Cuiabá, Sábado, 2 de Agosto de 2025
GABRIEL HENRIQUE
23.12.2021 | 07h36 Tamanho do texto A- A+

Dia do orgulho hétero: uma vergonha para Cuiabá

Câmara é motivo de chacota há anos, mas passou de todos os limites

Que a Câmara de Cuiabá vem sendo motivo de chacota há muitos anos, isso ninguém tem dúvida, mas na última semana ela passou de todos os limites. Com a aprovação do Projeto de Lei que cria o Dia do Orgulho Hetérossexual, os nobres parlamentares inserem na agenda política da capital um dia para celebrar o orgulho da orientação sexual que sempre foi aceitável e considerada “normal”.

 

Oras, a heterossexualidade é a expectativa da vivência da sexualidade humana desde que um casal recebe a notícia de uma gravidez e inicia neste momento a construção de planos de vida para o futuro recém-nascido. Toda essa expectativa tem como finalidade que o filho ou a filha tenha a missão de construir uma família, ter e criar seus filhos, para a reprodução do ceio familiar.

 

Então, corresponder a todas as expectativas da heterossexualidade faz com que uma pessoa tenha toda a sua vida social e subjetiva reconhecida por todos e em todos os contextos.

 

Vejam só, um adolescente que inicia um namoro na escola tem, em sua maioria, a aprovação de seu relacionamento diante dos professores, dos colegas de sala de aula e da família. Além disso, o seu relacionamento é autorizado socialmente para a demonstração de afeto em ambiente público.

 

Muito diferente, acontece com a pessoa homossexual (o gay e a lésbica). Desde os anos escolares, o homossexual convive com situações violentas de chacota, agressões físicas e até mesmo violências sexuais, além de ter a suas relações afetivas reprovadas e recusadas em quase todos os ambientes coletivos. Exatamente por isso que muitos casais gays e lésbicos se recusam em demonstrar afeto em ambiente público.

 

É como costumo dizer, vivemos negociando nossa sexualidade com o “armário”, em troca de evitar o constrangimento ou até mesmo em troca da sobrevivência.

 

Assim como acontecem com gays e lésbicas, acontecem com as pessoas que possuem identidade de gênero diferente do gênero esperado pelo sexo de nascimento. Eu costumo dizer que a vida da pessoa trans é bem pior, a prova disso é que a expectativa de vida de uma mulher transexual não chega na casa dos 40 anos de idade.

 

Vejam bem, criar a agenda política do dia do orgulho hétero, como forma de reconhecer a heterossexualidade assim como se faz no dia do Orgulho LGBTI é mostrar uma completa ignorância da verdadeira agenda política que é o dia 17 de maio, dia do Orgulho LGBTI.

 

O dia do Orgulho LGBTI surge a partir de um acontecimento num badalado e histórico bar novaiorquino nos Estados Unidos, nos anos 60.

 

Não há sentido para um dia celebrar os privilégios. Por isso, caberá aos parlamentares comprovarem as pautas a serem reivindicadas no Dia do Orgulho Hétero

O acontecimento se trata de um ataque policial ao bar chamado Stonewall Inn, no qual várias pessoas LGBTI, em sua maioria transexuais e gays foram brutalmente violentados.

 

A partir do ataque houve uma grande mobilização que desencadeou o surgimento, inicialmente, da Revolução de Stonewall, que ganhou forças e fez surgir as caminhadas nas ruas com pautas reivindicatórias de direitos civis.

 

Ou seja, o Orgulho LGBTI surge a partir de um acontecimento histórico de violência, que marca a vida de várias, senão todas as pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Além disso, o dia do Orgulho LGBTI serve como contraponto a toda experiencia negativa com que as pessoas LGBTIs viveram.

 

O Orgulho LGBTI serve para que cada lésbica, gay, travesti, transexual possa encontrar apoio entre os seus e ressignificar a dor, a rejeição e a marca da violência e celebrar o amor e a vida.

 

Tudo isso que justifica o dia do Orgulho LGBTI não cabe ao dia do Orgulho Hétero. Não há sentido para um dia celebrar os privilégios. Por isso, caberá aos parlamentares comprovarem as pautas a serem reivindicadas no Dia do Orgulho Hétero.

 

Caso não possam justificar a importância e relevância dessa data, fica provado que os parlamentares que votaram pela aprovação do Projeto de Lei não possuem compromisso com a capital mato-grossense, muito menos com os munícipes que hoje exigem a seriedade, honestidade e um projeto de capital que garanta saúde e educação pública e de qualidade, segurança pública, emprego e renda.

 

Gabriel Henrique P. de Figueiredo é psicólogo, mestre em Psicologia Social, trabalhador do SUS/Cuiabá, presidente do Conselho Regional de Psicologia.

 

*Os artigos são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do MidiaNews. 

 

Entre no grupo do MidiaNews no WhatsApp e receba notícias em tempo real (CLIQUE AQUI).




Clique aqui e faça seu comentário


COMENTÁRIOS
4 Comentário(s).

COMENTE
Nome:
E-Mail:
Dados opcionais:
Comentário:
Marque "Não sou um robô:"
ATENÇÃO: Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do MidiaNews. Comentários ofensivos, que violem a lei ou o direito de terceiros, serão vetados pelo moderador.

FECHAR

Paulo Jose  23.12.21 18h47
Lamentável que em meio a uma pandemia que nunca termina, uma cidade que tem a marca da fila do osso no currículo (nacionalmente), se preocupe com tolices. Combater a fome, gerar empregos, políticas sociais, são temas mais urgentes que a sexualidade reprimida de parlamentares desocupados. Mas a fila do osso tá que cresce com gente PASSANDO FOME. Isso deveria incomodar. SQN.
7
6
ricardo  23.12.21 15h19
Simples...vejamos o que diz a constituição: Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade... Logo...se um grupo tem o direitos...o outro também tem! Ninguém deve ser tratado diferente! O resto é bla..blá..blá e mimimi!!!
48
15
José Herculano da Silva  23.12.21 14h30
Enquanto a sociedade viver de brigas entre classes, a tendência é cada dia mais uma classe ser instigada contra a outra. É dia disso, dia daquilo. Cota para isso, cota para aquilo. Se pode dia para um, porque não se pode o dia para o outro? Podemos ter o dia da diversidade sexual mas não se pode ter o dia do hétero porque esta ofendendo? O meu pode mais o seu não pode! Estamos chegando nos limites da comiseração social
37
13
Rodrigues Schneider  23.12.21 09h14
Trata-se de um desserviço a humanidade. Tal projeto tende a justificar a heterossexualidade, como sendo um fator social, historicamente marginalizado e, igualmente, subalternizado. Tal contexto, em tese, nos leva a crer que a heterosexualidade é um estatuto que precisa ser reafirmado na sociedade e legitimado através dos instrumentos legais. A inquietude que nos causa é: quantos héteros morrem, diariamente, apenas pelo fato de serem héteros nesse mundo? Ouso responder. NENHUM! Qual o sentido, o significado, a relevância social de se criar um dispositivo legal desse, sendo que a categoria de heteronormatividade é engrenagem motora de reafirmação do patriarcado, da branquitude, de privilégios, e do modelo obsoleto da ladainha do "conservadorismo" (nem ele sabem explicar o que conservar). Homossexuais, bissexuais, são categorias políticas marcadas em corpos marginalizados, subalternizados, violentados, dizimados ao longo de tempos. O que torna imperativo a legitimidade de sua identidade, de seus corpos, de suas lutas - de si mesmo. A afirmação identitária, só é legítima e validada socialmente, quando a cultura/sociedade, por meio de seus mecanismos e processos sociais negam e desligitimam sua existência. O que, necessariamente, não estende aos heterossexuais. Volto a repetir, trata-se de um desserviço a humanidade e uma vergonha nacional para Cuiabá.
40
65



Leia mais notícias sobre Opinião:
Agosto de 2025
01.08.25 05h30 » “Ele era legal, né?”
01.08.25 05h30 » 10 mil mortes invisíveis
01.08.25 05h30 » Fibromialgia como deficiência
01.08.25 05h30 » Agosto Lilás
Julho de 2025
31.07.25 05h30 » A dinâmica do corpo
31.07.25 05h30 » Trump, atos e controvérsias
30.07.25 05h30 » Psicose ChatGPT
30.07.25 05h30 » Caso Juliana