Servidora transforma obra sobre mãe e filha em peça teatral

Fascinada pela complexidade das relações humanas, a servidora pública e dramaturga Flávia Pires se inspirou na relação distante baseada no desejo de afeto entre mãe e filha para construir sua nova obra: "Memória Alice Realidade Rosa", que se prepara para virar peça de teatro.

Lançada no início de 2025, a obra foi escrita pela primeira vez há cerca de 12 anos, originalmente com o intuito de se tornar uma peça de teatro. Nela, a personagem Alice reconstrói, por meio da memória e da imaginação, a relação com sua mãe, Rosa.

Existem relações em nossas vidas que são tão perenes ou tão importantes quanto e que a gente não se debruça sobre elas

“Esse texto ficou guardado por 12 anos. No final do ano passado, encontrei um ator e disse: ‘Olha, tenho uma peça de teatro que escrevi’. A pessoa pediu para ver a peça, mas eu não a encontrei”, relata a escritora.

Com o passar dos anos, a história foi sendo deixada de lado, até que, ao conversar com um amigo, Flávia decidiu retomar o projeto. No entanto, diante da perda do caderno com o rascunho original, ela optou por reescrevê-la.

Foi então que a autora recriou a trajetória de Alice com uma visão mais amadurecida, agora em formato de livro. A narrativa ganhou um tom poético e passou a abordar quatro personagens simbólicos: Rosa, Alice, a Realidade e a Memória.

Escrito de forma sensível e lírica, o livro apresenta uma narrativa afetiva que existe apenas no universo interno de Alice.

“A mãe dela era viva. Elas tiveram um relacionamento conturbado, mas a mãe não tinha tempo para ser mãe, porque trabalhava demais. E aí, a Alice é capaz de olhar para a mãe com olhos de amor e perdão. Então, cria vivências que não aconteceram, mas que ela gostaria de ter vivido com a mãe”, explica Flávia.

Ao MidiaNews, a autora contou que a história foi inspirada em vivências de pessoas próximas a ela e na complexidade da vida cotidiana, onde o anseio por afeto pode confundir memórias com desejos.

“A peça faz essa provocação: se você realmente está vendo a pessoa com uma verdade ou com um olhar mais colorido. E também se pergunta se as coisas que você se lembra de fato aconteceram”, afirma.

Embora esse tipo de paradoxo seja geralmente associado à vida amorosa, Flávia destaca seu interesse em explorar outras formas de relação.

“Eu presto atenção nas relações que não necessariamente são amorosas — de homem e mulher, mulher e mulher, homem e homem. Eu não presto tanta atenção nessas relações porque acho que elas já são mais contadas e problematizadas.”

Reprodução

Capa do livro Memória Alice Realidade Rosa

“Mas existem relações em nossas vidas que são tão perenes ou tão importantes quanto e que a gente não se debruça sobre elas, como as relações familiares, as relações de amizade. Acho que essas relações fazem muito parte da nossa construção humana".

Apesar do lançamento recente, Flávia conta que recebeu feedbacks positivos de seus leitores, que se veem refletidos nas figuras de Alice e Rosa, e nas dinâmicas familiares representadas na obra.

Para ela, o livro funciona como um espelho, capaz de provocar no leitor reflexões sobre suas próprias vivências e também sobre os caminhos emocionais trilhados por Alice.

“Acho que as pessoas demoram muito tempo para descobrir quem elas são, dissociadas de onde vieram. E essa dificuldade faz, às vezes, a gente tomar decisões na vida apenas para obter aprovação da família do pai ou da mãe, tentando agradar todo mundo, menos a si mesmo.”

Com o sucesso da obra, "Memória Alice Realidade Rosa", que nasceu como peça, virou livro e agora se prepara para sua estreia aos palcos.

Segundo Flávia, diante do bom desempenho da publicação e da importância do tema, a peça está em processo de produção para ser encenada no Teatro Zulmira Canavarros.

“Essa peça vai acontecer no Zulmira Canavarros. Ainda não tem data, porque está tramitando uma emenda parlamentar do deputado Lúdio Cabral”, conclui.

Apesar da peça em andamento, Flávia já planeja seu próximo trabalho, que irá abordar a história de importantes mulheres mato-grossenses, como Mãe Bonifácia, Maria Taquara e Teresa de Benguela.

O livro está a venda e pode ser adquirido por meio das redes sociais de Flávia: @flaviapiresmt/