Cuiabá, Domingo, 17 de Agosto de 2025
FACÇÕES ESTUDANTIS
17.08.2025 | 10h00 Tamanho do texto A- A+

Professores veem avanço da violência e relatam medo em sala

Jovens reproduzem comportamento que veem nas mídias ou no contexto em que vivem

Reprodução

A tortura praticada contra uma estudante na escola Carlos Hugueney, em Alto Araguaia

A tortura praticada contra uma estudante na escola Carlos Hugueney, em Alto Araguaia

LARISSA AZEVEDO
DA REDAÇÃO

Casos de violência em escolas de Mato Grosso têm ocupado grande espaço na imprensa nos últimos meses, com diversos tipos de agressões entre estudantes dentro ou fora das escolas. O episódio do ataque a uma adolescente por colegas que imitavam uma facção criminosa, no último dia 4 em Alto Araguaia, foi o que teve maior repercussão.

Foi muito alarmante, Ela chegou a gritar, fazer gritaria, a utilizar xingamentos para mim, foi bem complicado

 

Outras situações, como a tentativa de atear fogo em uma adolescente de 13 anos por intolerância religiosa, em Várzea Grande, e o espancamento de outro, de 15, dentro do banheiro de uma escola de Cuiabá, por sete colegas, são exemplos do cenário em que a violência se propaga, de acordo com os professores. 

 

O MidiaNews conversou com professores para entender esse fenômeno que preocupa pais em todo o Brasil. 

 

A professora de Geografia Kely Carvalho dá aula desde 2012. Ela conta que já presenciou diversas situações de violência e risco a outros estudantes e até mesmo aos próprios professores, que também sofrem ameaças. 

 

A professora já foi alertada pelos próprios alunos em relação a possíveis riscos que correu. 

 

“Já me disseram: ‘Fulano já falou que não gosta da senhora e a gente sabe que fulano é namorado de ciclano, que é…’ Como que eu posso dizer? Não é aluno, não é trabalhador, não é uma pessoa honrada. E aí a gente para, reflete, ora e volta a trabalhar”, diz. 

 

Apesar disso, a professora destaca que nunca chegou a passar pelas vias de fato da violência, mas presenciou colegas sofrendo ameaças e até agressões nas escolas em que já trabalhou. Ela fala sobre o caso de uma aluna que chegou a puxar o cabelo de uma professora, que ficou tão abalada que saiu da unidade.  

 

Outra professora, que não quis se identificar, dá aula na área de linguagens a estudantes de escolas públicas desde 2018, e também já foi ameaçada e agredida verbalmente por uma aluna. 

 

“Foi muito alarmante. Ela chegou a gritar, fazer gritaria, a utilizar xingamentos para mim, foi bem complicado”, relata. 

 

Casos como este, de acordo com a profissional, têm avançado muito, não só dentro da escola. “Eles criam até grupos entre eles para definir formas agressivas de marcar as lutas em ruas, em bairros. Aquela questão toda da violência que às vezes é gerada dentro da própria escola e vai progredindo, vai avançando”, explica. 

 

Kely percebe a reprodução de comportamentos vistos em pessoas com quem os estudantes convivem ou assistem na mídia. 

 

“Estão reproduzindo muitas coisas que vêm lá fora. Por isso que nós, profissionais das redes pública e privada, quando essa violência chega ao nosso conhecimento, fazemos reuniões e tentamos refletir a melhor forma possível para que isso não chegue nas unidades onde nós estamos. É difícil porque isso é uma questão comportamental”, diz a professora que não quer se identificar. 

 

A profissional também afirma que mesmo alunos que dizem pertencer a facções ou grupos criminosos muitas vezes não o são de fato.

 

"Às vezes eles usam o nome da facção porque ela está ali na redondeza onde ele mora. Às vezes nem é isso, eles estão envolvidos com aquela coisa que viraliza. Eles falam que têm um grupo, mas às vezes é modismo. Várias vezes esse estudante nem está envolvido com coisa de facção", afirma.

 

Interferência na educação 

 

As professoras afirmam que este tipo de cenário influencia não apenas as pessoas que estão diretamente envolvidas nas agressões, mas todo o ambiente educacional. “Infelizmente, muitos colegas ficam mais apagando o fogo para conseguir dar aula, o que atrapalha ministrar a sua aula com qualidade”, afirma Kely. 

 

“A gente tem que ter mais o jogo de cintura do que, praticamente, lidar com o conteúdo em sala de aula. Porque ao se deparar com alunos violentos já em sala de aula, você tem que evitar possíveis causas e consequências. E isso atrapalha muito, muito. A gente não consegue desenvolver, nem atrair o aluno para a prática de sala de aula”, diz a professora de linguagens. 

  

O tripé 

 

Para evitar o aumento da violência nas escolas, Kely afirma que a educação precisa ser apoiada pelo tripé "aluno, instituição e família". Ela destaca que o aluno deve querer aprender, mas a sua educação não depende apenas de seu esforço, mas também da colaboração de sua família e da instituição de ensino, que precisam apoiar e promover um ambiente seguro para os jovens. 

 

Ambas as professoras destacam que a participação da família é fundamental, pois muitos comportamentos e problemas dos alunos vêm da própria casa. 

 

Além disso, elas acreditam ser necessário mais acolhimento e acompanhamento psicossocial por parte das instituições públicas, tanto em relação aos alunos quanto aos professores, que também são afetados em muitos casos. 

 

Elas ainda relatam sobre como a infraestrutura das escolas pode mudar o comportamento dos alunos, dando o exemplo das cívico-militares, que possuem mais funcionários de pátio e maior apoio aos professores para ministrar as aulas, o que reduz o índice de violência em sala de aula. 

 

Além disso, os estudantes ainda são jovens e têm o direito de receber educação e apoio para que mudem comportamentos violentos, como ressaltam as professoras. 

 

“Às vezes, é falta de um diálogo, de uma escuta, de um acompanhamento. São vários fatores. E o estudante é vulnerável, tem pessoas boas, tem alunos bons, mas no meio deles acaba tendo a violência”, finalizou a linguista.

 

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