LUCAS RODRIGUES
DO MIDIAJUR
O Pleno do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-MT) aplicou a pena de aposentadoria compulsória à juíza Carla Reita Faria Leal, da 8ª Vara do Trabalho de Cuiabá.
A decisão foi tomada de forma unânime, na tarde desta quinta-feira (30), no julgamento de Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD).
Os desembargadores concluíram que a juíza adquiriu de forma ilícita um apartamento no Edifício Ville Dijon, no valor de R$ 300 mil, que foi vendido a ela em 2011 pelo agora prefeito de Cuiabá, Mauro Mendes.
Por sua vez, Mendes adquiriu o imóvel em 2009, em leilão judicial do TRT-MT.
A desembargadora relatora do caso, Eliney Veloso, afirmou que a compra do imóvel pelo prefeito no leilão foi realizada com o intuito de, posteriormente, repassar o bem à juíza.

"A arrematação do imóvel no leilão foi feita pelo interesse da juíza, que, para dar ares de legalidade, simulou um empréstimo cuja existência não foi comprovada"
A juíza não participou da hasta pública por si própria, conforme a desembargadora, pois a legislação proíbe magistrados e servidores de participarem de leilões judiciais dos órgãos em que atuam.
“A arrematação do imóvel no leilão foi feita pelo interesse da juíza, que, para dar ares de legalidade, simulou um empréstimo cuja existência não foi comprovada”, afirmou.
A desembargadora votou pela pena de aposentadoria compulsória, com proventos proporcionais ao tempo de serviço.
O voto foi acompanhado pelos desembargadores Tarcísio Valente, Osmair Couto, Roberto Benatar, Maria Berenice Souza, Beatriz Theodoro e Edson Bueno.
Defesa
A juíza Carla Reita negou qualquer tipo de ilegalidade e alegou que o imóvel foi repassado a ela como forma de quitar um empréstimo que a mesma teria feito ao prefeito em 2009, também no valor de R$ 300 mil.
Em depoimento prestado à desembargadora, a juíza afirmou que emprestou o valor em razão da proximidade pessoal com o político, que também é amigo de seu marido, o advogado Pascoal Santullo Neto, atual secretário de Gestão da Prefeitura de Cuiabá.
“Ele [Mauro Mendes] disse que precisava do valor e, como eu tinha disponibilidade, emprestei. Eu não perguntei por que ele precisava do dinheiro. Se a pessoa é minha amiga e me pede um valor emprestado, apenas empresto, porque as razões do pedido são pessoais”, diz trecho do depoimento da juíza, citado pela desembargadora Eliney Veloso.
Em sustentação oral, o advogado Saulo Rondon Gahyva também defendeu a inocência da juíza com o argumento de que diversas testemunhas atestaram que, antes da transação, ela pesquisou diversos imóveis no centro da cidade para comprar.
“A juíza vendeu seu antigo apartamento em 2011 e procurou por outros imóveis, como atestaram as testemunhas. Onde está a fraude e a simulação de ato jurídico? Ora, que crime perfeito é esse em que todos os fatos apurados indicam a verdade?”, questionou o advogado.

"Os comprovantes não foram apresentados em juízo porque na verdade nunca existiram"
Transação questionadaEm seu voto, a desembargadora Eliney Veloso disse "estranhar" o fato de a juíza ter emprestado R$ 300 mil a Mauro Mendes sem sequer se lembrar da data do suposto empréstimo.
“Como alguém pode simplesmente se esquecer da data em que emprestou tão vultosa quantia?”, perguntou.
Eliney Veloso também citou o depoimento do prefeito de Cuiabá que, assim como a juíza, "não soube explicar a finalidade do alegado empréstimo".
Ela ainda afirmou que, no mesmo ano em que a juíza teria emprestado os R$ 300 mil, Mauro Mendes declarou o Imposto de Renda na ordem de R$ 7 milhões.
“Estes fatos revelam a desnecessidade do referido empréstimo junto à investigada. Também não subsiste a justificativa de interesse para a compra do imóvel, porque o próprio [Mauro Mendes] admitiu que nunca esteve no local”, relatou.

"A postura da investigada em esconder os documentos revela uma conduta absolutamente contraditória e reforça a conclusão de que o empréstimo foi mera afirmação para dar aparência de legalidade"
Documentos não entregues
Outro fator que pesou na condenação foi a negativa da juíza Carla Reita em entregar os documentos que comprovariam o suposto empréstimo.
Neste aspecto, a desembargadora citou trecho de decisão do juiz federal Cesar Bearsi, que analisou pedidos de quebra de sigilo contra Carla Reita.
“Ora, como muito bem realçado pelo juiz Cesar Bearsi, não tem o menor sentido a defesa esconder o documento que poderia conter a prova de sua própria inocência. O juiz também afirmou que, se ela faz questão de esconder o documento, só leva a crer que a prática de ilícito poderia ser confirmada pelos dados bancários”, destacou.
Assim, a desembargadora concluiu que a juíza tentou esconder a “conduta antiética” que teve ao adquirir o apartamento.
“A postura da investigada em esconder os documentos revela uma conduta absolutamente contraditória e reforça a conclusão de que o empréstimo foi mera afirmação para dar aparência de legalidade”, salientou.
“Os comprovantes não foram apresentados em juízo porque na verdade nunca existiram”, completou.