A Justiça de São Paulo reverteu, em setembro, uma sentença de 1ª instância e devolveu às famílias Maggi e Golin o controle da fazenda Cocal, em Mato Grosso, avaliada em mais de R$ 2 bilhões.

A informação foi publicada no site O Bastidor, em reportagem assinada pelo jornalista Alisson Matos. O texto revela detalhes da decisão, que corre em segredo de Justiça e envolve a família de Yssuyuki Nakano, morto em 2021, além de Eraí Maggi e Joselito Golin.
Com uma área de 37 mil hectares, a propriedade é disputada pelas empresas Bom Futuro (da família Maggi) e JAP Empreendimentos (da família Golin), que afirmam ter adquirido o imóvel em 2006 de Yssuyuki.
Nakano separou-se da esposa em 2016. Desde então, sua ex-companheira sustenta que o imóvel deveria integrar a partilha de bens, alegando que ele utilizou empresas de “laranjas” para ocultar patrimônio durante o casamento.
Em 2016, a 1ª instância havia anulado as vendas e reconhecido a existência de fraude patrimonial.
Leia a reportagem na íntegra:
Uma decisão de setembro da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo reverteu sentença da 1ª instância e devolveu a duas das maiores famílias de agricultores do Brasil o controle da fazenda Cocal, em Mato Grosso. Ela tem 37 mil hectares e é avaliada em mais de 2 bilhões de reais. A propriedade é usada para plantar grãos como milho e soja.
São eles Eraí Maggi, primo do ex-ministro da Agricultura Blairo Maggi e conhecido como rei da soja, e familiares de Joselito Golin. Ambos têm forte influência no estado.
O acórdão assinado pela desembargadora Maria Lia Pinto Porto Corona, acompanhada pelos magistrados José Rubens Queiroz Gomes e Ademir Modesto de Souza, desconsiderou decisão anterior que reconhecia a existência de um grupo econômico oculto, o uso sistemático de laranjas e a simulação de negócios envolvendo fazendas bilionárias localizadas no interior de Mato Grosso.
O processo, que corre em sigilo, trata dos bens do empresário Yssuyuki Nakano, morto em 2021.
A disputa judicial opõe o grupo liderado por Maggi à parte da família de Nakano, que foi dono da fazenda Cocal. Ele comprou a propriedade no início dos anos 1990 e a vendeu em 2006 para o grupo liderado por Maggi e Golin. No meio da compra e venda, separou-se da esposa, que hoje briga para ter o direito de propriedade sobre bens do ex-marido.
O Bastidor teve acesso com exclusividade aos autos e a documentos apresentados pelas partes. São matrículas, procurações, confissões de dívida e atos societários que deixam precedentes para contestações futuras em tribunais superiores.
A decisão da 1ª instância havia sido proferida em 2016, pelo juiz Guilherme Humberto, da 9ª Vara Cível de Campinas. O magistrado concluiu que Nakano utilizou empresas administradas por laranjas para afastar da partilha de bens propriedades rurais adquiridas por ele durante seu casamento. O objetivo era restringir o acesso da família à parte significativa do patrimônio.
Segundo o magistrado, as companhias Agropecuária Vanguarda Norte S/A, Guainco Agropecuária Ltda. e Agropecuária Canaan Ltda, donas da fazenda Cocal, tinham administração formal em nome de terceiros, mas eram operadas de fato por Nakano.
O juiz levou em consideração informações nas matrículas das fazendas. A partir de 2001, as áreas que compõem a Cocal passaram a ser questionadas em outras ações judiciais, penhoras e ordens de indisponibilidade. As citações em processos paralelos, segundo o magistrado, confrontam argumentos de que os compradores desconheciam o imbróglio judicial com os bens do empresário.
O juiz também cita o histórico de expansão do patrimônio de Nakano durante o período em que esteve casado. A sentença concluiu que a estrutura empresarial servia para separar formalmente bens adquiridos ao longo do casamento, impedindo que fossem incluídos na divisão patrimonial após a separação
O juiz determinou que as vendas realizadas deveriam ser anuladas, com exceção daquelas comprovadamente destinadas a terceiros de boa-fé. Entre as áreas afetadas estavam glebas integrantes da fazenda Cocal.
As empresas Bom Futuro Campo Verde Agropecuária Ltda, de Maggi, e JAP Empreendimentos, dos Golin, recorreram pedindo que o Tribunal de Justiça preservasse a validade das compras realizadas em 2006.
No recurso, afirmaram que adquiriram as fazendas Cocal, Copacabana e Boa Vontade por meio de escrituras públicas regulares, após negociação direta com as empresas Vanguarda Norte S/A e Guainco Agropecuária Ltda., e que não tinham relação com os conflitos familiares envolvendo Nakano e sua ex-esposa.
As duas empresas sustentaram ainda que não mantinham qualquer vínculo societário, comercial ou pessoal com Nakano, alegando que a compra foi uma operação puramente comercial entre companhias do agronegócio.
Outro ponto central dos argumentos foi o de que as aquisições ocorreram após a separação de fato do casal, em 2000, marco temporal reconhecido pelas próprias partes. Com isso, Bom Futuro e JAP alegaram que não haveria possibilidade de fraude contra a partilha, pois os bens já estariam sob administração exclusiva das empresas de Nakano. As compradoras afirmaram não ter participado das decisões internas das companhias vendedoras nem ter conhecimento de disputas patrimoniais entre o ex-casal.
As empresas também defenderam a boa-fé objetiva na celebração dos contratos. Alegaram que pagaram preço regular, que as matrículas apresentadas no momento da compra não impediam a transmissão da propriedade e que eventual litígio envolvendo os antigos proprietários não fora comunicado ou demonstrado de forma a comprometer a segurança jurídica das operações. Para as recorrentes, as averbações existentes eram atos administrativos usuais, que não inviabilizavam a negociação.
No acórdão de 25 de setembro de 2025, a desembargadora Lia Porto diz que a ex-esposa “sempre teve ciência de todos os bens envolvidos” e que acompanhou “por muitos anos” a movimentação patrimonial das empresas, inclusive “percebendo numerário em não poucas vezes”.
O acórdão registra que “nunca houve surpresa ou espanto” da autora quanto aos negócios firmados por Nakano e destaca que ela própria teria possuído poderes de administração em determinado período. A magistrada também rejeita a alegação de que a existência de averbações de litígio nas matrículas invalida a boa-fé dos compradores. Para a desembargadora, a autora “acompanhou a venda e o destino dos imóveis negociados, sem nunca ter questionado diretamente a venda das fazendas”.
A 7ª Câmara conclui ainda que as transações realizadas por Maggi e pela família Golin “foram formalizadas por escritura pública, dotadas de boa-fé e nunca antes impugnadas”. Não há, para os magistrados, elementos que indiquem simulação, fraude ou desvio de patrimônio comum.
A desembargadora determina a preservação da eficácia das compras realizadas em 2006, mantendo as propriedades sob controle das empresas ligadas às famílias Maggi e Golin.
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