Há alguns dias, estourou em todas as mídias imagens de crianças em poses sensuais e roupas provocantes, exploradas sexualmente pelo influenciador digital Hytalo Santos e seu marido.
Deram o nome de “adultização” ao crime de interromper a infância dessas meninas, jogando-as precocemente na vida adulta para satisfazer a sexualidade de pedófilos e ajudar os influencers a faturar milhões.
A tal “adultização” fica caracterizada quando se atribuem a crianças comportamentos, roupas, poses, músicas e discursos próprios do universo adulto — em especial ligados à sexualidade, consumo e exposição midiática. Mas isso não é novidade no Brasil. Os mais velhos por certo se lembrarão dos programas da Xuxa, na principal emissora de televisão do país, fascinando a criançada nos anos 1980 e 1990.
O Xou da Xuxa e seus derivados marcaram a TV infantil no Brasil. Ele misturava música, coreografias, presença de crianças no palco (as chamadas “paquitas”), brincadeiras, publicidade e, sobretudo, a figura da apresentadora como ídolo e modelo a ser seguido. Xuxa, com figurinos ousados para padrões infantis e com músicas que muitas vezes falavam de amor e sensualidade de forma lúdica, criava cenas que misturavam elementos do universo adulto com o infantil.
A apresentadora na época era uma requisitada modelo profissional que fazia da sensualidade sua principal marca. Neste ambiente, as meninas foram crescendo tendo como principal ponto de referência a exposição corporal e as danças eróticas daquela que era sua principal inspiração.
Interessante é que nós, os pais, não percebíamos os males da exposição precoce à sexualidade. Achávamos normal uma certa sensualização de crianças em desfiles de moda, concursos e até propagandas e não impedíamos nossos filhos pequenos de assistirem o badalado Xou da Xuxa.
Podemos dizer que os programas da Xuxa funcionaram como um prenúncio da adultização das crianças, não porque fossem planejados com essa intenção, mas porque colocaram na TV aberta, em horário infantil, cenas e um repertório que misturavam infantilidade e erotização, ainda que muito mais leve que as que hoje foram mostradas pela imprensa.
Provavelmente hoje a Xuxa seria censurada por despertar, conscientemente ou não, nas meninas uma erotização antes da hora e a emissora que faturou horrores com a exposição dela (bem remunerada) e das meninas que a acompanhavam, seria punida.
Meninas e meninos que viam a Xuxa nos anos 1980 e 1990 hoje já passaram dos quarenta anos e provavelmente têm filhos. Como não sou psicólogo e nem ouvi opiniões dessas pessoas, não sei dizer o que elas pensam sobre o assunto. Nem se achariam normal expor suas filhas e filhos de 10/12 anos a este tipo de influência.
A Xuxa já está velha e a televisão aberta de hoje tem mais ferramentas de controle que no passado, mas surgiram outras formas, ainda piores, de erotizar as crianças. A internet sem limites e seus incontáveis influencers têm muito mais potencial corrosivo que os programas dos anos 1980/90.
Uma coisa é certa: a indústria da moda (roupas, maquiagem, sapatos etc.) que só pensa nos lucros, agradece a entrada prematura das crianças no mercado consumidor, patrocinadas, claro, pelo dinheiro dos pais. Estes, tais como os do passado (aqui me incluo), parecem não ver prejuízos importantes na exposição dos filhos.
Renato de Paiva Pereira é empresário e escritor.
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