Depois da madrugada do dia 4 de junho de 2011 a vida de Aryane Rabelo nunca mais foi a mesma. Naquela data, ela, o marido e a filha de apenas 59 dias sofreram um trágico acidente no Portão do Inferno.
A cuiabana foi única sobrevivente da queda de 75 metros de altura, que ocorreu durante uma viagem em família que tinha tudo para dar certo. Não há registro de que alguma outra pessoa tenha saído viva depois de cair do abismo.
Em entevista ao MidiaNews, Aryane conta que o então marido, Wilson de Souza Silva, trabalhava com transporte de galões de água e, por isso, já era um costume que ela o acompanhasse nos trajetos feitos em sua carreta amarela.
No dia do acidente não foi diferente. Wilson tinha uma entrega marcada para fazer em Chapada dos Guimarães e resolveu chamar a esposa para ir junto, já que desde o oitavo mês de gestação Aryane não conseguia ir nas viagens de caminhão pelo estágio da gravidez.
O plano era que toda família pegasse a estrada, incluindo a filha do casal e Gabryel, filho apenas dela. No entanto, o mais velho naquele dia resolveu não ir e ficou aos cuidados da tia de sua mãe, Lucione.
Umas das poucas memórias que Aryane tem do dia do acidente são dos preparativos antes da família sair de casa, em Cuiabá. Ela descreve que acordou com Wilson antes do Sol nascer e começou a arrumar a bolsa da bebê com todos os utensílios necessários para uma recém-nascida. “Foi a primeira viagem com a bebê e também a última”, lembra.
Na sequência ela e o marido se arrumaram e logo saíram de casa. Ao chegar na curva a beira do Portão do Inferno, por algum motivo, Wilson não conseguiu completar a manobra.
Os detalhes exatos do que ocorreu naquele momento ainda são um mistério, mas fato é que o caminhão que levava a família passou direto da curva estreita e se chocou com a barreira de proteção que impedia a queda livre do caminhão.
O concreto não resistiu ao impacto e Wilson, Aryane e a pequena Samyra mergulharam direto no precipício, sem qualquer chance de evitar o impacto de deveria ser fatal para todos.
A única sobrevivente
Sempre muito devota a Deus, Aryane caracteriza o fato de ter sobrevivido como um “milagre”. Apesar de não se lembrar de nada, ela conta aquilo que ouviu dos bombeiros que fizeram seu resgate na manhã daquele sábado.
O caminhão da família ficou destruído e dezenas de garrafões d’água ficaram espalhadas em meio à vegetação.
Wilson, que dirigia o caminhão, ficou preso às ferragens e morreu na hora. Já Aryane e a filha do casal foram arremessadas para fora da carreta.
Arquivo Pessoal
Aryane e a filha Samyra, que havia acabado de nascer
“Eu e a bebê ficamos soterradas, a terra do barranco caiu em cima da gente e a bebê ficou só com a perninha para fora da terra. Eles [bombeiros] acharam que era um brinquedo”, lembra.
Infelizmente Samyra também morreu após a queda, porém Aryane ainda lutava pela vida. Descrevendo-o como um anjo, ela conta que o resgate dos bombeiros só chegou rápido no local porque um andarilho, que morava naquela área do precipício, ouviu o estrondo da barreira quebrando e, ao sair para verificar, viu o trágico acidente.
Ele também pensava que todos haviam morrido, porém relatou que ouviu gemidos vindos de Aryane e percebeu que havia pelo menos uma sobrevivente. Logo equipes dos bombeiros, da Polícia Militar e um helicóptero da Ciopaer chegaram ao local.
A cuiabana estava com o corpo soterrado assim como a filha, mas ainda mantinha o nariz, os olhos e boca para fora da terra do barranco. O fato dela ainda estar viva foi uma surpresa e tanto para os bombeiros. “Nunca sobreviveu ninguém ali”.
Batalha por uma vida
Por se tratar de uma área remota, os bombeiros precisaram içar o corpo de Aryane de rapel. Imagens feitas na época do acidente registraram que diversas pessoas ajudaram na tarefa dos militares de puxar a cuiabana.
A gravidade do acidente deixou marcas em todo o corpo de Aryane, que sofreu três fraturas expostas, além de traumatismo craniano, uma lesão na coluna e na perna. Ela passou 17 dias em coma e precisou ficar 64 dias internada.
Sua segunda luta pela vida foi ainda mais complicada e Aryane conta que todos pensavam que ela não seria capaz de superar todos os traumas. Ela conta que durante boa parte do tratamento passou sedada e a base de morfina.
“Eu fiquei em um estado irreconhecível. Minha cabeça ficou muito grande, fiquei muito inchada. Eu trinquei todo o meu corpo, desde o dedinho, tudo ficou trincado”, explica.
Superando as expectativas dos médicos e da família, após meses internada Aryane conseguiu se recuperar e recebeu alta. Ela precisou ficar nove meses em uma cadeira de rodas e, após muitas sessões de fisioterapia, voltou a andar.
Arquivo Pessoal
Aryane e o então marido, Wilson, que dirigia o caminhão
As sequelas físicas e psicológicas ainda são presentes. Além das dores constantes no corpo, Aryane segue fazendo acompanhamento com um psicólogo e afirma que tanto ela, quanto o filho Gabryel nunca conseguiram esquecer aquele 4 de junho que levou parte de sua família.
Uma vida reconstruída
Após sua recuperação, a cuiabana ainda precisou passar muitas vezes pelo local em que sofreu seu trágico acidente enquanto ia até a delegacia de Chapada prestar depoimentos. Foi apenas quatro anos após a tragédia que ela conseguiu parar no Portão do Inferno para observar o ponto onde caiu.
“Até hoje é uma mistura de sentimentos. Lembrança das perdas que tive, sensação de medo, mas também de gratidão a Deus”, descreve.
Hoje Aryane conseguiu reconstruiu sua vida, casou-se novamente com Rogério Trouy, que ela descreve como “companheiro e amoroso”, com quem ela teve sua terceira filha, Ester.
Após 10 anos, Aryane consegue viver feliz, mas sempre gosta de manter viva a memória de Wilson e de Samyra e dos bons momentos que teve com a antiga família.
Convivendo com problemas de perda da memória recente, devido ao traumatismo que sofreu na cabeça, Aryane garante que as boas lembranças antigas nunca serão apagadas.
“A lição que fica é que devemos amar e cuidar dos nossos, pois não sabemos quando iremos partir”, finaliza.
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2 Comentário(s).
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Miro Ribeiro 16.08.21 07h57 | ||||
Parabéns pela reportagem. Sou jornalista e á época trabalhava na TV Rondon - SBT/Cuiabá. Eu e minha esposa estávamos em Chapada dos Guimarães naquela manhã de sábado. E então decidimos fazer um registro do que sobrou do caminhão naquela ribanceira. Com uma câmera amadora, áudio ambiente(sem microfone) e instinto de repórter relatei o triste acontecimento. Minha esposa foi a cinegrafista. Caso queiram ver; este é o link https://www.youtube.com/watch?v=vW2dv8e9kc0 | ||||
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Daniel 15.08.21 22h06 | ||||
História linda!!! Parabéns pela sua nova família e por compartilhar conosco. | ||||
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