Especial Ana Maria do Couto

Ana Maria do Couto, mais conhecida em sua época como May, até hoje é lembrada pelo pioneirismo e coragem. De atleta a advogada de destaque, ela deixou marcas na cultura e política cuiabana. O que muitos não tiveram a oportunidade de saber é que conviver com essa personalidade era mais do que uma inspiração, era um aprendizado de vida diário.
May morreu há exatos 50 anos, em 17 de outubro de 1971 - um domingo como hoje - vítima de um câncer no estômago, deixando um legado de conquistas em seus 46 anos de vida.
Sua sobrinha, a astrônoma Telma Cenira Couto da Silva, 64 anos, guarda preciosas lembranças de uma mulher que antes de ser quem foi para a cidade, era a sua tia querida.
“Eu tinha uma adoração por ela, não só pelo que as pessoas acham e pelo que ela representa para a cidade; não, é pelo que ela significou pra mim”, conta Telma.
“Quando chegava outubro era uma tristeza. Outubro significava o mês que tia May morreu”, conta Telma, que tinha 14 anos quando a tia se foi. Apesar da pouca idade, ela se lembra com detalhes desse dia que a marcou para sempre. Ela foi a última pessoa a segurar as mãos de May antes da sua partida.
Para a família, a doença de Ana Maria do Couto era quase que um tabu. Após o diagnóstico - dois anos antes de sua morte -, não se falava sobre o assunto. Nem sequer a própria May soube qual era a sua doença no início.
Uns falavam que ela tinha bico de papagaio - deformidade que surge na coluna -, outros que era um problema no estômago. Fato é que na reta final, May piorou rapidamente. Ela foi internada na Santa Casa da Misericórdia, cerca de dois dias depois do seu último aniversário - em 13 de setembro -, de onde não saiu com vida.
Reprodução
Ana Maria do Couto em foto de formatura
Fonte de inspiração e lições
A cuiabana Ana Maria do Couto teve uma participação fundamental na história de Mato Grosso. Ela foi professora de Educação Física concursada pela UFMT e primeira esportista mato-grossense a vencer uma competição fora do Estado.
Foi advogada e em meados de 1950 entrou para a área da comunicação, atuando como radialista e apresentadora de televisão. Também se destacou na política, como vereadora e presidente da Câmara Municipal de Cuiabá.
Ela também foi eleita presidente do Clube Esportivo Dom Bosco em 1970.
Para muito além de uma profissional que deixou seu nome gravado para a posteridade, May deixou marcas nas pessoas. Telma se lembra com clareza das lições recebidas da tia.
Como no dia em que aceitou um picolé de graça de uma pessoa à qual May havia ajudado. Quando a criança contou para a tia sobre o presente, foi repreendida. Ela não poderia ter aceitado o presente de alguém que tirava daquilo o seu sustento. “Ele pode deixar de levar dinheiro pros filhos com o picolé à venda”, Telma relembra o que a tia disse.
Em outra ocasião, a jovem pediu dinheiro para ir ao cinema e em troca recebeu uma lição. “Você não tem que pedir dinheiro, você tem que oferecer trabalho”, disse May. Aquilo nunca lhe saiu da cabeça e com o dinheiro economizado de pequenos trabalhos feitos por ela, com seu próprio dinheiro comprou o seu primeiro sutiã.
O dia da morte
Telma visitava a tia constantemente na unidade de saúde, no início, sem saber que o caso dela era irreversível. Foi só na véspera da morte de May que a jovem foi alertada por uma freira que era preciso se preparar para a perda: “Olha, você se prepara que a sua tia vai morrer”.
Alair Ribeiro/MidiaNews
Casarão em que morou Ana Maria do Couto
Assustada, Telma perguntou como ela poderia saber disso. Em resposta, recebeu um assustador: “Ela já está com a afeição da morte”. A freira ainda teria dito que May morreria até o dia seguinte.
Ela ficou no hospital até às 21h de sábado. Em casa, disse aos pais que apenas tinha voltado para dormir. Pediu para ser acordada bem cedo, antes do dia raiar, para voltar ao hospital.
Para sua surpresa, os pais não a acordaram e foram ao hospital sem ela. “Me lembro que eu acordei com o dia claro, com o som dos sinos chamando para a missa”, relembra. Como não encontrou os pais, ela apenas tomou um copo de leite, trocou de roupa e correu a ladeira que dá acesso à Santa Casa.
Quando Telma chegou, a sala estava cheia de amigos e parentes ao redor. Ela pegou nas mãos de May, as apertou e em menos de 5 minutos a tia morreu. “Eu não falava, mas pensava: ‘Força tia May, Força tia May”, diz ela emocionada. “Parecia que ela estava me esperando”.
As lendas e crendices populares
Uma das histórias mais emblemáticas e talvez mais populares contadas sobre Ana Maria do Couto, que é lembrada até hoje, é a do "casarão assombrado".
A casa de dois andares - que não preserva a estrutura original - fica entre as ruas Diogo Domingos Ferreira e Manoel Garcia Velho, no Bairro Bandeirantes.
Foi construída por May, mas ela mesmo morou lá por pouquíssimo tempo. “Isso é o que as pessoas não sabem”, diz Telma.
Segundo ela, a maior parte dos móveis encomendados chegaram um mês depois da morte de May. Antes disso, ela morava com a mãe, dona Chiquita, e uma tia, Dona Nenê, em uma casa - “com um quintal enorme”, recorda Telma - no centro da Cidade. May nunca se casou e nem teve filhos.
A história da casa assombrada, repudiada por boa parte da família, teria tido início após a morte de May. “Tem parente que não gosta da história, se sente ofendido com isso. Mas na minha visão essa história da casa assombrada ajudou a manter o mito dela”, explica Telma.
Chiquita ficou desolada com a perda da filha e se fechou para o mundo em uma bolha de dor e sofrimento. “Foi um drama familiar, foi muito difícil”, relembra. Ela dizia que se quem construiu a casa não aproveitou, ninguém mais iria.
Ela não acendia as luzes da casa - exceto em caso de necessidade - e sempre colocava para “rodar” o último discurso de May feito para o ex-governador de Mato Grosso, Pedro Pedrossian. A voz de May, já falecida, vindo de dentro de uma casa às escuras assustava muita gente, o que deu início à fama de casarão assombrado.
“Poxa, alguém passa no escuro e escuta a tia May falando vai achar o que? Vai correr”, recorda Telma.
Entre no grupo do MidiaNews no WhatsApp e receba notícias em tempo real (CLIQUE AQUI).
3 Comentário(s).
|
Pedro 02.06.24 15h47 | ||||
Vim de fora a muito tempo...mas ouvi falar muito dela , e a achava muito bonita, bom saber agora a história inteira, lendo sobre ela, da pra sentir uma luz muito forte vinda do céu. | ||||
|
CELSO 18.10.21 09h46 | ||||
Ela era muito linda. | ||||
|
Jeves Bejame 17.10.21 21h47 | ||||
Eu já conhecia a história, mas não com riqueza de detalhes. Valeu!!! Mídianews. | ||||
|