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Dentre as características do neonazismo está o ativismo online
Estudando o neonazismo no Brasil por mais de 15 anos, a doutora em antropologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Adriana Dias, identificou que Mato Grosso possui três células neonazistas.
Segundo ela, os grupos estão organizados em Cuiabá, Várzea Grande e Rondonópolis.
De acordo com a pesquisadora, é provável que a célula de Várzea Grande tenha começado na Capital e, devido à mudança de residência dos membros, passou para a outra cidade.
Adriana estima que cada célula de Mato Grosso tenha até 10 pessoas, porém não consegue dizer com precisão a quantidade.
“Eu não tenho o número de pessoas que participam dessas células, não tenho como ter certeza. Não são células grandes, são células de menos de 10 pessoas, mas não tenho como precisar e nem [dizer] como é o grupo de apoio que elas têm”, explica.
Ainda conforme o estudo, todas as células neonazistas mato-grossenses são hitleristas, mas uma delas também tem influência do Batalhão Azov, da Ucrânia, ou mantém contato com membros da organização paramilitar.
O Batalhão Azov é acusado de ser uma organização neonazista porque faz uso recorrente de símbolos como a suástica, o sol negro e a saudação romana.
Além disso, o Batalhão Azov tem envolvimento em casos de abusos de direitos humanos e crimes de guerra, como torturas, estupros, limpeza étnica e perseguição de homossexuais e judeus, na Guerra Civil no Leste da Ucrânia.
De acordo com Adriana, o batalhão ucraniano recruta voluntários por todo o mundo.
“É muito comum que essas células com ligação com o Batalhão Azov tenham vínculo com academias de lutas. É possível que alguém infiltrado no boxe dentro de Mato Grosso, não necessariamente no boxe oficial, possa ter vínculo com o Batalhão Azov e com essa célula”, alerta a doutora.
Neonazismo: breve história e características
Adriana define o neonazismo como um grupo de pessoas que faz ciberativismo e prega ideologias ligadas ao nazismo. São movimentos heterogêneos e cada grupo pode agir da maneira que melhor entende os fenômenos históricos, sociais, biológicos ou religiosos.
Outra característica forte é que cada agrupamento possui um grau específico de nazificação e atua sob efeito de grande radicalização como uma forma de defender e perpetuar o grupo.
“Com certos aspectos paranoicos, de modo a formatar uma noção de ‘nós’ como ‘o povo branco’, superior, que se contrapõe ao ‘outro’ por ele construído como ‘inimigo’ e profundamente odiado, elaborando que sua ‘sobrevivência’ dependeria de uma masculinidade exacerbada, exaltada, violenta, nacionalista, anti-semita, disposta a morrer pela causa”, acrescenta.
A pesquisadora também aponta que as células nazistas no Brasil podem ter de três a 40 membros, mas em geral têm cerca de 10 ativistas apoiados por um grupo de familiares e amigos.
A doutora diz que o número pode até ser pequeno, mas é um alerta que mostra que a ideologia de ódio já está em diversos pontos do País. Ela ainda questiona os novos comportamentos que permitiram este fenômeno.
“É pouco, mas se você observar, é muito as células neonazistas já terem chegado nessa região. A questão é essa: que tipo de narrativa social está sendo permitida para chegar nessa região?”.
Em geral, segundo Adriana, os líderes das células neonazistas em geral possuem ensino superior e boa condição social, porém ela alerta que pode haver exceções.
“Existem células em que as pessoas não têm essa condição social e a gente até fica perplexo do porquê determinadas pessoas estão aderindo ao neonazismo”, revela.
Outro ponto importante identificado na pesquisa é de que as células brasileiras não se comunicam entre si e, muitas vezes, não sabem da existência uma da outra. Isso ocorre como uma forma de se protegerem.
“Eu já vi coexistirem duas células em uma cidade muito pequena e elas não saberem da existência uma da outra. Às vezes, uma pessoa de uma célula sabe da existência de outras e ela se comunica com uma pessoa, mas isso é muito raro. Quando há comunicação, é feita não necessariamente pela 'Deep Web', mas também por e-mails irrastreáveis”, explica Adriana.
Reprodução/STF
A doutora em antropologia Adriana Dias alerta para o crescimento do neonazismo no país
Mudança de perfil
Segundo a pesquisadora, o perfil das células neonazistas mudou após uma rixa entre dois líderes que resultou na morte de Bernardo Dayrell, 24 anos, e sua namorada Renata Waechter, 21, em 2009, no Paraná.
Ricardo Barollo, 34 anos, e Dayrell eram os líderes dos maiores movimentos neonazistas brasileiros. O assassinato descortinou uma rede organizada de neonazistas no Brasil, com ligações em outros países.
Ainda de acordo com a doutora, o neonazismo surgiu logo depois da Segunda Guerra Mundial e começou a se espalhar no Brasil nos anos 80, mas se intensificou mesmo em meados dos anos 2000.
“De lá para cá, ele vem crescendo bastante exponencialmente. Nos últimos anos, houve um crescimento por conta da própria apropriação do discurso, que a gente chama de transferência de propaganda de primeira fase para uma propaganda de terceira fase”, afirma.
Já nos Estados Unidos, a ideologia ganhou força com a criação do Partido Nazista Americano, em 1960, por George Lincon Rockwell, que chegou a ser candidato a presidente. Rockwell foi assassinado sete anos mais tarde por um membro do seu próprio grupo.
David Lane, chamado de “Hitler americano”, começou sua trajetória no National Alliance, grupo supremacista branco desenvolvido a partir do Partido Nazista e formado pelo físico Willian Pierce.
Após a morte de Rockwell, Lane usou um pseudônimo para escrever o livro The Turner Diaries, que conta a história de um grupo de jovens que derrubaria o governo estadunidense por meio de roubos e assassinatos.
Este livro ajudou na construção do The Order, em 1983, grupo que tentou transformar a ficção em realidade.
Submundo da internet
Foram mais de 15 anos de pesquisa que resultaram na tese de doutorado “Observando o ódio: Entre uma etnografia do neonazismo e a biografia de David Lane” da antropóloga.
Dias analisou sites, blogs, fóruns comunidades neonazistas, documentos e atividades fora das redes. Com isso, ela detalha como agem esses supremacistas, seus pensamentos e formas, e como desenvolvem o ódio às minorias.
O foco gira em torno de David Lane, seu papel na construção do neonazismo estadunidense e como influenciou o movimento extremista no Brasil.
Para levantar os dados, Adriana, que também é programadora, fez uso de ferramentas como Gephi, N*Vivo e Thor para acessar a Deep Web. Ela utilizou algoritmos para buscar palavras-chave e ainda desenvolveu instrumentos que fornecem extratos numéricos.
Ao colher as informações após localizar uma célula, a doutora também aciona a Polícia Federal, Ministério Público ou ONGs de direitos humanos e denuncia as atividades ilegais.
“Quando eu localizo uma célula, eu encaminho para a Polícia Federal os lugares na internet onde eu localizo essas pessoas para acharem elas mais rápido. Eu não denuncio a célula, eu denuncio já a página, a identificação do grupo, do nickname, identificação da url”, explica.
Apologia ao nazismo é crime no Brasil desde 1989. A lei prevê reclusão de dois a cinco anos de prisão a quem “fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo”.
Comentários (3)
É preciso ficar atento para essas evidências de neonazistas. Ainda que pareça teoria da conspiração, é necessário ficar de sobreaviso. Ignorar tais evidências podem permitir o surgimento de um mal que pode desestabilizar tudo aquilo que chamamos de democracia e diversidade.
enviada por: Waldney Lisboa Data: 02/12/2019 11:11:31
Essas células nazistas tem terreno fértil em Mato Grosso basta ver a quantidade de pessoas altas, loiras e de olhos azuis em nosso Estado e a escassez de negros e mulatos em nossa sociedade. Kkkk isso parece até piada de mal gosto gente.. A beleza de nosso país é justamente a diversidade que nos une.
enviada por: Paulo Tuffik Data: 01/12/2019 17:05:46
Faz sentido, pq Varzea Gde nos ultimos tempos tem tem se tornado uma das cidades mais perigosas do Pais. Ali mata, assalta, estupra e tudo mais. E feia a coisa
enviada por: Renato Fontes Data: 01/12/2019 10:10:47