Cuiabá, Domingo, 12 de Outubro de 2025
FAIXA DE GAZA
12.10.2025 | 09h30 Tamanho do texto A- A+

“Cessar-fogo é o desejo diante do massacre”, diz cuiabano na guerra

Ahmad Jarrah documentou resquícios do conflito, falou sobre refugiados e tensão no Oriente Médio

Arquivo pessoal

Tanques da ONU passando em Dibbine, no sul do Líbano

Tanques da ONU passando em Dibbine, no sul do Líbano

ANGÉLICA CALLEJAS
DA REDAÇÃO

Após dois anos de conflito, as tratativas de cessar-fogo entre Israel e o Hamas para a Faixa de Gaza ganham corpo e trazem esperança à comunidade muçulmana, que vê no acordo uma chance de interromper o que chamam de “genocídio televisionado”.

 

Na hora que cheguei no aeroporto, embarquei pra ir pro vilarejo dos meus pais, a gente passou por prédios bombardeados. É uma cena muito impactante, a destruição provocada pelas bombas em áreas civis, densamente povoadas

O fotógrafo documental de Cuiabá Ahmad Jarrah, descendente de libaneses, acompanhou de perto os reflexos do conflito durante uma viagem recente ao Líbano, país que, apesar de não ser o principal alvo dos ataques israelenses, tem sentido os impactos da guerra, especialmente na região sul e na capital, Beirute.

 

“Quando eu saí do Líbano no ano passado, caiu a primeira bomba em Beirute. E de lá pra cá, o Líbano sofreu muito com ataques, principalmente o sul do país, não só o sul. Beirute mesmo foi muito atacado, muitos prédios destruídos”, contou Ahmad.

 

“Na hora que cheguei no aeroporto, embarquei para ir para o vilarejo dos meus pais, a gente passou por prédios bombardeados. É uma cena muito impactante, a destruição provocada pelas bombas em áreas civis, densamente povoadas".

 

O fotógrafo, que ficou 36 dias no país, entre julho e agosto deste ano, registrou cenas da movimentação de tanques e veículos da Organização das Nações Unidas (ONU) em Dibbine, uma das cidades afetadas pelos ataques. “Houve explosões no Vale do Beca. Dava pra ver a coluna de fumaça subindo no horizonte, exatamente onde foi o ataque”, disse.

 

Refugiados

 

Segundo Ahmad, o Líbano é o país com maior número proporcional de refugiados do mundo. “De cinco pessoas, uma é libanesa e quatro são refugiados. Desde 1948, com a Guerra da Palestina, muitos palestinos migraram pro Líbano. Depois veio a guerra da Síria, e hoje há refugiados sírios e palestinos espalhados por todas as cidades”, afirmou.

 

Sobre as negociações de cessar-fogo, Ahmad diz que a comunidade muçulmana tem acompanhado com esperança, mas também com cautela. “Todos nós estamos vendo como algo muito esperado. Na verdade, já estamos pedindo isso há muito tempo. Só que é importante dizer que isso não é uma guerra. Guerra é quando duas nações constituídas, com exércitos, se enfrentam. A Palestina não tem exército. Por isso, é um massacre, um genocídio.”

 

Para ele, o conflito é assimétrico e desumano. “É uma situação dramática, humanitária, que precisa ser interrompida. Já houve outras tentativas de acordo de paz, mas constantemente são violadas. Inclusive o Líbano, que tem acordo de cessar-fogo com Israel, sofre ataques até hoje. Se não me engano, são mais de 160 quebras de cessar-fogo desde a assinatura”, relatou.

 

Ahmad acredita que a interrupção do ciclo de violência só será possível com o reconhecimento internacional da Palestina como Estado, mas acredita que há um caráter político nas movimentações recentes do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu.

 

Ahmad Jarrah

beirute, líbano

Uma das fotografias que Ahmad tirou em Beirute, mostra um prédio destruído por bombardeio israelense

“A gente acredita que a interrupção desse ciclo só vai vir com o reconhecimento do Estado da Palestina, com a autodeterminação do povo palestino e a formação de um governo eleito por eles, democrático. Mas Israel sempre recusou os acordos de cessar-fogo apresentados até hoje. Essa é a primeira vez que aceita, e muito provavelmente por pressão externa”, avaliou.

 

"Genocídio televisionado"

 

Apesar disso, o fotojornalista disse que, mesmo que o cessar-fogo seja parcial ou temporário, ele pode aliviar o sofrimento da população. “A gente não confia totalmente nas instituições, mas é importante pra diminuir a dor das pessoas que estão lá, que precisam de atendimento médico, alimento, um minuto de paz. É uma população submetida à fome e à tortura. É um genocídio televisionado que a gente tem visto há dois anos”, declarou.

 

Ahmad, ainda, ressaltou a diferença do posicionamento político e do religioso, no sentido de que as críticas são endereçadas ao primeiro-ministro de Israel, e não aos judeus.

 

“A nossa crítica é à política sionista encabeçada pelo Netanyahu, e não ao judaísmo. São religiões irmãs: o islamismo, o judaísmo e o cristianismo. Historicamente, esses três povos convivem naquele território. O que criticamos é o processo colonial da Palestina”, explicou.

 

Durante sua estadia no Líbano, Ahmad viajou com o filho e relatou momentos de tensão em estradas destruídas por bombardeios. “A gente saiu de carro pra visitar a cidade de Tiro, mas um caminhão tombou na estrada e tivemos que pegar outro caminho, passando por vilarejos bombardeados. Eu olhei pro meu filho e perguntei se ele estava com medo. Ele respondeu: ‘Não, eu quero conhecer’. Aí fiquei mais confiante”, lembrou.

 

Território ocupado

 

O fotógrafo conta que chegou próximo à fronteira com a Palestina ocupada, região onde o cenário dos ataques são mais chocantes. “Dava pra ver os territórios ocupados. Desci do carro, fiz umas fotos e retornamos. Não conseguimos chegar até Tiro porque já estava tarde, mas foi uma honra estar ali, poder ver o território palestino e sonhar com uma Palestina livre”, disse.

 

“É importante pra abertura de corredores humanitários, pra chegada de comida, de água, e pra pensar na reconstrução das casas e do país. A resolução mesmo será o reconhecimento e a instalação de um governo palestino, eleito por palestinos”, afirmou.

 

Para Ahmad, seu desejo se junta ao de milhões de muçulmanos, que sonham não só com fim dos ataques ao povo palestino, mas também que o Estado da Palestina seja reconhecido pelos demais países. “O que a gente quer é o reconhecimento do Estado da Palestina, com autonomia e autodeterminação do povo palestino.”

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