A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira (17) um requerimento de urgência de projeto que anistia os condenados pelos atos golpistas. Os parlamentares discutirão, a partir de agora, se aprovarão um perdão amplo, que envolva até o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ou uma redução das penas, como negociado nos bastidores com alas do STF (Supremo Tribunal Federal).
A aprovação da urgência é uma derrota para o governo Lula (PT), que atuava para evitar o avanço dessa pauta. Com a condenação do ex-presidente pelo Supremo na semana passada, aumentou a pressão de bolsonaristas sob o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para, enfim, pôr o tema para análise do plenário.
A urgência leva o tema da anistia diretamente para o plenário, sem a necessidade de aprovação em comissões, e representa um aceno da cúpula da Câmara para oposição bolsonarista. Líderes do centrão, no entanto, negociam para que seja aprovada somente uma proposta de redução de penas dos condenados pelos atos golpistas.
A articulação para destravar o tema em plenário foi articulada por cardeais de partidos do centrão e ganhou tração com movimentações do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que viajou a Brasília para se reunir com autoridades e pressionar o presidente da Casa, seu correligionário.
O centrão quer Tarcísio como adversário de Lula nas eleições presidenciais de 2026 e busca, com a anistia, um gesto a Bolsonaro na expectativa de que ele abençoe a candidatura do governador.
Foram 311 votos favoráveis à urgência do projeto proposto pelo deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), com apoio de partidos do centrão -eram necessários 257 para que a urgência fosse aprovada. Agora, os parlamentares ainda devem analisar o mérito, ainda sem texto definido e sem data estabelecida.
O resultado da votação impõe uma derrota ao Palácio do Planalto. A orientação do governo era de impedir o avanço desse tema. Como a Folha de S.Paulo mostrou, parlamentares foram alertados de que o Executivo poderá rever indicações de cargos na estrutura federal de quem apoiasse o texto.
Além disso, a avaliação entre aliados de Lula é que a aprovação da anistia representaria uma vitória para o governo Donald Trump, que iniciou uma ofensiva contra o país num criticar o julgamento de Bolsonaro.
Petistas disseram ainda que haveria uma suposta quebra de acordo dos partidos do centrão, e creditam essa postura ao incômodo com a posição do PT contra a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Blindagem, que dificulta que os parlamentares sejam processados criminalmente.
Antes de iniciar a sessão, Motta disse que o Brasil precisa de pacificação e que caberia ao plenário decidir, diante de "visões distintas e interesses divergentes sobre os acontecimentos de 8 de janeiro de 2023".
Ele afirmou que, caso fosse aprovada a urgência, um relator seria nomeado para que a Câmara pudesse chegar, "o mais rápido possível", a um texto substitutivo que encontrasse apoio da maioria da Casa.
"Tenho a plena convicção que a Câmara dos Deputados, na qualidade dos seus membros, terá a capacidade de construir essa solução, que busque a pacificação nacional, o respeito às instituições, o compromisso com a legalidade e levando em conta também as condições humanitárias das pessoas que estão envolvidas nesse assunto que estamos tratando", discursou Motta.
A votação foi criticada por parlamentares de partidos de esquerda, com coro de "sem anistia", e celebrada por bolsonaristas, que falaram em dia histórico.
Líder do PT, Lindbergh Farias (RJ) disse que quem votasse a favor do texto estaria comprometendo a sua biografia. Ele também se dirigiu a Motta, lembrou o motim de bolsonaristas que inviabilizou o trabalho da Câmara e disse que "a turma que te desrespeitou, que não foi punida, está aí comemorando".
"Os senhores ao votarem na anistia estão sendo cúmplices de um golpe de estado continuado", afirmou Lindbergh. "Não estão pacificando nada. Vocês estão abrindo caminho para a extrema direita atacar as instituições."
Líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), agradeceu a "retidão e o equilíbrio" de Motta, criticou a esquerda e falou em julgamento "injusto, político e que persegue opositores".
Pesquisa do Datafolha realizada nos dia 8 e 9 de setembro mostrou que a maioria dos brasileiros é contra a aprovação de uma anistia para livrar Bolsonaro. Rejeitam a ideia 54%, ante 39% que a defendem.
Na manhã de terça (16), Motta já havia informado aos líderes partidários que ele levaria o tema à votação, posição reafirmada em reunião com os líderes dos partidos à noite. Ele também avisou isso a integrantes do Palácio do Planalto e ao próprio presidente Lula, com quem almoçou na segunda-feira (15), e buscou autoridades em Brasília para tratar do tema, inclusive ministros do Supremo.
Motta também pediu aos líderes partidários para que contassem votos em suas respectivas bancadas antes de tomar a decisão. Como a anistia ampla tem oposição de boa parte do centrão e de toda a esquerda, o acordo entre o PL e Motta foi o de votar a urgência de outro projeto que também trata de anistia, de autoria do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), e era mais restrito.
Parlamentares do PL celebraram a iniciativa de votar a urgência, mas dizem que trabalharão para que seja aprovado um projeto que dê anistia ampla, geral e irrestrita, incluindo Bolsonaro.
A aprovação da urgência, argumentam os deputados, não significa adesão ao texto. Após a definição de um relator, todo o conteúdo da proposta pode ser alterado. Nesse sentido, a votação da urgência nesta quarta apenas inaugura um novo embate entre bolsonaristas, centrão e esquerda pelo teor da matéria.
Enquanto bolsonaristas insistem na anistia ampla, líderes do centrão afirmam que não há maioria para isso e argumentam que essa proposta acabaria barrada no Senado ou no STF, além de ser vetada pelo presidente Lula.
O centrão articula uma matéria alternativa, de redução de penas, que poderia até incluir Bolsonaro, mas sem um perdão para os crimes. A ideia é evitar que o ex-presidente cumpra pena na Papuda e, em vez disso, siga em prisão domiciliar por causa de sua idade e saúde, o que já estaria combinado com uma ala do STF. Articulada por Motta, a proposta de redução de penas teria aval do STF, do Senado e do Planalto.
A proposta desenhada por Motta e o centrão reduz a pena do crime de abolição violenta do Estado democrático de Direito, de prisão de 4 a 8 anos para entre 2 e 6 anos. Já o crime de golpe de Estado, hoje com prisão entre 4 a 12 anos, iria para 2 a 8 anos. Além disso, as punições por esses dois crimes não se somariam mais --seria excluído o crime menos grave.
O texto de Crivella anistia, desde o dia 30 de outubro de 2022 até a publicação da lei, "todos os que participaram de manifestações com motivação política e/ou eleitoral, ou as apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas".
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1 Comentário(s).
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pedro 18.09.25 09h26 |
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