A defesa do advogado e ex-secretário chefe da Casa Civil, Paulo Taques, detido em Cuiabá na última sexta-feira (4), afirmou no habeas corpus impetrado nesta segunda, no STJ (Superior Tribunal de Justiça), que o desembargador Orlando Perri, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, adotou hipótese “excêntrica” e “ilegal” ao decretar a prisão.
O habeas corpus está concluso para decisão do ministro Reynaldo Fonseca.
Os advogados Luiz Grandinetti Carvalho, Ilton Norberto Filho e Camila Brito alegaram, na tese de 47 páginas, a qual o MidiaNews teve acesso exclusivo, que a decretação da prisão “foi proferida por órgão absolutamente incompetente, sendo a decretação de prisão absolutamente nula e, por tal razão, devendo ser cassada”.
Paulo está no Centro de Custódia da Capital, acusado de participação em um esquema de escutas telefônicas ilegais feitas por policiais militares, desde 2014.
Perri também utilizou, para justificar a prisão, o argumento de que haveria risco de Paulo em destruir provas e documentos importantes para a investigação, uma vez que ainda teria forte influência no Governo.
Segundo a defesa de Paulo, uma das causas que justificam a nulidade, é a falta de fundamentação da decisão que fez com que as investigações contra Paulo Taques “subissem” para a 2ª Instância.
O argumento de Perri para que Paulo Taques fosse investigado por ele, e não por um juiz de 1ª Instância, é o de que os crimes dos quais o ex-secretário é suspeito possuem ”conexão” com outros delitos investigados no TJ também relacionados ao esquema de grampos. Além disso, segundo Perri, nesses outros casos um dos investigados é o secretário de Justiça e Direitos Humanos, coronel Airton Siqueira Júnior, que possui prerrogativa de foro.
Todavia, a defesa de Paulo Taques afirmou que Perri sequer citou os números dos autos que supostamente provariam tal “conexão”.
“O máximo que se tem no caso em tela é a abstrata referência a outros casos que girariam em torno do tema dos grampos ilegais. Discussão que se torna inteligível sem a referência do número dos autos, e dos objetos específicos de cada um dos procedimentos. Novamente: sem que haja referência sequer aos autos, não se pode verificar se as assertivas correspondem à realidade, e se existem, nos autos em referência, elementos outros através dos quais se poderia infirmar as ponderações trazidas na decisão atacada”.
O ex-secretário Paulo Taques, que tenta liberdade no STJ
Ainda quanto a este ponto, os advogados registraram que Perri fundamentou seu entendimento sobre a “conexão” com base em voto proferido pelo ministro Gilmar Mendes em julgamento ocorrido no Supremo Tribunal Federal (STF).
Neste voto, Mendes havia dito que a conexão pode se estabelecer quando “a prova de um crime tenha capacidade de influir na prova de outro delito”.
Os advogados do ex-secretário afirmaram que o voto de Gilmar Mendes no julgamento em questão só foi acompanhado por mais um dos onze ministros do STF, e que tal entendimento não é o predominante.
Segundo eles, a jurisprudência do STF é no sentido de que os investigados sem prerrogativa de foro – como Paulo Taques – devem ter as investigações desmembradas daqueles que possuem o foro por prerrogativa de função, “ressalvadas as hipóteses em que a separação possa causar prejuízo relevante”.
“Tendo se estabelecido o “critério de que o desmembramento seja a regra geral, admitindo-se exceção nos casos em que os fatos relevantes estejam de tal forma relacionados que o julgamento em separado possa ocasionar prejuízo relevante à prestação jurisdicional” (voto em separado do Ministro Barroso no Agravo Regimental no Inquérito 3.515/SP, que unanimemente homenageou o entendimento que aqui se expõe) e não tendo sido demonstrado o prejuízo que o julgamento em separado de quatro diferentes procedimentos criminais poderia acarretar, não se pode chegar a outra conclusão senão a de que a avocação do inquérito e, por consequência, de que a decretação da prisão preventiva que dela foi oriunda são absolutamente ilegais”.
A defesa ressaltou que o desembargador determinou a conexão mesmo sem demonstrar qual seria o prejuízo de desmembrar a investigação em relação a Paulo Taques.
Fác-símile de trecho do pedido de habeas corpus:
"Excêntrica"
Na petição, os advogados ainda ironizaram o fato de o ex-secretário responder a uma investigação criminal em segunda instância.
“Ora, não seria equivocado dizer que, mesmo sem a realização de uma pesquisa exaustiva sobre o tema, seria o primeiro caso no Brasil de um acusado responder a processo em foro privilegiado pelo fato de que, em autos apartados, supostamente conexos, e mesmo sem que tenha se demonstrado a prejudicialidade do desmbramento, haja autoridade com tal prerrogativa, que não foi denunciada ou sequer indiciada nesses autos paralelos”.
“Trata-se de hipótese, no mínimo, excêntrica e, mais do que isso, absolutamente ilegal, no que diz respeito à avocação do inquérito e principalmente no que se refere à decretação da preventiva”.
Inquérito encerrado
Outra suposta ilegalidade mencionada foi a tese de Perri de que, ainda que Paulo Taques não tenha foro, é suspeito de ter cometido crimes “conexos” com autoridades com tal prerrogativa, como o secretário Airton Siqueira Júnior.
De acordo com a defesa, o inquérito ao qual Airton Siqueira era investigado “foi encerrado, com a apresentação de denúncia que não a contemplou”.
“Esse procedimento redundou em ação penal inaugurada por denúncia, que contemplou o Cel. PM Evandro Alexandre Ferraz Lesco, que depois disso, pediu exoneração, e não contemplou o Cel. PM Airton Benedito de Siqueira Junior – Secretário de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Assim, vê-se de pronto que a autoridade com foro por prerrogativa de função não está mais sendo investigada na situação indicada pela decisão atacada, porque a denúncia já foi oferecida e não está sendo processada, pois a denúncia a ela não se refere!!”.
Ainda que Perri tenha citado que há outros inquéritos em andamento contra Airton Siqueira, a defesa consignou que não há indiciamento contra o mesmo.
“Assim, como se afirmar que está sendo investigado? Data vênia, não se pode emprestar efeito jurídico ao sentimento subjetivo do prolator da decisão de que “O Cel. Siqueira será responsabilizado por algo” e, assim, poder se entender que está sendo investigado. Ora, o mínimo que se exige, para que possa afirmar que continua sendo investigado, é um indiciamento. O que inexiste na espécie”.
“Ainda que discorde no ponto o Exmo. Des. Relator do feito na origem, o fato é que não existe em nosso sistema processual penal um inquérito “pós-denúncia”. O inquérito se encerra com o oferecimento da denúncia, e seria enfadonho se enfatizar a doutrina e a jurisprudência, que em uníssono, nos escudariam na questão”.
Outro argumento da defesa é que os fatos que justificariam a alegada conexão com a investigação contra Paulo Taques tratam-se de crimes militares. E, conforme a própria jurisprudência do STJ, “no concurso entre a jurisdição comum e a militar, deve o feito ser desmembrado”
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“Como visto, se nos mesmos autos, a regra é a do desmembramento, salvo se demonstrado o prejuízo para tanto, não se vê qualquer razão respaldada em lei ou em entendimento jurídico idôneo que possa fazer com que autoridade suspeita em um inquérito, que pretensamente se relaciona a outro (note-se que essa relação não é sequer citada na decisão), possa fazer com que esse outro também seja atraído para o foro especial. Por mais essa série de razões é de declarar a nulidade da decisão que avocou os autos para que seja igualmente declarada a nulidade que decretou a prisão preventiva do paciente”, diz trecho do habeas corpus.
Veja outro trecho do habeas corpus:
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