02.07.2013 | 09h:00

"HERANÇA" DE HENRY


Saúde paga R$ 826 mil por hospital desativado há 10 anos

Contrato era para retomar transplantes que nunca foram realizados

Mary Juruna/MidiaNews

Henry (detalhe) assinou contrato de locação do hospital, desativado há 10 anos

Sem nunca ter realizado uma transplante sequer, o Governo de Mato Grosso pagou R$ 826.294,57 para o Hospital das Clínicas de Mato Grosso Ltda., pelo aluguel do prédio que deveria se tornar o Hospital de Transplantes, em Cuiabá.

As informações são do Sistema Integrado de Planejamento, Contabilidade e Finanças (Fiplan).

O contrato 057/2011 foi assinado em 10 de novembro de 2011 pelo então secretário estadual de Saúde, Pedro Henry (PP), com os representantes do hospital: José Geraldo de Saboia Campos, Alfredo Leite Hage e Teresinha Ivone da Cunha Barbosa.

A unidade hospitalar deveria ter 130 leitos e capacidade para realizar transplantes de rim, de coração.

Há 10 anos, no entanto, esses procedimentos não são feitos no Estado - apenas os transplantes de córnea estão mantidos, mas no Hospital dos Olhos, no bairro Jardim Cuiabá.

De acordo com o contrato, a locação se refere a um imóvel comercial, localizado na Rua Odorico Tocantins, nº 200, no bairro Quilombo. A área é de 1090 m², com estacionamento, móveis, utensílios, equipamentos e instrumentos.

De acordo com as informações do contrato, o prazo seria de 10 anos, ao custo de R$ 145.816,76 ao mês, totalizando R$ 1.749.801,12 anual.

Na cláusula 3.1.1 do contrato, após o primeiro pagamento, haveria um período de carência para adaptação das instalações para o funcionamento do Hospital de Transplantes.

"Um mês após a assinatura do contrato foram pagos com recursos do Fundo Estadual de Saúde o valor de R$ 145.816,36 pela locação do espaço inutilizado"



Um mês após a assinatura do contrato, foram pagos com recursos do Fundo Estadual de Saúde R$ 145.816,36 pela locação do espaço inutilizado.

No dia 17 de abril de 2012, foi realizado novo pagamento do aluguel, mas desta vez de R$ 680.478,21, mais de quatro vezes  o valor acordado por mês.

Contudo, o sistema Fiplan mostra ainda um saldo a liquidar de notas empenhadas no valor total de R$ 771.689,39, a ser pago para o Hospital das Clínicas de Mato Grosso Ltda.

Apesar de jamais ter prestado serviço de transplante desde 2011, apenas no Diário Oficial Estadual de 18 de março de 2013 consta a suspensão amigável do contrato 057/2011 e da dispensa de licitação 0142/2011.

Reportagem da revista Exame, edição 1043, de junho de 2013, subestimou o gasto em R$ 200 mil em aluguel do prédio do hospital. O deputado Ademir Brunetto (PT) pediu explicações do governo estadual.

“Representantes do governo estadual pronunciaram que estes problemas seriam resolvidos com a inauguração do hospital, previsto para iniciar suas atividades em 2012. Contudo, quase um ano após a previsão de inauguração da unidade de transplantes, o que vemos, até agora, é só um espaço vazio, sem equipamentos, sem remédios, sem médicos e sem data para funcionar”, informou o deputado.

“Estamos andando na contramão de outros estados”, relatou Brunetto, que apresentou dados do Ministério da Saúde.

“Segundo as informações, o número de transplantes cresceu 12,7% em todo o território brasileiro, comparando o período de janeiro a junho de 2011 e 2012. No entanto, em Mato Grosso, há uma década, nenhum transplante acontece aqui. Em todos os outros, os pacientes precisam ser atendidos em outros estados”, disse Brunetto.

O parlamentar ainda expôs que os pacientes que precisam de transplante de rim ou enxerto ósseo têm queentrar em uma fila de espera dos outros estados, aguardando um longo período para conseguir realizar seu procedimento. “

A cirurgia e a passagem para ir à outra cidade são financiadas pelo Estado, através do Sistema Único de Saúde (SUS). Entretanto, a hospedagem, alimentação e outros gastos são por conta do paciente”, destacou o parlamentar.

Hospital era referência

Mary Juruna/MidiaNews

Vizinha do hospital, ex-funcionária diz que estabelecimento oferecia serviços com tecnologia de ponta

O local que já funcionou como os nomes fantasia de Hospital Neurológico, depois como Hospital das Clínicas e, por último, como Hospital Santa Rosa 2, fechou as portas em dezembro de 2003. O local era referência em serviços de alta complexidade.

De acordo com a ex-funcionária, a auxiliar de enfermagem Edna Siqueira, o local funcionava com um dos mais modernos centros cirúrgicos e UTI em Cuiabá.

“Dá dó de ver toda essa estrutura inutilizada. Quando começamos a trabalhar lá, ganhamos os uniformes, sapatos, tudo. Eu trabalhei lá desde o início, acho que ficou em funcionamento uns cinco anos”, disse ela, que também é vizinha do local.

O Governo de Mato Grosso - na época, sob a gestão de Blairo Maggi e com Marcos Machado no comando da Secretaria Estadual de Saúde - tentou negociar a compra do hospital em 2004, mas os proprietários queriam R$ 14 milhões e o negócio não foi pra frente. O Governo havia oferecido R$ 8 milhões.

Em 2010, ao concluir o relatório da CPI da Saúde, na Assembleia Legislativa, o relatório indicou ao Estado a compra do Hospital das Clínicas para amenizar os problemas de falta de vagas em leitos.

Conforme a proposta da CPI, o local poderá reduzir o quadro de mais de quatro mil pessoas aguardando cirurgias de alta complexidade como as ortopédicas, do coração e neurológica.

Outro lado

Desde 28 de junho, MidiaNews tenta contato com a Secretaria de Estado para obter informações sobre o contrato de locação e o fato de nunca ter utilizado o local para a realização dos transplantes.

Em e-mail enviado à assessoria de imprensa da pasta, a reportagem ainda questionou se os valores empenhados serão liquidados ou se, com a rescisão do contrato, foram expirados.

A assessoria de imprensa disse apenas que os transplantes não foram realizados porque o Ministério da Saúde não teria condições de mandar recursos para o pagamento dos procedimentos. E que o Estado tinha que, primeiro, dar as condições, arranjando um local referenciado para os transplantes, para, depois, iniciar a parceria com o Governo Federal.

O deputado federal Pedro Henry, ex-secretário de Saúde e e responsável pelo contrato de aluguel do imóvel, não foi localizado pela reportagem. Ele não atendeu às ligações para seu telefone celular.

Veja abaixo os documentos de pagamento.

Clique AQUI para ler o contrato e AQUI para ler a rescisão do contrato.

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