A chamada "blindagem patrimonial" tornou-se uma prática recorrente no universo empresarial brasileiro. Em um primeiro olhar, ela parece legítima: proteger o patrimônio pessoal dos sócios e garantir segurança jurídica em tempos de instabilidade. Contudo, quando essa proteção ultrapassa os limites legais e se transforma em ferramenta para fraudes fiscais, sonegação ou ocultação de bens, o que era estratégia se converte em crime.
Hoje, existem diversos modelos utilizados para blindar patrimônios: abertura de holdings familiares, uso de empresas de fachada, interposição de laranjas, transferências simuladas de bens e até movimentações internacionais para paraísos fiscais. Ainda que algumas dessas estruturas sejam, por si só, legais, o problema surge quando se tornam instrumentos de ocultação de renda, evasão de tributos ou frustração da execução fiscal por parte do Estado.
No âmbito das investigações conduzidas pela Delegacia Fazendária, é comum identificarmos complexas redes societárias criadas não para desenvolver atividade econômica real, mas sim para dificultar a identificação de bens e impedir o cumprimento de decisões judiciais ou execuções fiscais. Em muitos casos, essas operações são combinadas com práticas de sonegação fiscal estruturada, prejudicando o Fisco e toda a sociedade.
É importante lembrar que o planejamento tributário lícito é diferente da fraude fiscal. O primeiro visa aproveitar legalmente benefícios e incentivos previstos em lei. O segundo tem por objetivo dissimular fatos, omitir rendimentos e frustrar o poder arrecadatório do Estado. O limite entre um e outro está no propósito negocial legítimo, na transparência das operações e na boa-fé do contribuinte.
Por isso, antes de iniciar qualquer estruturação patrimonial, é fundamental que o contribuinte busque orientação com profissionais experientes e íntegros, que atuem dentro dos parâmetros legais e com responsabilidade ética. O desconhecimento da legislação não isenta de responsabilidade penal, e um modelo mal concebido pode trazer prejuízos severos.
Dessa forma, fica o alerta: proteger o patrimônio é direito, mas fazê-lo para fraudar o sistema tributário é crime. O uso indevido de estruturas jurídicas para esconder patrimônio, dificultar a cobrança de dívidas tributárias ou impedir sanções judiciais pode configurar, entre outros crimes, fraude à execução, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e até organização criminosa, dependendo do contexto.
Blindar patrimônio não pode ser sinônimo de esconder, iludir ou manipular. Deve ser, sim, um instrumento legítimo de segurança jurídica, desde que ancorado em finalidades lícitas, planejamentos transparentes e pleno respeito ao ordenamento jurídico. Nesse sentido, a prevenção é sempre o melhor caminho.
O combate à sonegação e à ocultação fraudulenta de bens é essencial para assegurar a justiça fiscal e garantir que os recursos públicos retornem à população em forma de serviços. É nessa linha que seguimos firmes em Mato Grosso, aprimorando os instrumentos de investigação e promovendo parcerias institucionais para recuperar ativos desviados e desarticular esquemas sofisticados de blindagem ilegal.
Walter Fonseca é delegado titular da Delegacia Especializada de Crimes Fazendários.
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