Há pessoas cuja vida transforma o seu tempo e ajuda a moldar o futuro. Transformam o presente ao oferecer uma nova visão do mundo e moldam o porvir com uma influência que transcende sua existência terrena. A primatologista inglesa Jane Goodall teve uma dessas vidas extraordinárias.
Em tempos em que muitos promovem a desinformação e cultivam a indiferença ambienta, é imperativo reverenciar aqueles que se dedicaram à busca do conhecimento e à defesa da vida em todas as suas formas. Jane Goodall, que nos deixou neste mês de outubro aos 91 anos, é uma dessas luminosas personalidades que transcendem os limites da ciência para se tornar símbolo de ética, empatia e resistência.
Sem formação acadêmica formal em biologia, Jane iniciou sua jornada científica nos anos 1960, sob a tutela do renomado antropólogo Louis Leakey. Foi enviada à Tanzânia para estudar chimpanzés na floresta de Gombe, em uma época em que mulheres eram praticamente excluídas da pesquisa de campo. Com um caderno, binóculos e uma paciência infinita, ela desafiou paradigmas e revelou ao mundo que os chimpanzés não eram apenas criaturas instintivas, mas seres complexos, capazes de fabricar ferramentas, expressar emoções e construir laços sociais profundos.
Essas descobertas abalaram os alicerces da primatologia e da própria definição de humanidade. Dominada por homens e por uma visão mecanicista da natureza, a comunidade científica inicialmente reagiu com ceticismo. Alguns chegaram a desdenhar de suas observações por ela nomear os animais em vez de numerá-los. Mas a força dos dados, aliada à sua integridade e perseverança, venceu a resistência.
Nossa heroína não se limitou ao papel de pesquisadora. Com o passar dos anos, tornou-se uma incansável defensora dos direitos dos animais e da conservação ambiental. Fundou o Instituto Jane Goodall, presente em dezenas de países promovendo educação, pesquisa e ações de preservação. Sua mensagem era clara e urgente: não há separação entre o destino dos humanos e o dos demais seres vivos. A destruição das florestas, o tráfico de animais silvestres e o consumo desenfreado são ameaças que nos atingem a todos.
Mais do que dados e estatísticas, Jane nos ofereceu uma visão ética da ciência. Ela nos lembrou que o conhecimento deve servir à vida, e que a empatia é tão essencial quanto a razão. Mesmo em seus últimos anos, seguiu viajando, inspirando jovens, líderes e comunidades com sua voz serena e firme.
O bom cientista é impulsionado pela curiosidade e dedicação. O cientista bom a isso acresce a paixão por aprender e o entusiasmo em compartilhar, bem como o zelo para que o conhecimento adquirido seja aplicado para o bem comum.
Em um mundo que precisa de pontes entre ciência e consciência, Jane Goodall permanece uma heroína. Não por ter vencido batalhas acadêmicas, mas por ter revelado a grandeza e a beleza de nossa profunda conexão com a natureza e ter agido com amor e esperança para protegê-la.
Luiz Henrique Lima é professor e doutor em Planejamento Ambiental.
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