Embora voltada ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a aplicação da Lei Magnitsky pelos EUA extrapola o magistrado e gera tensão inédita na corte e no Poder Judiciário, avaliam especialistas ouvidos pela Folha.
Eles também falam em ataque à soberania e projetam que a medida não deve mudar o comportamento do Supremo na ação penal que julga a tentativa de golpe de 2022 -liderada, segundo a PGR (Procuradoria-Geral da República), pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O governo do presidente Donald Trump aplicou contra Moraes sanções econômicas via Lei Magnitsky, legislação do país voltada a violadores de direitos humanos e líderes acusados de corrupção. Ao anunciar a medida, no final de julho, os EUA afirmaram que Moraes usou sua posição de magistrado para "autorizar detenções arbitrárias" e "suprimir a liberdade de expressão".
Antes da aplicação da Lei Magnitsky, o governo americano já havia proibido a entrada de Moraes e de outros ministros do STF nos Estados Unidos. Na sequência, anunciou o tarifaço de 50% a produtos brasileiros, este também associado ao julgamento de Bolsonaro na corte.
Na última quinta-feira (7) a embaixada dos Estados Unidos afirmou em publicação nas redes sociais que "aliados de Moraes no Judiciário e em outras esferas" também podem ser punidos. Logo após a aplicação da Magnitsky, o Supremo lançou nota de apoio ao magistrado.
No comunicado, a instituição ressaltou que "não se desviará do papel de cumprir a Constituição e as leis do país" e que o julgamento de crimes como os imputados ao ex-presidente é de exclusiva competência da Justiça.
O recado também foi dado durante sessão de abertura do semestre do Judiciário, quando prevaleceu o discurso sobre a independência da Justiça brasileira.
A reação pública dos ministros da corte de apoio a Moraes foi, porém, abalada depois que o magistrado decretou de ofício, no início deste mês, a prisão domiciliar de Bolsonaro. Segundo o juiz, Bolsonaro desrespeitou medida cautelar que o proibia de usar as redes sociais ao participar de manifestações por intermédio de terceiros.
A prisão domiciliar renovou à máxima potência o esforço pelo impeachment do ministro vindo de bolsonaristas, que chegaram a se amotinar no Congresso. Também parte dos ministros do STF desaprovaram a medida, embora alguns deles, como Gilmar Mendes, tenham mantido apoio público às ações do magistrado.
Para Diego Nunes, professor de direito da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), a decisão inédita de aplicar a lei Magnitsky contra uma autoridade brasileira não deve concretamente interferir no julgamento de Bolsonaro. A avaliação do especialista vai em direção à manifestação de magistrados da corte ouvidos pela Folha.
Eles refutam a ideia de que as sanções interfiram na ação penal e falam na possibilidade de o julgamento ser permeado por discurso de soberania. Nunes classifica o episódio como uma tentativa internacional de descrédito da Justiça brasileira.
Para o especialista, os Estados Unidos aplicaram mal a legislação, que foi desenhada para punir ditadores, traficantes e terroristas. "Eventualmente pode-se discordar de uma ou outra decisão de Moraes, mas elas não acarretaram graves violações de direitos humanos e muito menos se referem a atos de corrupção", diz.
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