O ex-secretário-chefe da Casa Militar, coronel Evandro Alexandre Ferraz Lesco, prestou depoimento ao juiz Marcos Faleiros, da 11ª Vara Militar de Cuiabá, na noite desta terça-feira (16), na ação que apura os crimes militares relativos ao suposto esquema de grampos clandestinos operado em Mato Grosso.
Em sua fala, ele confessou a participação no esquema e revelou que o ex-secretário da Casa Civil Paulo Taques pediu a interceptação telefônica de um servidor do Governo ligado ao ex-governador Carlos Fávaro.
Apesar de ser vice, Fávaro rompeu com o ex-governador Pedro Taques em 2018. O PM ainda confessou que tentou grampear o desembargador Orlando Perri, do Tribunal de Justiça, e pediu desculpas à família e várias instituições.
E revelou também, entre outros pontos, que o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) grampeou de forma ilegal a ex-primeira-dama de Mato Grosso Roseli Barbosa, que chegou a ser presa em agosto de 2015.
Este foi o segundo interrogatório do coronel no caso. O primeiro ocorreu no dia 27 de julho, quando negou os crimes a ele imputados na ação penal.
Além de Lesco, também são réus na ação penal o ex-comandante da PM, Zaqueu Barbosa - que foi ouvido nesta tarde -, o ex-adjunto da Casa Militar, coronel Ronelson Barros, o coronel Januário Batista e o cabo da PM Gerson Correa Júnior.
Veja os principais trechos do depoimento:
“Tentei firmar acordo de delação” (18h40)
O interrogatório do ex-secretário teve início às 18h30. Ele contou que tentou firmar acordo de colaboração premiada com diferentes instituições à época em que o caso veio à tona, em 2017.
“Procurei firmar acordo de delação com a Polícia Civil, mas os autos foram submetidos ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), que na aquela ocasião me pediu para seguir as tratativas com a Polícia Civil, com os delegados Ana Cristina e Flávio Strigueta”, afirmou.
“Depois fui tentar me socorrer na Procuradoria Geral da Justiça, mas os autos baixaram e fui tentar a colaboração com o MPE. Busco mais uma vez me socorrer ao instituto da colaboração ao MPE, no Naco”.
No entanto, mesmo com o pedido, o chefe do Naco, procurador de Justiça Domingos Sávio, negou o acordo, segundo ele.
“Nesta ocasião de hoje, quero externar tudo aquilo que falei lá [no Naco] que, por uma surpresa, desconsiderou o pedido. Trarei apontamentos de fatos ilícitos que tenho conhecimento com os respectivos autores”.
Tentativa de gravar Orlando Perri (atualizada às 18h40)
Durante pedido de desculpas, Lesco confessou que chegou a tentar captar clandestinamente áudios do desembargador Orlando Perri, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso.
Lesco foi um dos presos na Operação Esdras, desencadeada em setembro de 2017 e que descobriu um esquema para levar à suspeição de Perri no caso dos grampos.
“Me sinto obrigado a pedir desculpa para minha família, para a Polícia Militar, minha gloriosa instituição, ao MPE, à imprensa que vem se empenhando a apresentar os fatos à sociedade. Quero pedir desculpa à OAB e ao Poder Judiciário. Cheguei ao atrevimento de tentar obstruir a Justiça com a captação de áudio do desembargador Orlando Perri", afirmou.
Alair Ribeiro/MidiaNews
Coronel Lesco presta depoimento na Vara Militar
Encontro com Paulo Taques (18h45)
Lesco relatou que, em agosto de 2014, quando atuava como diretor de Inteligência do Gaeco, foi procurado pelo coronel Barbosa Zaqueu, que determinou a ele que atuasse no Núcleo de Inteligência da Polícia Militar com interceptação.
“Isso foi direcionando a ele pelo [ex-secretário da Casa Civil] Paulo e Pedro Taques, que queriam grampear os seus adversários políticos”, disse.
Após a determinação, Lesco e o cabo Gerson foram se encontrar com o Paulo Taques para realizar as primeiras tratativas.
“Eu e o Gerson nos encontramos com o Paulo Taques em um restaurante em Chapada dos Guimarães. Na ocasião, o Paulo Taques disse que precisava de ajuda para interceptar os adversários políticos do Pedro Taques”.
“Recebemos a placa de interceptação telefônica do coronel Zaqueu. Tivemos problemas técnicos e contamos com a ajuda do cabo Euclides Torezan [que também atuava no Gaeco à época]”, disse.
Orçamento inicial: R$ 71 mil (atualizada às 16h51)
Para implementar o sistema de interceptação telefônica clandestina com as placas disponibilizadas pelo coronel Zaqueu, Lesco disse que foram necessários inicialmente R$ 12 mil, mais R$ 6 mil e depois mais R$ 13 mil.
“O orçamento inicial foi de R$ 12 mil. O Paulo Taques me repassou esse valor e eu repassei para o Gerson. Depois o Gerson disse que precisava de mais de R$ 6 mil. Eu me encontro com o Paulo Taques e ele me passa esse valor e eu repasso para o Gerson”.
“Depois teve a necessidade de um novo valor, de R$ 13 mil. Passei esse pedido para Zaqueu e ele disse que ia falar com o Paulo Taques. Me encontro com ele de novo e ele me passa esse valor de R$ 13 mil”.
Após o aporte de R$ 31 mil, Lesco conta que Paulo Taques repassou outros R$ 40 mil.
“Depois ainda me foi repassado por Paulo Taques mais R$ 40 mil, sendo que R$ 27 mil foram usados para equipamento de captação de áudio. E com todo equipamento pronto foi feita a ‘barriga de aluguel’ para inserção dos números para serem grampeados. Entre eles do advogado José [Antônio] Rosa, do jornalista [José Marcondes] Muvuca, da Tatiane Sangalli”.
Paulo dá aval para criação do Sistema Sentinela (atualizada às 18h55)
Com o início da gestão Pedro Taques, Lesco lembrou que se desligou do Gaeco e foi atuar como chefe da Casa Militar.
Lá, segundo seu depoimento, houve uma outra tentativa para a criação de um novo sistema de escutas clandestinas: o sistema Sentinela.
“Então houve outra tentativa para criar um equipamento para interceptação telefônica. E, a partir daí, surgiu o Sentinela. O coronel Zaqueu pediu que procurasse o Paulo Taques para falar do equipamento Sentinela. O Paulo Taques falou para mim que poderia dar andamento ao projeto do equipamento Sentinela”.
Lesco conta que sobrou um montante dos R$ 71 mil cedidos pelo Paulo Taques durante a campanha eleitoral.
“Eu tinha um recurso guardado, mas fiz um empréstimo para chegar no valor de R$ 24 mil para o projeto se desenvolver. Depois realizei outro empréstimo de R$ 36 mil para a ferramenta evoluir”.
Monitorar ações do vice-governador (atualizada às 19h03)
Lesco contou que, além dos números da ex-amante de Paulo Taques, Tatiane Sangalli, do advogado José Rosa, do jornalista Muvuca, uma segunda lista, com nome de um servidor ligado ao então vice-governador Carlos Fávaro, também foi-lhe entregue.
“Ainda houve outras demandas, mas com relação à inserção de novos números. Nos novos números estava um servidor que foi interceptado com o objetivo de monitorar as ações do vice-governador. Esse servidor estava ligado ao Favaro”.
Em 2018, o vice-governador Carlos Fávaro rompeu com o ex-governador Pedro Taques e renunciou ao mandato, sendo, posteriormente, candidato ao Senado no grupo político de Mauro Mendes (DEM).
Segundo Lesco, esse servidor alvo do grampo era lotado no Observatório de Gestão, ligado à Secretaria de Planejamento.
Alair Ribeiro/MidiaNews
Lesco durante reinterrogatório: "Nos novos números estava um servidor que foi interceptado com o objetivo de monitorar as ações do vice-governador, Carlos Fávaro"
Vazamento de operação (atualizada às 19h38)
Lesco relatou que, em maio de 2017, quando a “Grampolândia Pantaneira” veio à tona, recebeu à notícia de que a Casa Militar poderia ser alvo de busca e apreensão em um possível deflagração de uma operação.
“Eu recebi a visita do corregedor da Polícia Militar, coronel [Alexandre] Mendes, lá na Casa Militar. Lá eles me disseram que a Casa Militar poderia ser alvo de busca da polícia. E enquanto estava lá, recebi um telefonema do governador Pedro Taques, que me perguntou o que estava acontecendo na minha sala. Respondi que estava tratando de alguns assuntos e disse que, concluindo a reunião, me reportaria a ele”, relatou.
Ao fim da reunião, Lesco se dirigiu ao gabinete do governador, que estaria acompanhando do coronel da PM Airton Siqueira e do chefe da Casa Civil José Adolpho (substituto de Paulo Taques).
“Eles me perguntaram sobre a reunião e eu disse sobre a operação. O governador determinou a confecção de um ofício para o presidente do Tribunal de Justiça sobre o vazamento da operação. Muito abalado, retornei para a Casa Militar”.
“Grampeando” Perri (atualizada às 19h44)
Lesco revelou que se utilizou de um “kit óculos” para executar o plano para gravar o desembargador Orlando Perri, que conduzia os inquéritos sobre grampos em Mato Grosso, a fim de colocá-lo sob suspeição.
“Me encontrei com meu advogado Marciano e sugeri a ele a possibilidade de gravar o Orlando Perri através de um kit óculos que adquiri lá atrás com dinheiro do Paulo Taques. Conversei com [o sargento João Ricardo] Soler e ele instalou o equipamento na farda do tenente-coronel José Henrique Costa Soares”, contou Lesco.
Interceptação de Janaina Riva e João Emanuel (atualizada ás 19h55)
Lesco contou que em 2014 o promotor de Justiça Marco Aurélio de Castro, chefe do Gaeco, utilizou o esquema de “barriga de aluguel” para interceptar o então presidente da Câmara Municipal, João Emanuel Moreira Lima.
Barriga de aluguel é quando uma pessoa não investigada em determinado inquérito tem seu telefone incluído em um pedido de quebra de sigilo.
O ex-presidente do Legislativo municipal foi alvo da Operação Aprendiz, deflagrada em março de 2014.
“Na Operação Aprendiz também houve barriga de aluguel. O doutor Marco Aurélio pediu para interceptar o João Emanuel em um pedido de interceptação de um caso diferente”.
Ele também revelou de que a deputada Janaina Riva (MDB) também foi alvo dos grampos ilegais a pedido do promotor.
“A Janaina Riva também foi interceptada ilegalmente pelo Gaeco na Operação Metástase. O pedido para a barriga de aluguel também partiu do doutor Marco Aurélio”, disse.
A Operação Metástase, deflagrada em setembro de 2015, apurou esquemas supostamente encabeçados pelo ex-presidente da AL, José Riva, pai da deputada, de desvio de verbas de suprimentos de fundos para o pagamento de suas próprias despesas anos de 2010 e 2014.
Roseli Barbosa grampeada (atualizada em 19h58)
Lesco também contou que em 2014, ainda durante as investigações da Operação Arqueiro, o promotor Marco Aurélio determinou que a ex-primeira dama e ex-secretária de Trabalho e Serviço Social, Roseli Barbosa, tivesse os números de telefone grampeados de forma irregular. Isso porque, por ocupar um cargo do primeiro escalão do Governo, Roseli tinha foro por prerrogativa de função. E, por isso, não poderia ser investigada pelo Gaeco.
“Naquela ocasião o doutor Marco Aurélio me determina coordenar junto com os policiais militares que a secretária Roseli Barbosa não deveria fazer parte formalmente da investigação. Já era a metodologia do grupo”.
“Apesar de os telefones serem dela, ela não deveria ser colocada formalmente, deveria ser feita a investigação de forma transversal. No decurso dessa operação, ocorre uma situação inevitável. A senhora secretária é exonerada e assume a função o senhor Jean Campos Estevão”.
“Ele já estava sendo monitorado. Como ele estava interceptado e ascendeu ao cargo de secretário, com a prerrogativa, os autos foram para a 2ª instância. Caso contrário, a secretária permaneceria em primeira instância”.
Verba secreta do Gaeco (atualizada às 20h15)
Ao ser questionado sobre supostas irregularidades nas “verbas secretas” do Gaeco, Lesco admitiu que tinha conhecimento delas, mas que não sabia detalhar como ocorriam.
As verbas deveriam ser empenhadas em demandas operacionais do Gaeco. No entanto, conforme relatado pelo cabo Gerson, houve desvio de finalidade dos recursos e até mesmo "apropriação fraudulenta”.
“Não sei afirmar exatamente em que ponto ocorreram tais irregularidades, mas a situação existia. Em 2015, eu já estava na Casa Militar e fui surpreendido por uma servidora do MPE que disse ter ido por ordem de Marco Aurélio de Castro para trocar algumas prestações de conta das verbas ainda da época em que ele estava no Gaeco”.
“Garanto que não deixei pendências lá, mas ainda assim assinei as prestações de contas. Depois, fiquei sabendo de um desentendimento entre membros do MPE por causa do uso indevido da verba”, revelou Lesco.
Encerramento (atualizada às 20h44)
O depoimento de Lesco terminou por volta das 20h45. Depois de encerrar sua explanação sobre episódios da "Grampolândia", ele ainda chegou a esclarecer alguns pontos tanto para a defesa quanto para a acusação.
Entre no grupo do MidiaNews no WhatsApp e receba notícias em tempo real (CLIQUE AQUI).
4 Comentário(s).
|
Maria 17.07.19 08h31 | ||||
que horas que o pedro taxi e os paladinos do MPE serão presos? | ||||
|
Reinaldo 17.07.19 06h36 | ||||
Porque a justiça não preorisa o combate à corrupção, espionagem sempre existiu e não vai acabar, porque Eder Morais, Riva ,Sinval e outros não estão preso? | ||||
|
Magnaldo 17.07.19 05h41 | ||||
Polícia Militar jamais pode ser polícia judiciária no âmbito civil. Casos de resistência simulada em São Paulo e este grampo telefônico ilegal feito por Coronel PM comprovam que a polícia judiciária tem que ser civil.E o Gaeco não deveria investigar pq o MP é parcial por natureza como órgão de acusação. | ||||
|
A Verdade Sufocada 16.07.19 22h57 | ||||
Lesco e Zaqueu, vao no CNJ e CNMP....... | ||||
|