Cuiabá, Quarta-Feira, 13 de Agosto de 2025
CASARÃO HISTÓRICO
07.02.2021 | 11h00 Tamanho do texto A- A+

Casal restaura imóvel de 150 anos no Porto: "Memória da infância"

Eles adquiriram o local e agora iniciam o processo de reforma respeitando as características originais

Manu Rigoni

Francisco Moura Junior, a esposa Lígia Maciel e os filhos

Francisco Moura Junior, a esposa Lígia Maciel e os filhos

BRUNA BARBOSA
DA REDAÇÃO

Quando criança, as roseiras e samambaias plantadas no jardim de um casarão na Rua São Joaquim, no Bairro Porto, em Cuiabá, já fascinavam a servidora pública Lígia Maciel, de 37 anos. Foram estas memórias afetivas que a encorajaram a mergulhar, com o marido Francisco Moura Júnior, 38, em um projeto de restauração do imóvel histórico centenário que ficou abandonado por mais de uma década.

 

As lembranças da infância eram de um lugar "vivo", onde a antiga proprietária, Dona Clarice Albuquerque, morava com os filhos e fazia festinhas de aniversário para os netos. A servidora se lembra do olhar curioso de quando, através do portão de ferro baixo, conseguia enxergar o quintal da casa ou ouvir o som do piano sendo tocado do lado de dentro.

 

Mas, no ano passado, quando foram revisitar o casarão, as paredes feitas com tijolos de adobe (mistura de terra, palha e água amassada com os pés) e os pisos de ladrilho hidráulico já eram palco de outros tipos de movimentação, bem diferente daquelas de Dona Clarice.

 

"Quando abrimos o portão foi chocante, porque foi horrível a primeira impressão que tivemos. A casa já estava fechada há uns 14 anos. Então era entulho para todo lado, muito lixo e sujeira. A casa serviu também de abrigo para pessoas em situação de rua, colocaram colchões, fizeram gambiarras e o mato era tão alto que tínhamos até medo de entrar. Na hora de ir embora pedi para o corretor para olharmos dentro da casa e ele ficou meio contrangido. Foi abrindo as portas e empurrando com força. Tinha resto de comida, fezes de cachorro". 

 

Lígia confessa que chegou a pensar em desistir do projeto que, frente às reformas que o casarão exigia, parecia muito ambicioso. O medo se desfez depois que ela e o marido colocaram na balança os benefícios do imóvel histórico.  

 

Manu Rigoni

CASARAO AZUL

Casal decidiu restaurar casarão que estava abandonado há 14 anos

Para a servidora pública, o olhar carinhoso da infância também foi um fator decisivo. Lígia sabia que o casarão tinha potencial para voltar a ser o imóvel apaixonante de suas memórias. 

 

Foi quando ela descobriu que restaurar um local de mais de 150 anos exigiria mais etapas do que ela havia imaginado. 

 

"A casa tem um terreno gigante, temos criança e cachorro, então o que mais gostamos é espaço. E lá teremos um espaço gigantesco, muito maior do que tínhamos imaginado. Dentro de uma semana assinamos o contrato e começamos uma outra etapa. Comecei a pensar: o que fazemos agora para ver se essa vai render?". 

 

Ela então decidiu entrar em contato com uma amiga arquiteta que mora em São Paulo, com experiência em patrimônio histórico e restauro, para saber se eles estavam no caminho certo adquirindo um imóvel centenário como o "Casa Azul", como a família o chama carinhosamente. 

 

Através da arquiteta, Lígia conseguiu chegar em um mestre de obras especialista em patrimônio histórico. Como o casarão é muito antigo, a reforma não pode acontecer de qualquer maneira, tudo precisa ser planejado para preservar as características históricas. 

 

Por conta do período em que ficou sem manutenção, o medo da servidora pública era de que alguma parte do imóvel corresse risco de desabar, por exemplo. 

 

Alguns pontos do casarão precisaram de intervenções urgentes, como escoras para evitar desabamentos e reparos no telhado por conta de infiltrações. 

 

Lígia também relata a dificuldade que teve para conseguir uma empresa que aceitasse limpar a casa, por conta da grande quantidade de lixo e entulho. Muitos desistiam quando viam a real situação.  

 

"Eles entravam e recusavam. Já estava na quinta ou sexta empresa quanto toparam. Foram seis caminhões de entulho. Não tinha como ser um 'bota fora', porque iam precisar de muitas caçambas. Trouxeram caminhões mesmo para poder carregar tudo. A arquiteta explicou que também não podiam jogar água na casa, porque ela é toda feita de adobe, então, se jogar água nas paredes elas podem absorver e desmanchar". 

 

Planejamento da obra 

 

Após a limpeza, os profissionais começaram a fase de planejamento, que deve perdurar durante todo o ano. O plano é que as obras comecem apenas no ano que vem e que Lígia e a família consigam se mudar para o casarão em 2023. 

 

Manu Rigoni

CASARAO AZUL

Pai de Lígia viu que casarão está à venda e tirou foto para a filha

 

A servidora conta que a arquitetura da casa tem características deixadas pelos anos que foram se passando. Alguns cômodos são coloniais enquanto outros foram construídos na década de 50 ou 60, onde o casarão já possui laje. 

 

Os profissionais responsáveis pelo projeto já identificaram, por exemplo, que todo o telhado está comprometido. Apesar das intervenções que serão inevitáveis, Lígia e o marido pretendem preservar o máximo possível da história do casarão. 

 

"Não queremos grandes alterações, a não ser as funcionais. Por exemplo, a casa não tem banheiro, o único que ela tem fica no corredor.  Vamos acrescentar uma garagem também. São coisas que vamos ter que fazer. Queremos manter o máximo possível, porque a casa é muito bonita e ela também é muito bem ventilada por dentro". 

 

Histórias do casarão 

 

Quando começaram a frequentar o imóvel para dar andamento no projeto do casarão, logo alguns vizinhos começaram a se aproximar de Lígia e do marido. Por serem idosos, alguns já haviam frequentado a casa de Dona Clarice em seus tempos áureos e também tinham fortes memórias afetivas para compartilhar. 

 

Uma das senhoras que conversou com Lígia, por exemplo, pediu para ver se ainda havia uma palmeira plantada no quintal do casarão e acabou se emocionando quando percebeu que a planta ainda estava lá. 

 

Uma das frequentadoras do saraus de Dona Clarice era a escritora, professora, musicista e historiadora, Maria Benedita Deschamps Rodrigues, a Dunga Rodrigues.

 

"São várias senhoras muito queridas. Elas pedem para entrar e ver por dentro, porque como estava fechado há muito tempo, elas ficam emocionadas. Dona Clarice gostava de arte, de música, colocou os netos para fazer aulas de música. Todo final de semana era obrigatório tocar música clássica. Tem foto de um piano antigo que ela tocava e ele foi se desintegrando. Pensamos em restaurar, mas o custo é muito alto". 

 

O imóvel não é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), mas Lígia ressalta que ela e a família pretendem zelar como se fosse, já que o casarão faz parte da História de Cuiabá e de Mato Grosso. A obra será feita com recursos próprios do casal. 

 

Com o casarão já limpo, Lígia e a família foram fotografados pelas lentes da fotógrafa Manu Rigoni. A ideia é que novas fotos sejam feitas quando a obra estiver pronta, em 2023.

 

"Conheço essa casa desde desde criança, tenho nela memórias de minha infância. Nunca imaginei que um dia ela podia ser nossa, é um sonho. Vamos fazer conforme as nossas possibilidades, é um investimento grande, mas é para a vida toda. Já programei um cômodo extra para nossa família, um cantinho para nossos pais. Estamos super animados".


Veja abaixo galeria de fotos feita pela fotógrafa Manu Rigoni:

  

 

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GALERIA DE FOTOS
Manu Rigoni/Reprodução

CASARAO AZUL

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CASARAO AZUL

Manu Rigoni/Repro

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COMENTÁRIOS
12 Comentário(s).

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Geysa Salgueiro  09.02.21 03h11
Fiquei bastante emocionada, estive em Cuiabá em dez/Jan e caminhando pela rua São Joaquim (onde mora minha família) deparei com o casarão, um impulso de vê-la restaurada me tomou, a música do piano de D Clarice pareciam ecoar ainda naquelas salas, comentei com minha irmã o meu desejo de que alguém com amorosidade pudesse restaura-la e assim foi . Gratidão❤️Tinha muitas roseiras naquele jardim...
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Paulo  08.02.21 14h35
Se o imóvel for tombado pelo patrimônio histórico o sonho vai virar pesadelo. Tanta burocracia e órgãos como secretaria de cultura e Iphan (tecnocratas) que a obra terá o triplo do valor orçado. O incentivo a esse tipo de iniciativa por parte dos governos é zero. Boa sorte e paciência!
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Admirador da História  08.02.21 09h12
Meus mais sinceros Parabéns pela maravilhosa iniciativa de restaurar uma preciosidade da história de Mato Grosso. Que o belo exemplo esse do afortunado casal e que possa contagiar outros casais contribuindo para preservação da memória e da beleza arquitetônica que nossa cidade oferece. Com certeza voltara a ser um local de muitas alegrias e felicidades.
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Marcos Luiz Negrisoli da Silveira  08.02.21 04h21
Vi esse casarao maravilhoso abandonado (sugeri para minha medica montar uma clinica nele) mas pensei que fosse tombado pelo patrimonio historico, o que justificaria o abandono. Mas nao, parabens aos donos pela iniciativa e que outros se animem a fazer o mesmo.
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Laurença  08.02.21 01h07
Emocionada com o amor desse casal pelo casarão. Tia Clarice, era uma prima da minha mãe, tinha uma casa lindíssima, e de onde estiver, deve estar muito feliz por essa história ter tido um final feliz!
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