É uma espera longa e silenciosa. Um lugar excelente para refletir sobre a paciência, as desigualdades, a burocracia e o tempo do outro.
Os velhos parecem ter mais paciência.

Os jovens querem tudo na hora e não suportam enfrentar longas filas — a não ser para comprar ingressos de shows de bandas estrangeiras famosas.
Muitos chegam a adormecer no local destinado à venda desses ingressos, sob chuva ou frio.
Quem costuma enfrentar filas são os menos favorecidos pela fortuna.
Os ricos pagam — e bem — para receber os ingressos em casa.
Os desocupados, também chamados de agenciadores ou profissionais de biscates, encaram filas que não andam recebendo alguns trocados por esse serviço.
E quem pensa que não existe burocracia nessas filas se engana.
Há um comércio paralelo, extremamente organizado, onde se vende café, pão com manteiga, sanduiche de mortadela, salgadinhos, espetinhos de carne, água, refrigerante, cerveja e a indispensável pipoca.
O ponto nesses locais tem dono e é negociado. Não é qualquer um que chega e encosta sua barraquinha para vender.
Fico a pensar o que faria com o tempo do outro, que considero perdido. Tempo vale ouro, diziam os antigos.
Quanta coisa útil poderia fazer enquanto a fila não anda — inclusive dormir. O sono alimenta o corpo e a alma, afirmam os filósofos.
Vale lembrar que existem filas que nem andam, como as dos processos nos tribunais de justiça do nosso país.
Cavalgo em um desses processos há trinta anos, lutando por justiça. A maioria dos colegas desse processo já partiu para outro mundo.
Em certas ocasiões, porém, a fila voa nesses tribunais, e carcerários se transformam em julgadores.
Isso fica no depósito das coisas sem explicação, embora todos se calem.
Vivemos em uma nação onde um dos poderes se impõe aos outros, com filas que não andam — ou voam.
Gabriel Novis Neves é médico e ex-reitor da UFMT.
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