Começo este artigo com uma frase polêmica. O que quero dizer com Bolsonaro de volta ao primeiro turno? A eleição já acabou e passou pelos dois turnos, como determina a Constituição nos casos em que nenhum candidato atinge maioria relativa do eleitorado já no primeiro. Já há quem fale em "terceiro turno" para descrever o comportamento de alguns atores, que não teriam aceito o resultado das urnas e manteriam um perfil ainda típico do período eleitoral. Aqui muitos incluem até meios de comunicação.
Mas o meu argumento neste artigo é que estamos de volta ao primeiro turno porque os índices de avaliação bom + ótimo do Governo Bolsonaro divulgados em abril pelas principais empresas de pesquisa apontam números muito próximos do que o atual presidente teve nas urnas dia 07/10/2018. O Datafolha apontou 32% de bom + ótimo em 08/04/19 e a votação obtida pelo candidato do PSL ficou muito próxima disso quando são considerados os votos totais. Foram cerca de 49 milhões de votos num eleitorado de 147 milhões de aptos a votar, o que nos dá índice de 33,3% dos votos totais. O capital político acumulado no segundo turno foi perdido, quando cerca de 8 milhões de eleitores viraram para Bolsonaro e também os outros que foram atraídos entre a eleição e a posse.
Isto seguramente acendeu o sinal amarelo no Governo, como podemos perceber por algumas mudanças importantes. As declarações polêmicas do primeiro trimestre foram reduzidas e o foco nas questões econômicas foi ampliado. Houve o diagnóstico de que parte dessa queda de popularidade deriva da estagnação do PIB e dos resultados ruins no emprego e na renda. Depois disto uma série de medidas foi adotada para a economia, inclusive na tramitação da reforma da previdência, mediante forte articulação com Rodrigo Maia. Aquilo que foi dito por muitos analistas e operadores políticos de que o Governo não chegaria ao fim do mandato se
esse ritmo de perda de popularidade fosse mantido revelou-se uma realidade muito forte.
Outro dado interessante foi a recomposição da base de apoio a Bolsonaro. Aconteceu o que um modelo que apresentei há alguns anos anos preconizava. Os eleitores de renda e escolaridade mais alta tendem a ter perfil oposicionista, pelo seu comportamento mais crítico em relação aos governos e pelo alto consumo de informação. Já os eleitores de renda e escolaridade mais baixas tendem a ser situacionistas, por conta da dependência de políticas públicas ou, infelizmente, de redes clientelistas em muitos casos. Alguns partidos ou agentes políticos chegam ao poder amparados neste eleitor de classe média e alta e depois o perdem para a oposição. Acabam popularizando sua base de sustentação, recompondo seus apoiadores na camada de população de renda e escolaridade mais baixas. Foi assim com o PMDB, PSDB e mesmo com o PT.
Em poucos meses de Governo Bolsonaro houve uma confirmação da validade deste modelo. O presidente ganhou eleitores na faixa apenas com ensino fundamental de 20 para 29%, ficou parado no nível médio e caiu no superior, com menos 5%. Quer dizer, foi um aumento expressivo em termos relativos no nível fundamental, em torno de 50%. No corte de renda ocorreu algo muito parecido, com aumento na faixa até dois salários mínimos, estagnação de dois a cinco, queda leve de 5 a 10 e redução mais forte acima de dez mínimos, de 51% para 41%, numa variação relativa de cerca de 20%. O recorte regionalizado confirmou esse padrão, com estagnação nas regiões sul e sudeste, leve elevação no norte/centro-oeste e alta significativa no nordeste. Nesta última região, única em que houve vitória de Fernando Haddad, houve aumento de 17% para 24% dos eleitores, numa variação relativa de 41,17%. Vejamos se as próximas pesquisas manterão este padrão de comportamento do eleitorado.
VINICIUS DE CARVALHO ARAÚJO é administrador, professor, gestor governamental, doutorando em História e analista político.
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