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PRESA NA ITÁLIA
12.12.2025 | 08h22 Tamanho do texto A- A+

Moraes anula votação que salvou Zambelli e manda Motta dar posse a suplente

Plenário da Câmara contrariou decisão do STF, que condenou parlamentar a perda de mandato

Reprodução/GloboNews

Presa na Itália desde julho, deputada aguarda processo de extradição ao Brasil

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DA FOLHAPRESS

O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), decretou nesta quinta-feira (11) a perda do mandato da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP). Na mesma decisão, determinou que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), dê posse ao suplente da parlamentar em 48 horas.

 

Na madrugada de quinta (11), a Casa salvou o mandato de Zambelli. Foram 227 votos pela cassação e 170 contra —era necessário maioria de 257 votos para cassá-la. A parlamentar está presa na Itália, para onde fugiu após ter sido condenada pelo STF sob a acusação de ter ordenado a invasão de sistemas do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

 

Ministros do Supremo acompanham com apreensão mais esse capítulo da conturbada relação entre Legislativo e Judiciário. A avaliação é de que a semana termina confusa, após os esforços de conciliação em torno da decisão de Gilmar Mendes sobre a legitimidade para apresentação de pedidos de impeachment de ministros da corte.

 

Enquanto isso, o Legislativo também discute restrições à corte, como proposta para diminuir espectro para decisões monocráticas dos magistrados. A própria decisão em favor da deputada era vista como um recado à corte.

 

Além do caso Zambelli, a semana teve também a aprovação, pela Câmara, do PL da Dosimetria que prevê a redução de penas para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e para os demais condenados pelo Supremo por envolvimento em atos golpistas.

 

"Trata-se de ATO NULO, por evidente inconstitucionalidade, presentes tanto o desrespeito aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, quanto flagrante desvio de finalidade", disse Moraes sobre a votação que preservou o mandato de Zambelli.

 

Segundo o relator, o rito adotado por Motta de submeter a representação do caso da deputada do PL ao plenário da Casa para deliberação e votação é inválido. Caberia à Câmara, segundo ele, apenas dar cumprimento ao decidido pelo STF.

 

"Em respeito à Constituição Federal, é o Poder Judiciário quem determina a perda do mandato parlamentar condenado criminalmente com trânsito em julgado, cabendo à Mesa da Câmara dos Deputados, nos termos do §3º do artigo 55 da Constituição Federal, tão somente DECLARAR A PERDA DO MANDATO, ou seja, editar ato administrativo vinculado", afirmou.

 

Um ministro do STF ouvido pela Folha reforça que seria desnecessário submeter a matéria ao plenário, pois bastaria uma consulta à Mesa Diretora da Câmara.

 

Especialistas ouvidos pela reportagem citam que tanto a discussão do assunto no plenário quanto a determinação pela Mesa Diretora eram possíveis no cenário da parlamentar, uma vez que o caso é compatível com dois trechos da Constituição, cada um com regras diferentes. Eles apontam, entretanto, que o cenário tende à cassação, uma vez que a parlamentar teve os direitos políticos suspensos.

 

Segundo Alberto Rollo, especialista em direito eleitoral, a decisão da Câmara é contestável sob o argumento de que parlamentares com o direito político suspenso, caso de Zambelli, não podem exercer o mandato.

 

Para o especialista, foi isso que pesou na decisão de Moraes. "O ministro entendeu que a Câmara não tinha outro caminho a não ser decidir a perda do mandato, porque não existe deputado sem direitos políticos."

 

De acordo com Ricardo Gueiros, professor de direito da Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo), o caso apresenta, tecnicamente, um conflito de interpretações constitucionais. "Entretanto, a decisão do ministro Alexandre de Moraes segue a linha mais recente da jurisprudência do STF."

 

Já Welington Arruda, mestre em direito e justiça pelo IDP (Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa), lembra haver precedentes importantes, como os casos de Natan Donadon, Paulo Feijó e Nelson Meurer.

 

No caso do ex-deputado federal Natan Donadon (PMDB-RO), o STF determinou em 2013 a prisão do parlamentar em razão de condenação por formação de quadrilha e peculato. A Câmara levou o caso ao Plenário, que manteve o mandato do parlamentar. Donadon, entretanto, foi afastado do cargo pelo então presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves. Ele foi posteriormente cassado por um procedimento aberto no Conselho de Ética.

 

Aliados de Zambelli se manifestaram nas redes sociais com críticas duras a Moraes. O líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), chamou o ministro de "ditador psicopata". Sóstenes afirmou que Moraes abusa do próprio poder.

 

A decisão de Moraes foi dada de ofício, nos autos da execução penal de Zambelli. Ou seja, sem relação com eventual pedido incluído no processo para que Moraes se manifestasse a respeito. O último andamento do processo ocorreu no domingo (7), em um pedido da defesa da bolsonarista.

 

O ministro cita reportagens sobre a deliberação da Câmara, incluindo uma imagem do site da Casa.

 

Moraes também pede ao ministro Flávio Dino, presidente da Primeira Turma, sessão em plenário virtual das 11h às 18h desta sexta (12) para a análise do tema. A sessão foi confirmada cerca de uma hora depois por Dino.

 

De acordo com Moraes, no julgamento do mensalão a corte decidiu pela possibilidade de perda automática do mandato parlamentar, a partir do trânsito em julgado de condenações criminais. O entendimento foi de que não é possível manter mandato depois da perda de direitos políticos.

 

Zambelli foi condenada, em maio, à perda de mandato e a dez anos de prisão por invadir o sistema do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) com ajuda do hacker Walter Delgatti Neto, também condenado.

 

Segundo a acusação, Delgatti emitiu uma ordem de prisão falsa contra Alexandre de Moraes e disse ter feito isso a pedido da deputada. Zambelli diz que não ajudou a redigir o documento falso e que soube da invasão do CNJ pelo hacker somente depois dos fatos, ao receber dele os arquivos fraudados.

 

Outro precedente citado por Moraes foi o de Paulo Maluf (PP-SP). Em agosto de 2018, a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados cassou por unanimidade o deputado. A perda do mandato já havia sido determinada pelo ministro do STF Edson Fachin em dezembro de 2017, quando também decidiu pela prisão do parlamentar.

 

Em outra ação penal, referente à condenação do deputado federal Paulo Feijó (PR-RJ) por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em um desmembramento da operação Sanguessuga, o tribunal apontou que outra hipótese de perda automática de mandato é quando a condenação impõe o cumprimento de pena em regime fechado, de forma a ter como consequência a ausência do congressista a um terço das sessões ordinárias da Casa Legislativa.

 

O plenário da Câmara deliberou a respeito da perda de mandato, seguindo o entendimento de Motta de que, segundo a Constituição, cabe ao Congresso a palavra final em caso de parlamentar condenado criminalmente.

Motta havia dito inicialmente que a Mesa da Câmara homologaria a ordem do STF imediatamente, mas recuou após pressão do PL e mandou o caso para a CCJ em junho.

 

Pesou a favor de Zambelli, assim como no caso de Glauber, o corporativismo dos deputados e a avaliação de que a cassação é uma medida drástica. Além disso, a votação se soma aos recados de insatisfação dos parlamentares em relação ao STF.

 

Adversários de Zambelli, por outro lado, lembraram, durante a votação, o episódio em que ela sacou e apontou uma arma para um homem na véspera do segundo turno das eleições de 2022, o que também lhe rendeu uma condenação.

Leia mais sobre o assunto:

 

Câmara contraria decisão do STF e mantém mandato de Carla Zambelli

 

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