Recentemente, vi uma publicação nas redes sociais que mostrava uma foto do centro de Cuiabá quase vazio, com a legenda atribuindo a responsabilidade ao governo federal. Antes de tudo: este não é um texto político. A intenção é propor uma reflexão sob a ótica do marketing, porque a pressa em encontrar culpados em questões que impactam diretamente empresas, empreendedores e trabalhadores não aponta caminhos reais de solução.
Fiz um esforço para lembrar quando estive pela última vez no centro da cidade. Decidi ir motivada por um propósito: contribuir para que o dinheiro circulasse na economia local e apoiar o comércio tradicional. Enfrentei trânsito, calor e dificuldade para estacionar. Quando finalmente cheguei à loja, pedi água — afinal, quem vive em Cuiabá sabe o quanto isso é necessário — e ouvi um sonoro não. Perguntei pelo produto que me levou até ali. O vendedor, sem qualquer esforço em compreender minha necessidade ou sugerir alternativas, respondeu apenas “não temos” e encerrou a conversa.
Saí cansada, frustrada e com a sensação de que minha boa vontade de “ajudar o comércio local” tinha se transformado em perda de tempo e de dinheiro. Paguei estacionamento, não resolvi meu problema e ainda me senti ingênua por sair de casa para comprar algo que sabia que encontraria mais barato e com menos esforço na internet.
É claro que existem fatores externos, como políticas públicas, mobilidade, segurança e clima. Mas não é possível atribuir o baixo fluxo do centro da cidade apenas a essas questões. O consumidor atual tem acesso, na palma da mão, a produtos do mundo inteiro, muitas vezes com preços menores, entrega rápida e comodidade. Competir com isso exige estratégia, experiência e diferenciação. O varejo que ainda funciona nos moldes das décadas de 1980 ou 1990, sem pensar no mix de produtos e serviços, sem investir em atendimento e sem colocar o cliente no centro das decisões, simplesmente não se sustenta. Nem mesmo os serviços bancários, que antes justificavam as idas ao centro, ainda exigem presença física.
Marketing não é só propaganda. É a ciência de entender as demandas do mercado e conectar ofertas que realmente façam sentido para o consumidor. Por isso, quando olhamos para o centro de Cuiabá, a pergunta não pode ser apenas “como trazer as pessoas de volta”, mas sim: que experiência única pode ser oferecida para que um ponto de venda seja também um espaço de relacionamento e de valor?
Essas reflexões são urgentes. A mesma blusa que encontro no centro pode ser adquirida em qualquer grande player digital. O diferencial não está mais no produto, mas no valor agregado, no serviço, no atendimento, na experiência. Se é difícil ir até o centro, por que não oferecer também canais digitais de venda e entrega? O apelo ao “ajude o comércio local” pode até sensibilizar em situações pontuais, mas não se sustenta como estratégia. Ninguém compra apenas por solidariedade.
Qualquer negócio, hoje, dificilmente mantém o mesmo formato por mais de dois ou três anos. As mudanças constantes no comportamento do consumidor de qualquer produto ou serviço já sinalizam a necessidade de inovar com estratégia para se manter relevante. Repensar, ressignificar e ajustar. E recomeçar. Esse ciclo é infinito — e o centro da cidade não pode ser exceção.
Se o debate for conduzido sob as lentes do marketing, com profundidade, clareza e coragem de repensar modelos, há soluções possíveis. O desafio é grande, mas ignorar o consumidor e seguir no automático, repetindo as mesmas fórmulas de 30 anos atrás, é receita certa para o esvaziamento e para o fechamento de negócios.
Mais marketing, por favor.
Cláudia Luz é publicitária, consultora de marketing e comunicação.
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