Cuiabá, Quarta-Feira, 16 de Julho de 2025
COVID AMEAÇA
15.01.2022 | 19h22 Tamanho do texto A- A+

"Temo perdermos controle e virar outro caos, outra calamidade"

Médico infectologista alerta para riscos de relaxamento da população em meio à terceira onda da Covid

Arquivo Pessoal

Francisco Kennedy, de 41 anos, é médico infectologista

Francisco Kennedy, de 41 anos, é médico infectologista

LIZ BRUNETTO
DA REDAÇÃO

Diante do aumento expressivo no número de novos casos da Covid e o surto gripal Influenza, o médico infectologista Francisco Kennedy de 41 anos, afirmou que teme uma nova situação de caos e calamidade pública no setor da saúde em Mato Grosso.

 

De acordo com o especialista, a população tem subestimado as duas doenças agindo como se não estivessem em meio a uma pandemia, que se alastra ao longo de 2 anos. Promovendo aglomerações de toda ordem, as pessoas têm relaxado com medidas de biossegurança e colocado a si e aos demais em risco.

 

“Com a velocidade do aumento no número de novos casos, tenho muito medo de perdermos o controle e virar outro caos, outra situação de calamidade”, disse o especialista em entrevista ao MidiaNews.

 

Segundo Kennedy, a falta de exames laboratoriais para um diagnóstico preciso é outro ponto de alerta. Nesse cenário, os médicos seriam obrigados a tratar seus pacientes de forma empírica, ou seja, apenas pela observação dos sintomas.

 

Ainda na entrevista, o infectologista falou sobre a similaridade entre os sintomas da Covid e a gripe influenza, a atual situação preocupante das unidades de saúde em meio às duas doenças. Falou também sobre as suas percepções quanto à nova variante, Ômicron, e o comportamento da população diante do atual cenário pandêmico.

 

Leia os principais trechos da entrevista: 

 

MidiaNews – Ao que parece, a população baixou a guarda neste final de ano e subestimou a nova variante Ômicron, com muita gente sendo contaminada nas festas. Qual a gravidade desse novo momento em relação à contaminação da Covid?

 

Francisco Kennedy – A gente observa um aumento muito grande do número de casos, tanto de Covid quanto de influenza, pelo H3N2. A mortalidade está baixa, porém com a Covid não se pode brincar. O número de casos está aumentando e fico com muito receio do aumento no número de óbitos também.

O quadro clínico dessa nova variante da Covid é possivelmente mais brando, mas é cedo para a gente fazer essa análise. O contágio está muito grande, com muitas pessoas ficando infectadas

  

Se fizermos uma análise do número de casos no Brasil o aumento foi expressivo. Eram menos de 10 mil casos por dia. Só ontem [11 de janeiro] foram mais de 73 mil casos. Olha o perigo!

 

Na prática, em Mato Grosso, aumentou muito o número de casos. Ontem fui a um hospital privado e estava lotado. Com esse aumento, às vezes, eles não estão conseguindo fazer o diagnóstico etiológico, para saber se é gripe ou Covid. Lembrando que estão faltando Kits [para testar as duas doenças] nos laboratórios. 

 

Não posso afirmar que isso esteja acontecendo, mas talvez haja uma subnotificação dos casos porque, na prática, está uma loucura. São muitos casos de síndrome gripal, muitos, tanto na rede privada como na pública.

 

MidiaNews – Acha que muitos estão levando os riscos e a doença na brincadeira?

 

Francisco Kennedy – Muitos estão subestimando as doenças, não evitando as aglomerações, não usando máscaras adequadamente e não higienizando as mãos, porque além da Covid tem a influenza. As famílias estão se aglomerando, amigos e colegas se aglomeram em bares, em jogos de futebol, em festas, não estão respeitando.

 

MidiaNews – Muito se falou que a variante Ômicron é mais branda que as outras, embora mais contagiosa. Qual a realidade sobre essa variante. Ela pode causar mortes? As pessoas estão conscientes deste risco?

 

Francisco Kennedy – A minha leitura é a seguinte: o quadro clínico dessa nova variante da Covid é possivelmente mais brando, mas é cedo para a gente fazer essa análise. O contágio está muito grande, com muitas pessoas ficando infectadas. Até o momento apresenta um quadro clínico mais brando, mas têm pessoas sendo internadas. A mortalidade está baixa, mas também é cedo para definir isso.

 

Os pacientes têm reclamado de muita dor de garganta e musculares, além de mal-estar, que pode ou não vir acompanhado de coriza, obstrução nasal e espirros. O correto é fazer o exame.

 

Acredito que as pessoas têm ciência da gravidade, porém elas não valorizam, elas subestimam a doença.

 

MidiaNews – No seu dia a dia como médico, o que tem notado de diferente nesta nova onda de Covid em relação às anteriores?

 

Francisco Kennedy – Estou observando que tem havido uma dificuldade no diagnóstico etiológico. Em vários hospitais, os pacientes se internam com síndrome gripal e às vezes vão para a UTI sem um diagnóstico preciso, sem saber se é Covid ou influenza. Acredito que possa não estar havendo o diagnóstico desses casos mais graves, aí é claro que tem um viés na estatística.

 

Pedi o exame de Swab nasal, tanto da Covid quanto da influenza para uma paciente internada com síndrome gripal. O laboratório me falou: ‘Ainda bem que o senhor veio aqui pedir, porque já está acabando e os fornecedores não têm mais para enviar’.

 

A falta desse exame vai fazer com que os médicos tratem os pacientes empiricamente, não vai ter aquela certeza. Lembrando que em caso de gripe, influenza, se você entrar com o remédio chamado oseltamivir (nome comercial tamiflu) nas primeiras 48h, você melhora muito o quadro clínico do paciente. Então, a falta vai atrapalhar o suporte clínico desse paciente.

 

MidiaNews – Como se sente quando atende um paciente em estado grave que havia optado por não se vacinar?

 

Francisco Kennedy – Esse é um assunto que se politizou, tem gente que conversa sobre isso e fica bravo, altera o tom de voz.

 

Primeiramente eu respeito a pessoa, mas fico muito triste e decepcionado. Acredito que a vacina da Covid não está conseguindo evitar a infecção da doença, porém ela consegue prevenir a evolução da forma grave. Então, esse está sendo o benefício da vacina para gente.

 

MidiaNews – No seu dia a dia, tem notado diferença nos quadros entre pacientes vacinados e não vacinados?

 

Francisco Kennedy – Ainda estamos no começo da terceira onda, mas o que estou vendo é que os pacientes que estão vacinados, a grande maioria deles está com um quadro clínico muito brando, mas tem um ou outro caso que evolui de forma grave também. A Covid é uma doença terrível.

Tem aquelas pessoas que não querem se vacinar mesmo, e esse não é um número pequeno. E tem pessoas que se acomodam

 

MidiaNews – Que conselho dá para pessoas que insistem em não se vacinar?

 

Francisco Kennedy A orientação que faço é: vacinem-se contra a Covid, vacinem-se contra a gripe. Essas doenças podem vir avassaladoras a ponto da pessoa precisar ir para uma UTI e não ter vaga. Sem contar na possibilidade de passar a doença para outras pessoas com imunidade mais baixa. A orientação é: vacinem-se.

 

Diante da atual situação venho reparando que muitas pessoas que não queriam se vacinar estão mais conscientes e com mais medo de pegar a doença e estão se vacinando. Estão se preocupando também com a gripe e estão indo se vacinar contra a influenza.

 

No intervalo entre a 2º e a 3° dose da vacina contra a Covid a pessoa pode tomar a vacina contra a gripe, entre 15 e 30 dias depois da segunda dose.

 

MidiaNews – Como avalia a atuação do poder público? Acha que estão demorando em tomar providências no sentido de reduzir as aglomerações?

 

Francisco Kennedy – Na minha opinião eles já tem números suficientes para decidir a diminuição de aglomerações. Não digo fazer um lockdown, mas pelo menos diminuir as aglomerações, limitar o número de pessoas nos locais, obrigar o uso das máscaras, isso já pode ser feito.

 

Com a velocidade do aumento no número de novos casos, eu tenho muito medo de perdermos o controle e virar outro caos, outra situação de calamidade.

 

MidiaNews - Defende a vacinação das crianças de 5 a 11 anos?

 

Tem números suficientes para decidir a diminuição de aglomerações. Não digo fazer um lockdown, mas pelo menos diminuir as aglomerações

Francisco Kennedy – Eu apoio. Esse é um assunto muito debatido, mas os trabalhos científicos foram feitos com total respeito à ética, respeito à saúde e às pessoas e mostraram benefícios. Ninguém brincou nesses trabalhos, inclusive eu participei de um trabalho na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) com relação ao Coronavac em adultos. Fui um dos voluntários. É um trabalho muito bem organizado, randomizado, ninguém fica sabendo se está tomando a vacina ou placebo, só descobre depois.

 

MidiaNews - Como médico, como vê os movimentos de pessoas contrárias à vacinação?

 

Francisco Kennedy – Primeiramente os respeito como pessoas, não podemos sair brigando e discutindo. Mas não concordo. Em minha opinião tem que vacinar.

 

No início da pandemia a gente não sabia nada da doença. Tiveram muitos medicamentos que a gente viu que funcionava e, inclusive, tiveram a eficácia comprovada depois por meio de ensaios clínicos randomizados.

 

Eu já prescrevi muitas vezes hidroxicloroquina e ivermectina, naquela ansiedade de querer ajudar. Na prática fui vendo que não ajudava e depois foram surgindo trabalhos muito bons com resultados, mostrando que não tinham benefícios.

 

Agora a vacina mostra benefícios, claro, a gente gostaria que ela prevenisse a infecção pelo Covid, claro que sim, mas só de evitar a forma grave já é ótimo. Ir contra ela é negar o trabalho da ciência, isso a gente não pode fazer.

 

MidiaNews - Em Mato Grosso, o índice de pessoas com o esquema vacinal completo é de menos de 60%, abaixo da média brasileira. Em sua opinião, por que ainda estamos nestes patamares?

 

A maioria dos casos que estou atendendo são quadros clínicos brandos, leves, mas tenho conhecimento de casos graves

Francisco Kennedy – Acredito que tem dois motivos: uns porque não querem e outros por comodismo. Tem aquelas pessoas que não querem se vacinar mesmo, e esse não é um número pequeno. E tem pessoas que se acomodam, toma a primeira dose, o tempo vai passando e acaba que não toma a segunda ou a terceira dose. Acredito que seja isso. O ideal seria que todos fossem conscientes quanto à necessidade da vacinação.

 

MidiaNews - O senhor tem atendido pacientes com flurona?

 

Francisco Kennedy – Alguns. A maioria dos casos que estou atendendo são quadros clínicos brandos, leves, mas tenho conhecimento de casos graves em que o paciente precisou ser internado em hospitail.  

 

MidiaNews - Uma pessoa que contrai a flurona tem mais chances de ter um agravamento?

 

Francisco Kennedy – Teoricamente sim, porque são dois vírus, mas se a pessoa já é vacinada está um passo à frente para a melhora do quadro. Também ajuda se o paciente tiver acesso a um medicamento chamado oseltamivir, que trata a influenza.

 

Os médicos estão muito experientes no tratamento da Covid e se der continuidade ao tratamento, incluindo também a influenza, vai dar certo. O que não pode é a pessoa subestimar as doenças, não cuidar, não ir no médico, não fazer exames.

 

MidiaNews - Como fazer para diferenciar a gripe Influenza da Covid?

 

Francisco Kennedy – É muito difícil. Várias vezes tive certeza de que o paciente estava com Covid e o exame mostrou que era influenza e vice-versa. Clinicamente, não dá para diferenciar, apenas pelo exame de swab nasal. Os dois precisam de um suporte clínico.

 

Entre no grupo do MidiaNews no WhatsApp e receba notícias em tempo real (CLIQUE AQUI).




Clique aqui e faça seu comentário


COMENTÁRIOS
2 Comentário(s).

COMENTE
Nome:
E-Mail:
Dados opcionais:
Comentário:
Marque "Não sou um robô:"
ATENÇÃO: Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do MidiaNews. Comentários ofensivos, que violem a lei ou o direito de terceiros, serão vetados pelo moderador.

FECHAR

Ademir  17.01.22 17h02
Mas se está vacinado, porque temer seu negacionista!!!!! Pra que serve a vacina, pra tomar uma dose por mês e nada, nada serve, negacionista!!!!! Quem tomasse não ia pra UTI, não ficaria grave, então era bobagem negacionista !!!!
2
6
Robélio Orbe  17.01.22 12h52
A opinião deste doutor esta na contramão da opinião do DR Zeballos do Pará.
3
6