Passados 17 meses da vitória do Lula sobre o Bolsonaro, ainda não se veem sinais da normalização dos relacionamentos entre os seguidores de um e de outro. Só não se agravaram porque não há espaço para piorar.
Mas, nem sempre foi assim. Antagonismos políticos sempre existiram, mas eram um sentimento que se agravava na proximidade das eleições e arrefecia com o distanciamento delas, de forma que nos intervalos entre pleitos ninguém se privava de tomar uma cerveja com quem pensava diferente.
Eis que um dia o PT, representado pela figura mefistofélica do Lula, brandiu do alto de um palanque a frase que nunca mais deixou de ecoar: “nós contra eles”. Na época esse dito ainda não sinalizava uma inimizade profunda como temos hoje. Ele transmitia mais a ideia de duas torcidas de futebol que se antagonizam durante as partidas, mas não levam inimizade para outros ambientes onde esses torcedores se encontram.
Hoje, mudou o cenário político brasileiro que é marcado por uma intensa polarização entre os apoiadores dos dois principais políticos do país: Lula e Bolsonaro. Esta rivalidade não apenas predomina os períodos eleitorais, como também perpetua a divisão que se nutre de xingamentos e insultos, impróprios para quem se diz civilizado.
Como uma quebradura que se calcifica, cristalizaram-se os sentimentos antagônicos e tudo indica que não haverá mudanças pelo menos em um futuro próximo.
Tem um complicador: nossas instituições estão extremamente desgastadas diante da opinião pública. Algumas, em parte, por sua própria culpa como o Supremo que, em ato que o povo não entende, anulou os julgamentos anteriores do Lula. Outras, como as Forças Armadas, que antes das eleições de 2018, gozavam de excelente prestígio na população, quase foram arrastadas para um golpe de Estado. Fomos salvos por um general legalista que se recusou a participar. Os políticos, que nunca tiveram boa reputação, continuam desprestigiados como sempre.
A justiça eleitoral, sem a qual não há democracia, foi demonizada pela extrema-direita, embora nunca tenha sido provado qualquer deslize dela. A Imprensa, outro pilar incontestável de um país livre, está sendo trocada, com um prejuízo que o futuro mostrará, por mídias sociais que, cheias de más intenções, se comprazem em divulgar mentiras.
Outro agravante: a calcificação dos extremos garante que não haverá melhoras enquanto os atuais mito e demiurgo comandarem a política nacional.
O pior de tudo é a intolerância que se instalou de ambos os lados, dividindo o Brasil em duas tribos incivis que não se suportam mutuamente. Sobre essa ojeriza recíproca, o filósofo Karl Popper em sua exposição sobre o paradoxo da tolerância sugere que, se estendermos a tolerância ilimitada para os intolerantes, os tolerantes serão destruídos e a tolerância com eles. Ele escreve: “devemos reservar, em nome da tolerância, o direito de não tolerar o intolerante”.
Renato de Paiva Pereira é empresário e escritor.
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1 Comentário(s).
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Eduardo 22.04.24 10h42 | ||||
O antagonismo político no Brasil sempre foi marcado por um conchavo de ideais semelhantes e iguais em vários aspectos. Pelo primeira vez, existe, de fato, um antagonismo ideológico, o que retirou a supremacia intelectual dos intolerantes progressistas, apelidados de esquerda limpinha. O Autor fala em justiça eleitoral como indissociável da democracia, mas esquece que o Brasil é o único país democrático que a possui. Não confunda LEI eleitoral que deve ser aplicada por um magistrado de carreira (nos países sérios), com justiça eleitoral, formada por um tribunal politicamente nomeado (como na república das bananas). Mas se nada mudou, parabéns pelo seu voto, errar é humano, mas persistir 03 vezes no mesmo erro é outra coisa. Por fim, a liberdade de expressão é possibilitar a quem você não gosta dizer aquilo você não concorda. O contrário disso é intolerância. Vejo que o Autor tem muita, afinal, só não permite o pensamento alheio quem não é capaz de se contrapor a ele. | ||||
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