Dizem que democracia é o direito de escolher. Em Mato Grosso, porém, a sensação é outra: é o dever de confirmar. Confirma-se o que já está posto, o que já manda, o que já circula pelos mesmos corredores, aperta as mesmas mãos e herda o mesmo poder como se fosse escritura registrada em cartório. A pesquisa recente apenas oficializa o óbvio. Mauro Mendes aparece com 65,6%. Janaina Riva, 36,4%. Jayme Campos, 19,7%.
Números robustos, é verdade. Mas robusta mesmo é a repetição. São nomes que não surgem do chão da feira, da fila do SUS ou da poeira da periferia. Surgem dos gabinetes, das alianças antigas, das famílias políticas que tratam o Estado como se fosse extensão do sobrenome.
O eleitor, nesse cenário, não escolhe: ele aceita. Aceita porque não vê alternativa. Aceita porque o cardápio é velho, requentado, sem tempero novo. Aceita porque, entre os “donos do poder”, resta apenas decidir qual deles vai administrar a chave do cofre. Não há povo nessa disputa. Há elite política. Uma elite que se reproduz, se recicla em cargos diferentes e se apresenta como novidade apenas no discurso publicitário. O poder em Mato Grosso parece ter patente registrada: passa de mão em mão, mas nunca sai do mesmo círculo.
A sociedade, por sua vez, assiste. Sem perspectiva crítica, sem oxigênio. Falta debate, falta projeto, falta imaginação política. Sobra marketing, sobra pesquisa, sobra a sensação de que o futuro já foi decidido antes mesmo do voto. Quando tudo é velho, nada se renova. Quando ninguém do povo chega, o povo se afasta. E assim seguimos, chamando de democracia um processo em que a maior disputa não é por ideias, mas por quem já se senta mais perto do trono.
Talvez o maior dado da pesquisa não esteja nos percentuais, mas no silêncio que eles representam. Um silêncio cansado de quem vota sem acreditar, escolhe sem esperança e participa de uma eleição onde a pergunta nunca é “quem nos representa?”, mas apenas “qual deles vai ganhar?”.
Some-se a isso o peso das oligarquias, que em Mato Grosso não são apenas um traço do passado, mas um método ativo de poder. Famílias, grupos econômicos e alianças históricas se revezam nos cargos como quem respeita uma tradição silenciosa: mudar os nomes, preservar o modelo.
A administração pública segue a mesma lógica há décadas — eficiente para manter privilégios, ineficaz para transformar realidades. Governam para que tudo funcione dentro do esperado, não para que algo mude de fato. Obras aparecem, discursos se renovam, mas a estrutura social permanece intocada. É a política da continuidade do controle, não da ruptura; da gestão do poder, não da emancipação do povo.
Joel Mesquita é sociológo.
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