo Riva agiu visando dissimular e ocultar as verbas desviadas".

 

"Extremamente ganancioso"

 

Ao decretar a pena, Selma Arruda afirmou que Riva cometeu os crimes por "ganância" e fez da vida política "um meio de locupletamento ilícito".

 

"Tratava a coisa pública como se sua fosse, ora praticando os desvios em favor próprio, ora para aquisição de bens, ora para quitação de dívidas ilicitamente contraídas durante a campanha eleitoral (caixa 2), ou para praticar fisiologismo ou mesmo para beneficiar comparsas. José Geraldo Riva tem formação superior, portanto, tem entendimento suficiente da ilicitude de seus atos, de modo que percebo que praticou os crimes com dolo direto e intenso".

 

Ela destacou que o ex-deputado possui a vida marcada por desvios de conduta, mas possui relacionamento social intenso, "tanto que há pouco tempo pretendia candidatar-se ao Governo do Estado de Mato Grosso e só não o fez graças à ação do Judiciário".

"Não há dados concretos que me façam aquilatar sua personalidade, embora já tenha deixado antever que é pessoa extremamente gananciosa e relativiza seus escrúpulos quando se trata de enriquecer. Todavia, durante o interrogatório foi colaborativo e mostrou-se de certa forma arrependido, ainda que tal arrependimento possa ter se ocasionado apenas por conta da estratégia defensiva que adotou ao final do trâmite deste processo".

 

Desta forma, a juíza entendeu que, com base em todas as informações constantes no processo, "não há outro caminho senão a condenação.".

 

"As circunstâncias em que os crimes foram cometidos não favorecem o acusado, que se aproveitava da qualidade de membro da Mesa Diretora do Poder Legislativo Estadual não apenas para promover os desvios e o branqueamento do dinheiro ilícito, mas armou toda uma estratégia e comandou uma equipe de pessoas especialmente nomeadas para possibilitar o sucesso da empreitada criminosa. Tudo foi arquitetado e gerido pelo acusado".

"A nocividade da ação do réu foi além dos fatos por ele praticados, já que, tratando-se de líder político, utilizava dos próprios desvios para alimentar suas campanhas eleitorais e retroalimentava sua permanência no poder".

 

Outro lado

 

A defesa de Riva, feita pelo advogado Rodrigo Mudrovitsch, classificou a decisão como "desproporcional", uma vez que o próprio Ministério Público pediu a absolvição em relação à lavagem de dinheiro.

 

O advogado adiantou que irá recorrer da decisão.

 

"De toda sorte, a defesa de José Riva segue confiante na capacidade do Poder Judiciário e do MP de fazer justiça".

 

Veja a íntegra da nota da defesa:

"A defesa de José Geraldo Riva manifesta discordância e surpresa com o teor da primeira sentença penal proferida contra o seu cliente no âmbito da Operação Arca de Noé.

De início, relembra a defesa que ainda pende de apreciação, pelo STJ, questionamento referente à incompetência absoluta da Justiça Estadual para processar e julgar a causa. Já há precedentes do STF em casos idênticos que fixam a competência da Justiça Federal para análise do caso, o que tende a levar à anulação da sentença condenatória proferida hoje.

Além disso, entende a defesa que a condenação pelo crime de lavagem de dinheiro é completamente descabida, haja vista que o próprio órgão ministerial já havia se manifestado pela absolvição de José Riva em relação a esse delito.

Por fim, destaca a defesa que a pena fixada para o crime de peculato é extremamente desproporcional. Além de violar frontalmente diversos dispositivos do Código Penal e o entendimento pacífico dos Tribunais superiores, a dosimetria da pena imposta a José Riva não faz justiça à postura colaborativa adotada por José Riva ao longo de todas as ações penais da operação Arca de Noé. Desconsidera a ampla contribuição feita por ele para as investigações e ignora que o próprio MP utilizou as decorações de José Riva como embasamento para alavancar as investigações contra outros réus. A sentença representa, portanto, um desestímulo a atos de colaboração com o Poder Judiciário, na contramão do que reza a legislação mais moderna e na contramão do que tem sido visto atualmente em outras operações relevantes.

De toda sorte, a defesa de José Riva segue confiante na capacidade do Poder Judiciário e do MP de fazer justiça. A sentença em questão será impugnada mediante recurso.

Por fim, destaca a defesa que a linha colaborativa que vem sendo adotada por José Riva não será modificada em razão da sentença."

Rodrigo Mudrovitsch

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2 Comentário(s).

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sandra  29.03.17 12h27
Parabéns! Juiza Selma Arruda. justiça é isso, punição e com rigor ...
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tobias de aguiar  29.03.17 10h21
tobias de aguiar, seu comentário foi vetado por conter expressões agressivas, ofensas e/ou denúncias sem provas