O influenciador digital Hytalo Santos, e seu marido Israel Nata Vicente, foi preso em decorrência da divulgação, por outro influenciador conhecido como Felca, de vídeo que denunciava a denominada‘adultização’ de crianças nas redes sociais, apontando que Hytalo monetizava conteúdos digitais de conotação erótica envolvendo menores de idade.
Segundo as investigações, Hytalo conquistava a confiança dos pais dos adolescentes mediante a entrega de celulares, pagamento de aluguel de imóveis e custeio de mensalidades escolares, em troca da autorização para utilizar a imagem desses menores em um suposto “reality show” veiculado nas plataformas digitais. Os adolescentes residiam em sua companhia e, em alguns casos, eram emancipados, como estratégia para afastar eventual responsabilização do influenciador.
Neste caso, impõe-se analisar a responsabilidade do influenciador que, com o consentimento dos pais, manteve sob sua guarda adolescentes em vulnerabilidade social, visando exclusivamente auferir vantagem econômica com vídeos, expondo os menores a situações vexatórias. Cumpre igualmente examinar a responsabilidade dos pais, que permitiam tal exposição, e das próprias plataformas digitais que veicularam conteúdos de caráter erótico, fomentando o consumo desse material por pedófilos.
As autoridades competentes apuraram a prática, por parte de Hytalo e de seu marido, dos crimes de tráfico de pessoas, exploração sexual e trabalho infantil artístico, além da violação de diversos dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), notadamente aqueles que proíbem: o trabalho infantil, a simulação de atos sexuais; o aliciamento, assédio e constrangimento de crianças e adolescentes. Ressalta-se que a emancipação civil não afasta a aplicação das normas protetivas do ECA.
Nos termos da legislação, os pais possuem o dever legal de cuidar, proteger e zelar pela saúde e integridade física e psíquica dos filhos menores. A entrega dos filhos a terceiros, para fins de exploração, caracteriza omissão grave. Caso se confirme que receberam ajuda financeira, evidenciando violação dos deveres de guarda e proteção, em que a autorização dada pelos pais não possui qualquer validade jurídica nesse caso, por afrontar norma de ordem pública e implicar participação indireta em crime de exploração sexual infantil.
Assim, a conduta dos pais poderá ensejar responsabilidade civil e criminal, incluindo a tipificação pelo crime de abandono de incapaz, bem como por eventual conivência em exploração sexual.
No que tange as plataformas digitais, estas também detêm responsabilidade, uma vez que, ao priorizarem algoritmos que impulsionam a difusão massiva de conteúdos, deixaram de adotar filtros preventivos e mecanismos de bloqueio capazes de impedir a propagação de material relacionado à exploração de crianças e adolescentes. O influenciador Felca destacou justamente a ausência de critérios éticos e de barreiras eficazes na gestão dessas plataformas, que deveriam atuar de forma proativa na prevenção da veiculação de conteúdos ilícitos.
A discussão reforça a necessidade de regulamentação legal das redes sociais, atualmente debatida no âmbito do Congresso Nacional, a exemplo do PL 2.628/2022, que estabelece regras para maior transparência algorítmica, obriga a remoção imediata de conteúdos ilegais, proíbe a utilização de dados de menores para fins comerciais e impõe a criação de canais específicos de denúncia.
O caso Hytalo evidencia que, embora a prática de ‘adultização’ de crianças e adolescentes nas redes não seja recente, a sociedade e as instituições apenas agora, após todo frenesi que as redes proporcionam, passaram a enfrentar o problema de forma mais incisiva. É necessário reafirmar que a proteção integral da criança e do adolescente é dever da família, da sociedade e do Estado, conforme preceitua o artigo 227 da Constituição Federal, sendo imprescindível a adoção de medidas que assegurem sua efetiva proteção também no ambiente digital.
Regiane Freire é advogada especialista em direito civil.
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